Capítulo 32 - Fútil

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Já sabia desde o princípio que não seria fácil, mas tinha ao menos a esperança de mamãe me ajudar na aproximação. Porém, quando contei a ela a ideia de encarregar Annabella de uma parte do projeto e sugerir que ela fizesse a ponte entre nós, sua resposta foi um copo de água fria na cara.

— Fico feliz que tenha pensado em incluir sua irmã. Mas o projeto é seu. Se quer a participação dela, você mesma tem que fazer o convite e explicar do que se trata.

Suspirei com pesar e minhas esperanças de sucesso foram junto com o fôlego.

— Não pode ao menos falar com ela antes, sondar se ela tem interesse e disponibilidade? — insisti, quase entredentes. — Nossa rotina é muito diferente e nem sei onde ela está a maior parte do tempo...

— Peça para alguém localizá-la.

—... e nessa semana estarei super ocupada com todos esses eventos que a senhora me mandou ir.

— E acha que eu não estarei ocupada? — devolveu, com afiado erguer das sobrancelhas escuras, uma sugestão bem clara para eu pensar muito bem em minhas próximas palavras.

— A senhora é a única que sabe lidar com diplomacias aqui e falou que se eu precisasse de alguma ajuda no projeto, deveria dizer — resmunguei, cruzando os braços. Olhei rapidamente para papai, em sua mesa, mas ele raramente se intromete em meus assuntos com mamãe, a menos que eu erga a voz.

— Isso não deveria ser desculpa para se acomodar e nem tentar, Alissa. E a ajuda que ofereci foi em alguma questão burocrática. — Mamãe expirou, balançando a cabeça em busca de paciência. — Eu poderia, sim, fazer o que está me pedindo dessa vez, já que é até raro você pedir qualquer coisa-

— Se até a senhora sabe disso, então por que justo nisso está se recusando a-

— ... mas e depois? — Ela prosseguiu, ignorando meu argumento. — Não terá que conversar com ela de qualquer jeito? Caso ela concorde... e acredito muito que será esse o caso... não vai precisar conversar com ela sobre o projeto? Ou o quê, vai pedir que eu fique mediando qualquer assunto que precise tratar com ela?

— Claro que não, seria só nesse começo...

Minha voz deve ter soado menos confiante que o pretendido, a julgar pelo incisivo olhar que ela me direcionou.

— Se está interessada na participação dela, o que acho louvável, precisa conversar com sua irmã, Alissa — ela disse, pousando uma mão em meu ombro. — O projeto é seu e foi você quem pensou num papel para ela, então é você quem deve convidá-la. Quem sabe, ela ouvir esse convite diretamente de você não seja o suficiente para conseguirem se entender...?

Foi à muito custo que contive um bufo sarcástico. Para alguém sempre tão racional e pragmática, mamãe ainda consegue ter um otimismo inacreditavelmente ingênuo às vezes. Mas, com isso, soube que não havia mais nada que eu pudesse dizer.

Fui deixada por minha própria conta e risco — com ênfase no risco.

Poucas coisas me deixam mais tensa do que saber que há algo que preciso fazer, mas ainda não tive coragem. E, claro, isso não se resume apenas à conversa com Annabella, embora diante de Hector seja mais fácil fingir que sim.

Nesses cinco dias desde a nossa conversa na saleta, tenho mergulhado em deveres e eventos sociais, emendando um no outro, protelando como possível tudo que posso, ainda que isso piore meu estado de tensão.

Em nenhum desses dias passados, Hector fez menção de retomar a conversa interrompida. E, ora fico aliviada, querendo abraçá-lo por ele aparentemente compreender que preciso de tempo para ponderar se tenho ou não a coragem de arriscar essa mudança na natureza de nosso relacionamento; ora fico a ponto de sacudi-lo para que pare de apenas me provocar e faça alguma coisa, porque não aguento mais ter a responsabilidade de tantas decisões sobre mim.

Tratado de VidroWhere stories live. Discover now