Capítulo 9 - Insistência (parte 2)

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Gostaria de poder dizer que ninguém reparou em nossa ausência ou fez comentários com sorrisinhos maliciosos... mas aí eu não estaria falando da corte. Meu rosto ainda estar tão vermelho e Hector estar com terno aberto e gravata afrouxada tem uma parcela de culpa.

Ele não se afastar mais, também.

Com o burburinho se espalhando, não é surpresa quando Thereezee se materializa diante de nós com um sermão constrito — o qual eu corto para explicar educadamente como certos convidados se aproveitam da ausência de Hector para falar besteiras inapropriadas e que talvez os próximos tenham respostas à altura... É o suficiente para Thereezee crispar os lábios e se retirar.

Só gostaria que o resto da corte fizesse o mesmo... Embora a presença de Hector iniba os toques indesejados e faça os nobres moderarem as palavras, escondendo agulhas em algodão, os olhares...

Mesmo que Hector garanta que esse tipo de coisa não o magoa mais, que não preciso me preocupar em defendê-lo, o desdém mal disfarçado ferve meu sangue. E ele parece sentir isso: quando uma resposta está para sair — já que não posso mais pisar no pé de ninguém — aperta minha mão pousada em seu braço, numa mensagem de "não vale a pena".

Ele não pode fazer nada quanto à minha expressão, porém. Quando noto qualquer insinuação de desdém, fecho o sorriso forçado, arqueio uma sobrancelha e os incinero com o olhar, desafiando a continuar.

É o suficiente para afastar a maioria. Mas nem todos entendem mensagens subliminares de "cale a boca e suma da minha frente". Hector acha graça, implicando que mais um pouco e começarei a rosnar igual a Mimosa e quando retruco que não sei, ele tem a brilhante ideia de "me ensinar", fazendo sons de rosnado perto do meu ouvido.

E é nessa situação constrangedora — quando estou contendo uma risada pelas tentativas patéticas ao mesmo tempo em que finjo não sentir os arrepios se propagando por minha pele, onde sua boca roça — que somos abordados por outro convidado.

— Boa noite, princesa... é um prazer revê-la tão bela essa noite — a voz grave e o sorriso carregado de solene indulgência trazem consigo memórias de verões atrás, mas é sua aparência e o olhar inquisitivo que lança para Hector que traz o reconhecimento.

— Também é um prazer reencontrá-lo, ti... barão Michaelis. — Sorrio envergonhada e estendo a mão em cumprimento, contendo os impulsos de querer me enterrar e acertar uma cotovelada em Hector, que abafa um risinho atrás da mão por meu deslize. É totalmente inapropriado chamar o barão de "tio" como quando era criança.

— Pode me chamar apenas de Otto, princesa — ele sorri, com sua indulgência característica. E a semelhança com Hector fica ainda mais evidente... Embora Otto seja mais baixo e largo, com o nariz aquilino perfeitamente alinhado e um cavanhaque em vez das covinhas de meia-lua, olhar para ele é como ver um paradigma de Hector daqui cinquenta anos, quando o carvão dos cabelos se tornar prata.

Agradeço quando ele dá suas felicitações de aniversário, mas antes que possa complementar, a voz do grão-mestre de cerimônias ressoa no salão, anunciando que em cinco minutos haverá a Primeira Valsa, abrindo as danças.

— Imagino que precise ir, princesa — Otto adivinha por meu suspiro cansado. — Adoraria poder convidá-la para uma das danças, mas esse velho infelizmente já não tem permissão médica... nem filial — olha de soslaio para Hector.

— E para ir até uma confeitaria, tem permissão? Amanhã tenho o dia livre, seria agradável ter uma tarde como nos verões passados — replico. A surpresa de ambos pelo convite, como se fosse algo tão extraordinário, é tão engraçada que não resisto em acrescentar para Hector em afetada condescendência: — Está convidado também.

Tratado de VidroWhere stories live. Discover now