19º Capítulo

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Sento-me a frente de Harold, apoiando a cabeça na mão, como se esta fosse demasiado pesada para se manter sozinha. Espero que o rapaz que encaro fale.

 Observo os seus olhos a desviarem-se para o chão e o seu sobrolho franze-se. Olho-o confusa e sigo a sua linha de visão.

 “Oh. Desculpa!” digo-lhe e salto da cadeira, embaraçada.

 A poça amarelada de leite com café ficara esquecida, por completo, entre os acontecimentos de há pouco. Pego num pano húmido e numa esponja para limpar os vestígios do meu susto. Coloco-me de joelhos, os meus movimentos tensos, sob o olhar de Harold que queima a minha nuca.

 O que fará ele aqui, a estas horas da manhã? Será por causa da notícia que me apanhou desprevenida esta manhã? Penso enquanto tento livrar-me do resultado do súbito aparecimento do rapaz de olhos manipuladores, que por sua vez, se encontra calmo, na minha cozinha e não desvia o olhar das minhas costas.

 Suspiro após acabar a minha tarefa e sento-me de novo à mesa encarando os olhos desprovidos de emoção de Harold. Um verde acinzentado preenche todo o meu campo de visão. Pareço vidrada naquele olhar encantador.

 “Hoje é dia 19.” Declara calmamente.  “Fui a procura daquele ‘jardineiro’ que me falaste” começa e os meus olhos iluminam-se com esperança de ele ter descoberto algo, como se me esquecesse da minha decisão. “Ele não existe” continua após alguns segundos de silencio. Estas palavras mudam a minha expressão para uma confusa, contorcendo as minhas feições num franzir de sobrancelhas. “É como se o rapaz tivesse evaporado.” Prossegue calmo, não se mostrando nada surpreendido. “Alexandria,” chama-me, e eu olho para ele, reparando que estive todo este tempo a encarar a mesa. “ele deu um nome falso aos pais de… hum… Ah. Edward.” Lembra-se “e após terminar aquele trabalho nunca mais ninguém o viu.” conclui suspirando e eu desvio de novo o olhar para a mesa, percebendo que não vamos mesmo descobrir quem é este assassino que atormenta a nossa vila no dia 19 de todos os meses. Porquê 19?

 Sinto que Harold me observa e decido falar:

 “Vou esquecer tudo isto. Nunca me devia ter metido nisto” abano a cabeça negativamente, desiludida comigo mesma. “Estes assassinatos… Pensei que fosse minha obrigação descobrir algo, já que aquele vidro com sangue estava no meu jardim… mas…” perco o folego como se algo me obrigasse a parar de falar. Contudo, tento esquecer essa força suspeita.

 Não percebo porque me meti nisto. Qual foi a razão que considerei válida para colocar-me no meio de toda esta confusão de sangue, números e vítimas? Porém, foi esta confusão que me trouxe até este rapaz, na porta do qual dormi e que controla o pensamento e encanta, ao mesmo tempo. Percebo que estou a olhar para ele há demasiado tempo e levanto-me indo até a bancada da cozinha, suportando o meu peso nas mãos, que se apoiam na mesma. Fecho os olhos. A minha mente parece ainda limpa após as minhas decisões, começando a apanhar algum pó aqui e ali… Pó faz-me lembrar livros antigos, que guardam histórias inéditas que eu adorava descobrir. Os meus pensamentos levam-me até ao livro que tenho de acabar de ler.

 OH NÃO! Devo estar muitíssimo atrasada para a livraria!

 Num movimento brusco viro-me e tudo pára. Como no meu sonho desta noite. Nada se move. Os únicos sons existentes é o tick, tack do relógio, que agora é o que menos me incomoda, e a minha respiração pesada.

Tick, Tack.

Ispiro e expiro profundamente.

O seu peito demasiado perto do meu

Tick, Tack.

Glass Masterpiece || h.sWhere stories live. Discover now