1. O apelo de Yeon

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Dois anos já haviam se passado e Lee Yeon ainda pensava no sacrifício de Rang, e a chance que ele não teve de agradecê-lo. Como tudo tinha acontecido de uma forma tão injusta? Yeon sentia que ia enlouquecer ao pensar no quanto o irmão devia estar se sentindo com medo e solitário onde estava, ele esteve lá, sabia como era, e conhecia Rang melhor do que ninguém para saber que por mais que ele tivesse todo aquele jeito de durão deveria estar com medo. Yeon já havia tentado de tudo para saber do irmão, procurado xamãs, falado com outros seres místicos, e principalmente ido até Taluipa.

E dessa vez, enquanto deixava azaleias no túmulo do seu irmão, decidia ir lá mais uma vez, fazer o que fosse possível para que ela dissesse pelo menos quando Rang reencarnaria, e se ele reencarnaria.

Chegou no Escritório de Imigração no momento em que Hyun Eui-ong fechava as portas da sala de Taluipa às pressas.

— Pelo visto a vovó está com um péssimo humor hoje.

— Yeon! — Hyun Eui-ong disse incrédulo. Quais eram as chances de Yeon aparecer ali justamente naquele momento?

— Preciso falar com ela.

Hyun Eui-ong não sabia o que fazer e nem como agir, Yeon o havia pego totalmente desprevenido. Tentou falar o mais natural que conseguiu:

— Acho melhor você vir outra hora, ela está realmente assustadora hoje.

Sem dar ouvidos Yeon passa por ele e entra na sala. Taluipa está séria falando ao telefone.

— Sim, senhor. Como o senhor desejar. ­— Taluipa desliga o telefone e suspira ao ver Yeon.

— Não estou num bom dia para conversar com você, Yeon.

— Você nunca está.

— O que você quer?

— Preciso saber notícias do...

— Eu já falei várias vezes que a forma que ele foi para o submundo foi diferente, eu não tenho acesso a nada relacionado ao Rang. — Taluipa disse massageando as têmporas.

Yeon sentou na cadeira em frente à mesa de Taluipa, derrotado. Ele não podia desistir ali, não sabendo que o seu irmão deu a vida para trazê-lo de volta. As palavras que Rang disse em seu vídeo de despedida, ainda ecoava em sua cabeça. Precisava realizar o desejo dele de se encontrarem novamente, e de terem a oportunidade de viverem juntos como uma família. E reafirmar que Yeon sempre estaria lá para salvá-lo.

— Eu faço qualquer coisa...

— Cuidado Yeon, você agora não é mais alguém que pode fazer qualquer coisa. Se lembre que não está mais sozinho.

Taluipa poderia contar que Rang havia escapado, mas sabia que seria um problema, principalmente porque ele não poderia ficar. Não ia querer ver Yeon sofrendo novamente, então para evitar problemas, não contaria sobre o que aconteceu a ele. A deixava triste vê-lo tão cabisbaixo como estava, mas era melhor assim.

— Vá pra casa, guarde suas lembranças com ele no melhor lugar, e siga em frente.

Yeon contraiu o maxilar, prendendo o choro. Se levantou da cadeira, se despediu de Taluipa sem dizer uma palavra, apenas acenou com a cabeça e saiu. Ele passou por Hyun Eui-ong e sem cumprimentá-lo de volta.

— Você não contou pra ele?

— É claro que não, e você trate de manter essa sua boca fechada, já me causou problemas demais!

— Acho que ele seria a pessoa ideal para resolver os seus problemas.

Apenas a expressão de Taluipa fez com que Hyun Eui-ong saísse da sala, ele não concordava com o rumo que as coisas estavam indo. Precisava fazer com que a esposa mudasse de ideia.

Taluipa agradeceu por finalmente estar sozinha na sua sala, precisava pensar no que fazer para rastrear todas as almas que escaparam e colocá-las de volta no lugar de onde não deviam ter saído. Hyun Eui-ong estava certo ao dizer que Yeon poderia resolver tudo, mas essa seria sua última alternativa, essa era a chance que o filho postiço tinha de ter uma vida normal, não ia deixar que nada atrapalhasse isso.

______֎______

Yeon dirigia devagar de volta para casa, não queria que Ji-ah ficasse preocupada ao ver que ele não estava bem. O que Taluipa disse o tinha magoado, como ele poderia guardar todas as lembranças que tinha com o irmão? Sim, ele estava voltando para casa, mas a sua busca para trazer Rang de volta ainda não tinha acabado, ele podia sentir isso. Estacionou o carro na garagem e ainda ficou alguns minutos antes de subir. Hoje era folga de Ji-ah e eles tinham combinado de ver um filme juntos, assim pegou o elevador com um pote de sorvete.

Só de ouvir o som da risada de Ji-ah sentia o seu coração aquecer, ele se achava com muita sorte de tê-la ao seu lado. Abriu a porta e a cena que viu o fez sorrir.

— Pa-pai!

— Oh, Ji-ah! Ela falou! — Yeon disse se abaixando com os braços abertos para recebê-la. Uma pequena garotinha dava pequenos passos ao seu encontro, ao chegar perto se jogou nos braços de Yeon, que a rodopiou fazendo a garotinha sorrir.

— Sim! Ela começou a falar um pouco depois que você saiu, desde então tudo que eu mostro ela consegue repetir. Minha mãe disse que é comum os bebês falarem antes dos dois anos, mas não várias palavras assim. Nossa Mi-rae é muito esperta.

— Claro, ela puxou a mãe. — Yeon disse dando um beijo singelo em Ji-ah.

Lee Mi-rae era uma mistura perfeita de Yeon e Ji-ah. Cabelo ruivo, um pouco mais escuro que o do pai, e olhos atentos como os da mãe. Não estava nos planos do casal aumentar a família assim tão logo após a volta de Yeon, mas foi isso que aconteceu, alguns meses após o casamento Ji ah começou a sentir enjoos terríveis.

Yeon olhava de Mi-rae para Ji-ah maravilhado. Ainda se sentia inseguro de ser responsável por uma criaturinha tão pequena, lembrava de como se sentiu com medo quando a carregou pela primeira vez. Medo de não ser um bom pai, de não conseguir protegê-la, e principalmente de como as coisas seriam a partir daquele dia. Mas ao sentir a minúscula mão da filha recém-nascida segurando seu dedo, ele relaxou, era como se ela tivesse dizendo para ele que ficaria tudo bem. E assim passaram se quase dois anos.

Agora a única preocupação dele em relação a isso era a reação de Ji-ah ao descobrir que tinha uma filha meio raposa, e que Yeon não era humano coisa nenhuma. Ele soube que Mi-rae era mestiça assim que ela nasceu, pois, ao segurá-la, ela abriu os olhos e Yeon pode ver que um dos olhos era amarelo.

Durante esse tempo, não viu mais o olho da filha se transformar mais nenhuma vez, e ele mesmo chegou a se perguntar se não tinha sido uma alucinação. Mas agora, vendo como a sua garotinha estava crescendo e se desenvolvendo rápido, soube que não tardaria muito para Ji-ah saber. Afinal, quando se conheceram, ele mesmo não conseguiu esconder que era uma raposa durante muito tempo. Se perguntava o que ela faria quando esse dia chegasse.

Por hora ele não queria mais pensar em nada disso, só ficar no sofá com Ji-ah e Mi-rae, assistindo a um bom filme e comendo seu sorvete favorito.

______֎______

Rang sentia todo o seu corpo doer, principalmente o braço direito, que deduziu estar quebrado, sua costela e a cabeça também estavam incomodando bastante.

Tentou abrir os olhos, estavam um pouco pesados por conta do efeito do sedativo, supôs, com algum esforço conseguiu abri-los lentamente. Olhou para a mão, e mesmo com curativos, pode perceber que aquela não era a sua própria mão. O que aconteceu era realmente o que ele estava pensando que tinha?

Tentou se mexer, mas sentiu uma fisgada na costela tão forte que foi inevitável não soltar um som. Uma senhora com o rosto banhado em lágrimas segurou a sua mão.

— Meu filho, você acordou! Eu estava tão preocupada, pensei que morreria...

Vendo a senhora beijar sua mão só o fez ter mais certeza ainda de que ele tinha entrado no corpo de outra pessoa. De quem ele ainda não fazia ideia, viu a senhora pegar o telefone antes de fechar os olhos outra vez. Não estava dormindo, a luz fazia sua cabeça doer mais, com os olhos fechados sentia mais confortável.

— Querido, o Jihoon acordou! Não, ele ainda não disse nada, os médicos acabaram de chegar aqui no quarto para avalia-lo.

Jihoon... Então era esse o seu novo nome. 

I'll be there: uma segunda chanceWhere stories live. Discover now