Capítulo 31 - A leitura que quis fazer

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Mon 

Acordei de manhã sentindo a ausência do corpo quente em dormi a noite toda, a encontrando na varanda do quarto. Sam  estava descalça e usava a mesma calça de moletom da noite anterior. Estava olhando para o nada.

Em suas mãos havia uma xícara de café fumegando e ela parecia perdida como não tinha reparado em dias. A sombra daquela Sam  indecifrável se punha outra vez, mas na realidade com a percepção de que ela era alguém cheio de camadas.

Não era a vilã, mas nunca teve vocação para ser vítima. Não era benevolente, mas se fosse necessário enfrentaria o mundo para provar uma intenção genuína. Não era uma perfeita oradora com as palavras, mas dizia nos olhos um milhão de coisas por segundo.

Sam  era difícil de acompanhar. Quando você pensava que entendeu tudo ela te provava que debaixo daquela personalidade existia um sentimento escondido que a tornava a pessoa mais assustadora e interessante que você já conheceu.

Era impossível não querer descobrir seus segredos, mas ao mesmo tempo que havia a tentação de acessá-la havia um expresso aviso de cuidado no sorriso duro que ela era capaz de manter.

Ela sofreu demais, mas eu não sabia de um terço do quanto. Tentei perguntar, mas hoje estava convencida de que saberia no momento que ela entendesse que eu deveria e não havia mais pressa em mim.

Sua abertura era gradativa como a de um bebê separando as pálpebras e achando as cores do mundo. Era lento, quase parando, mas era também algo bonito de acompanhar de perto e mesmo que não fosse eu ainda estaria aqui, não tinha como não estar.

Não era pela razão de vivermos juntas e termos que manter a convivência. Era porque o jeito que brincava com o Chai e cuidava dele me deixava boba, era por sua maneira divertida e as vezes irônica, era pela forma como podia me beijar com absoluta paixão e ainda sim me dar um abraço enquanto me fazia dormir.

Ela era muitas em uma e eu não via a hora de redescobri-la mesmo sabendo que, como ela mesmo disse, eu ia me magoar no caminho. Era tão certo quanto dois e dois são quatro que aconteceria.

Mauro tinha algum plano com isso que eu não desvendei ainda, mas me deliciava com um pequeno caos de 1.60 inclinada sobre a varanda olhando aquele que cenário bonito de fazenda.

— Bom dia — Ela falou virando na minha direção, me invadindo com sua voz rouca de manhã. Seu sorriso era sensualmente natural e me fazia ficar olhando para ela sem querer.

— Bom dia — Eu disse saindo da porta para ir onde ela estava. Me sentei em um sofá que havia do lado de fora e Sam  foi para o meu lado. O café em sua mão foi oferecido a mim e eu bebi.

— Você já sabe como vamos abordar esse assunto ao chegar na loja? — Pois era mesmo delicado. Não tínhamos como chegar de súbito abordando aquilo sem qualquer preparação.

Combinamos o que e como faríamos, indo depois de tudo juntas de volta para dentro de casa. Eu queria muito ter perguntado sobre o que ela estava pensando, mas no temor dela se fechar para mim acabei não fazendo indagações. Ela me diria quando quisesse e enquanto não eu me contentaria com segurar sua mão se precisasse...

***

Não demoramos a chegar na loja naquela manhã. Era um lugar exponencialmente menor que a nossa sede na Barra, mas parecia muito bem movimentado. Fomos recebidas pelo gerente e, desde um primeiro contato, percebi seu nervosismo.

O homem não parava de bater com o pé no chão e suas mãos pareciam não parar de suar, pois ele as esfregava constantemente em sua calça jeans.

— É um prazer ter as senhoras aqui — Ele ainda disse, mas era muito óbvio que suas boas-vindas não chegavam aos seus olhos como ele queria — A que devemos sua visita? — Emendou desafrouxando um pouco a própria gravata. Não havíamos comunicado o motivo da visita, apenas que chegaríamos.

A família que eu herdei (Versão Freenbecky)Donde viven las historias. Descúbrelo ahora