prologous | two

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UM ANO DEPOIS...

Meu corpo foi arremessado a cama. Tentei respirar, mas não consegui, algo impedia de mover meus pulmões. O suor brotava de minha testa e eu sentia cada junta dele doer com muita força até conseguir lágrimas.

— Maldita! — Meu pai gritou, e só não avançou mais uma vez em minha direção porque minha mãe se colocou no meio de nós. — Que parte você ainda não entendeu que sair sem avisar será punida?!

— Chega, Victorio! — Minha mãe chorava. Ela não aguentava o homem violento que estava dormindo, ninguém aguentava, muito menos eu que apanhava quase sempre porque eu tinha um pai que não conseguia controlar seus impulsos. — Ela não fez por mal.

— Fez!

Minha mãe foi jogada ao chão, por minha culpa, porque me senti ansiosa e entrei em pânico mais uma vez naquela semana. Meu coração disparava, meu não entrava, eu precisava correr, sentir ar fresco, precisava sair da gaiola em que nasci e me manterão presa.

Meu corpo tremeu por inteiro quando eu vi minha mãe jogada no chão.

Não existia um só lugar em mim que eu não tenha recebido pancadas, muitas delas sem nem saber o motivo. Algumas delas porque errei em alguma atividade acadêmica, ou porque ele estava bêbado demais.

Cresci escutando que aos 16 anos eu estaria noivando com um homem de confiança de meu pai.

Até aquele momento eu não questionava. Todos me diziam que era algo tradicional. Que casamento com amigos próximos era uma forma segura para ambas as partes, além de que casamento – realmente – sempre foi feito para fins lucrativos.

Uma vez por semana eu tinha aulas sobre como me comportar, como ser uma jovem obediente – submissa – como ser a mulher perfeita para um homem que nunca apareceu em minha porta.

Não poderia estudar em colégio, como qualquer pessoa normal, também não poderia namorar ou ter um relacionamento de amizade em ambos os sexos.

Na casa eu só poderia me dirigir a parentes e a empregadas. Se um primo ou tio estivesse perto de mim, eu teria que sair com sutileza. Nenhum empregado homem poderia me tocar, me dirigir a palavra ou qualquer coisa do tipo.

Eu apenas vivia dentro de casa. Recebendo aulas de piano, violino, idiomas como francês, alemão, inglês, espanhol, natação, matérias escolares em geral – detestava matemática – dança, costura, bordado. Uma agenda longa, cansativa que me tirava as energias para qualquer pensamento.

Mas de um ano para cá, eu venho sentindo tanta raiva de tudo isso. Praticamente eu sou quem eles querem que eu seja. E me pego questionando-me quem eu seria se não tivesse aquela família, todas essas privações, se realmente eu não precisasse casar-se com esse Vladmir.

E todas as vezes que não sou boa o bastante, e recebo alguma pancada por conta disso, eu tenho raiva de um homem que nunca vi na minha vida.

Uma vez escutei meu pai dizer que eu nasci para casar-me com um Ivanovich, a família mais poderosa na Rússia.

Eu havia me tornado alguém que eu não queria. Uma garota que vivia dentro de uma casca, sem amigos, sem contato com o mundo, sem saber o que era afeto, sem saber se o que realmente gosto hoje foi por influência.

Minha mãe me dava carinho, mas não era nada corriqueiro, ela sempre teve medo do meu pai, teve medo do amor que sentia por mim e que o pudesse me influenciar de alguma forma a ficar em casa.

Ou seja, além de sozinha, cruelmente abusada fisicamente e psicologicamente, desde criança, eu ainda era privada de gestos de amor.

— Você quer que todos pensem que é uma vadia?

BONECA RUSSAWhere stories live. Discover now