18 - Email

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Demorou meia hora para sair do quarto, querendo um tempo para respirar fundo e pensar no que faria caso se encontrasse com Mikaely. Não que não a tivesse visto e agido o mais naturalmente possível nos dias anteriores. Ou quase naturalmente, já que não se bicaram tanto com brigas e intrigas desnecessárias. Pelo menos tinha sorte dela e seu primo não serem mais ficantes, o que a deixava longe de conviver em sua mesa no refeitório ou de dar um jeito para aparecer no quarto deles.

Saiu do quarto e caminhou pelos corredores do dormitório masculino, indo em direção às escadas. O ambiente estava mais silencioso que o comum, o que deixava claro o fato da maior parte das pessoas estarem na confraternização organizada. João ainda não sabia o motivo da gestão pedagógica ter decidido aquilo, sem nenhum motivo próprio de comemoração. Talvez só quisessem alegrar os alunos? Não sabia. O importante era que ao menos teria comida e isso já lhe parecia o bastante para sair do quarto.

Quando enfim alcançou o exterior do dormitório, o vento gélido lhe recebeu. João Pedro encolheu os ombros e estremeceu com o repentino frio. Devia ter seguido o exemplo de Ismael e usado algo com mangas longas, e não aquela blusa preta simples.

Caminhou sem pressa em direção à festa, respirando fundo o ar fresco do exterior. Na verdade, estava um clima bastante agradável, graças a algumas chuvas no decorrer da semana.

Seus olhos focaram no aglomerado de pessoas a vários metros distantes, que começavam a surgir no horizonte. Reconheceu o que parecia uma fogueira, onde alguns grupos de pessoas estavam sentadas em volta. Escutou a música alta, mas não reconheceu o gênero. Também avistou as pessoas em pé, que dançavam, riam ou conversavam. A alguns metros dali, uma longa mesa com as comidas. Reconheceu Ismael lá, graças ao seu moletom destoante das demais roupas, mas não avistou Rikelmy e nem seu primo.

Parou de caminhar ao sentir a vibração no bolso da calça. Parou de andar em seguida. Franziu o cenho e tirou o celular. Poucas opções poderiam ser: uma notificação de algum dos seus jogos, alguma mensagem dos amigos ou um lembrete estúpido. Na verdade, até mensagens de texto eram um pouco difíceis. A internet e o sinal naquele fim de mundo eram horríveis, no nível que nem mesmo conseguia se comunicar com as pessoas fora dali — seus avós e mãe estavam nesse meio. As mensagens de texto na internet do internato mal conseguia suportar a quantidade alunos logados ou chegar às pessoas que não estivessem conectados a elas também. Ou seja, estavam todos sem qualquer notícia do mundo fora dali.

E, ainda assim, havia uma notificação de um email estranho.

Mesmo sem saber como a internet havia cooperado para receber aquilo, decidiu não testar a sorte e abriu logo a notificação

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Mesmo sem saber como a internet havia cooperado para receber aquilo, decidiu não testar a sorte e abriu logo a notificação.

Franziu ainda mais a testa ao perceber que era um vídeo de menos de vinte segundos. Com a mensagem estranha logo abaixo dele, João ficou receoso com o que veria. Então apertou no play e esperou que a internet tivesse a boa vontade de carregá-lo. Demorou alguns longos segundos, mas enfim a imagem borrada ganhou nitidez. Então o vídeo começou.

Com o coração disparado e os olhos arregalados, percebeu se tratar de uma gravação de alguma câmera de segurança noturna. Não qualquer câmera de segurança, mas a da biblioteca. Mesmo com a pessoa tendo gravado com sua própria câmera traseira a imagem do monitor, João conseguia distinguir o que acontecia.

Com a imagem em preto e branco, observou um João Pedro e Mikaely risonhos, sentados lado a lado e próximos um do outro. Muito próximos. Mais próximos do que se lembrava que realmente estavam.

Não havia som no vídeo, mas era óbvio que eles riam. Pela maneira que se encaravam, nem mesmo João conseguia negar que algo estranho estava acontecendo ali. Então ele e a Mikaely de uma semana atrás se aproximavam, ainda rindo, e parecia que algo rolaria ali. E era bem nesse instante que o vídeo terminava.

Mas que...

João Pedro teve seu pensamento cortado ao escutar passos apressados se aproximando. Voltou o olhar para a frente, onde avistou Clara caminhando, em sua direção. Mas o pior foi perceber a raiva em seus lábios retorcidos e nas sobrancelhas franzidas, além do celular em mãos.

Merda.

— Cla...

— O que é isso?! — Ela levantou o aparelho e quase o esfregou no rosto de João. Ele precisou dar dois passos para trás, evitando que aquilo acontecesse. — Tá achando que eu sou burra ou o quê?

Ajeitou os óculos e fitou a tela de sua ficante.

O mesmo vídeo, pausado no instante em que João e Mikaely se aproximavam.

Merda, isso faz realmente parecer que aconteceu algo.

— N-não é nada disso que você está pensando.

A garota abaixou a mão com o celular, cruzando os braços.

— Nossa, uma frase nada clichê, né? — Ela arqueou uma sobrancelha. — Você mentiu para mim. Ficou com aquela garota. Ficou com aquela desgraçada e ainda me fez parecer louca.

João respirou fundo.

— Eu não fiquei com ninguém, Clara. Acredita em mim. No vídeo nem aparece que a gente fez algo. A pessoa que gravou isso fez de má intenção. Eu juro que não passou nada. Mikaely e eu...

— Eu não quero saber, Pedro! — Clara cortou. — Sabe o que você faz? Enfia esse vídeo na bunda e gira, o.k.?

Abriu a boca em palavras não ditas, observando a garota se afastar em passos pesados.

— Clara, pelo amor de...

— Me esquece, garoto! — Ela gritou por cima dos ombros, o rosto vermelho. — Não existe mais nada entre nós.

João Pedro apertou o punho livre.

Ah, maravilha. Que ótimo.

Desbloqueou seu celular e releu a mensagem que acompanhava o vídeo, assim como o remetente: isakl3384@email.com

Tentou ver a foto de perfil da pessoa, mas não sabia se era a internet ruim ou se realmente não havia nenhuma imagem nela. Tampouco podia saber se era alguém próximo dele que fizera aquilo, pois o email para o qual enviaram era o que todos os alunos do DulciVa foram obrigados a fazer e podiam ver no quadro de avisos da escola. Provavelmente assim conseguiram o próprio email de Clara.

Respirou fundo e tentou não apertar o celular em sua mão.

Alguém fizera aquilo de propósito. Alguém que queria vê-lo sem a Clara. Mas quem?! Que pessoa conseguiria entrar na sala de câmeras de segurança? Nem ele sabia onde ficava ela! Duvidava que algum aluno tivesse aquela informação. Então só sobrava algum funcionário com passagem fácil para lá. Mas quem da escola iria querer prejudicá-lo?

Primeiro pensou em Jean e na fofoca que espalhou. Mas então chegou a um pensamento mais coerente.

Mikaely.

João Pedro grunhiu.

Claro. Aquilo só podia ser obra da maldita da Mikaely com a ajuda de algum funcionário que ela fizera amizade. Não a viu conversar com alguns professores e indo na coordenação pedagógica com as amigas?

Sim, sem dúvidas tinha sido aquela piranha.

João bufou, dando meia volta e desistindo de ir à festa. Se encontrasse Mikaely ali, seria capaz de esganá-la.

O (amor) Assassino Está Entre NósWhere stories live. Discover now