Capítulo 08 - O aniversário que herdei

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Mon

Hoje eu descobri uma coisa sobre Sam que me deixou profundamente intrigada. Não, não era uma pintinha nova na sua barriga, essas eu tinha decorado todas com meus dedos e boca.

Também não era a maneira bonitinha como ela dormia sempre do mesmo lado da cama ou como acordava sempre querendo sair pelo lado contrário.

Tampouco tinha a ver com sua risada durando tempo demais depois da piada, pois ela aparentemente repercutia a anedota mentalmente por mais tempo que os seres humanos comuns, de um modo absolutamente adorável.

Tinha uma ligação profunda na verdade com algo que eu aparentemente estava inclinada a não gostar tanto assim. Uma diferença importante, que nos colocava em lados opostos outra vez depois de dias nos dando tão bem quanto podíamos quando éramos praticamente um cão e um gato de tão distintas.

Sam não gostava de aniversários. Não gostava de comemora-los, não gostava de menciona-los e nem dos docinhos da festa. Renegava a existência das máquinas de algodão doce e abominava todas as gerações de pipocas com leite condensado que poderiam ser servidas. E sim, para mim isso parecia uma profunda falha de caráter.

Eu cresci num abrigo para órfãos e em poucas oportunidades pude experimentar o que era se sentir especial. Não converso muito sobre aquela situação de tamanha exceção, mas a verdade era que doía se sentir invisível por todo ano, sendo o sofrimento minimamente aliviado no dia em que ganhava parabéns amáveis e um bolinho dedicado a mim.

Amava tanto aniversários que quando Chai nasceu não houve um único mês em que eu não não preparasse ao menos uma lembrancinha para celebrar a data. Não era nada grande, afinal nunca tive muito, mas sempre enchia o meu coração e o dele de amor.

Uma das minhas maiores realizações quanto rica certamente seria fazer uma enorme festa para mim com um bolo gigante, vários brinquedos de parque de diversões e músicas infantis, muito embora eu esteja na casa dos meus vinte e poucos.

Não conseguia imaginar como alguém poderia simplesmente não amar fazer tudo isso com todo dinheiro que a vida poderia oferecer. Como não gostar de assoprar velinhas? Como não querer abrir os presentes depois de todos terem ido embora? Como não ansiar criticar as toalhas e calcinhas recebidas pelas tias e primas e rir do dinheirinho escondido numa caixinha pequena pela vovó?

— Não gosto Mon, não é o meu tipo de comemoração — Ela argumentou beijando a minha bochecha cuja região estava cheia de pasta por dentro. Eu rebateria que aniversário era uma celebração democrática e que isso não existia, mas com a boca bem ocupada somente fiquei quieta por um momento.

— Então não fará nada em sua data? — Perguntei depois de cuspir o conteúdo pastoso pelos meus lábios. Da cama mesmo Sam concordou como se fosse uma escolha sem qualquer peso.

— Não — Ainda reiterou de maneira que eu pudesse ouvir, me deixando incrédula.

— Nem um bolinho? — Perguntei lavando a boca e seguindo para trocar de roupa. Eu sabia que ela estava sentada esperando o momento de se atrasar para o trabalho, mas eu não cairia na armadilha de insistir com ela e perder a hora. Faria os dois e venceria em ambos.

— Nem um cartão — Sam disse resoluta me puxando pela cintura até o colo dela onde me prendeu e começou a dar beijos no pescoço. Era sua forma de me tentar.

— Você não merece beijos com essa postura. Você não quer me dar a oportunidade de dar uma festa grande então não quero dar a você o privilégio de tocar meus lábios — Justifiquei desviando da sua boca e ela somente sorriu e revirou os olhos enquanto eu insistia em me soltar dela.

A família que eu herdei (Versão Freenbecky)Where stories live. Discover now