CAPÍTULO 14

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Eu vi papai sair com Adam e Creek, vovó sorriu.
"Ah, esse menino! Adora brigar, eu não sei quem ele puxou." Ela disse indo para a cozinha.
Eu sorri para Rosalie e subi as escadas avisando vovó que eu iria ler um pouco. Não ia demorar muito para o vovô ir atrás do meu pai e não só ele como a maioria da nossa família. Eu tinha tempo.
Eu tomei um banho rápido, me sequei e coloquei um vestido que ganhei de Grace, segundo ela tocar em roupas ou objetos de estima a ajudavam a ver melhor e quando ela viu esse vestido, ela sentiu que seria o vestido que eu usaria em meu primeiro beijo. River ergueu uma sobrancelha na ocasião e eu senti um calafrio, ele era menorzinho, mas eu acho que devia ser ciúme, ele gosta muito de mim, sou a prima favorita dele.
Eu soltei meu cabelo, olhei em volta e pensei se calçava uma sandália de tiras, mas eu achei melhor não, eu amava andar descalça.
Eu pulei da janela para o telhado do quarto dos tios clones, de lá para um terreno que havia atrás da casa e corri margeando a estrada. Era longe, mas graças a minha porção canina eu adorava correr. Papai também corria muito rápido e saltava grandes metros. Eu ri me lembrando de quando corremos na chuva e o terreno estava tão molhado que ele saltou e ficou preso, com barro até os joelhos!
Hoje não havia chuva e a lua estava enorme, brilhante. Papai, eu e Dezessete uivávamos para a lua em noites como essa na nossa jaula-casa. E foi numa noite dessa que eu tive essa visão. A visão de mim e um macho de cabelos brancos se beijando banhados pela luz da lua.
Eu devia ter uns oito anos na época, eu estava uivando com papai e Dezessete, eu fechei os olhos fazendo força para uivar mais alto e eu vi. Primeiro os olhos azuis. Dezessete tem olhos azuis, olhos como os meus, e os de papai que eram uma mistura, as vezes ficavam meio verdes, mas na maioria das vezes eram azuis. Eu parei de uivar, papai e Dezessete continuaram, os olhos pertenciam a um rosto. Um lindo rosto emoldurado por cabelos brancos. E o rosto se aproximava, a boca de lábios cheios ficou na minha frente e eu levei um choque com a boca dele encostando na minha. Eu abri os olhos, papai e Dezessete olhavam para mim, eu tive de uivar o mais alto que eu consegui.
Eu parei um pouco, alguém passou correndo, isso acontecia muito quando se corria na Reserva. Eu esperei e voltei a correr, ainda estava longe.
Ele me lembrei de que quando eu cheguei eu procurei entre os espécies e não vi ninguém de cabelos brancos. Josh tinha cabelos loiros bem claros, mas não eram brancos. Eu perguntei como quem não queria nada sobre algum espécie de cabelo branco e descobri que havia um tal de Snow e ele tinha um filhote, um muito amigo de Blade, aquele rapaz bonzinho que trabalhava fazendo móveis. Mas era um filhote dos mais velhos da idade de Pride, eu acho. Ele trabalhava em Homeland e quando vinha para a Reserva ficava na casa de Lash. Eu tinha pensado em pedir para papai me levar a Homeland para conhecer, mas vovô disse que lá parecia uma cidade humana e que você tinha de ligar para fazer uma visita. Eu não achei isso uma coisa ruim, mas para o vovô era frescura. Tio Harry ia muito pra lá e eu ia pedir para ir com ele, quando Honor prendeu Livie na cabana, os leãozinhos a tiraram de lá e Honor foi na nossa casa buscá-la. E eu conheci Honest.
Os olhos dele eram dourados e os cabelos eram vermelhos, cores totalmente quentes, avessas ao azul e branco que eu sonhava, mas eu me encantei com ele, com os olhos um pouco calculistas, inteligentes, mas ainda assim bondosos. Papai disse que quebraria todos os ossos da mão dele, ele sorriu, de lado, dizendo que por algumas coisas valia a pena sentir dor e ele olhou para a minha boca quando disse isso.
E eu esqueci os cabelos brancos e olhos azuis. Por que escolher o frio, intangível, quando o calor era tão mais acessível e abrasador?
Mas aí, ele ficou doente, o macho galinha, como papai chamava, o deixou de cama, imóvel, preso em seu corpo. E eu me senti tão inútil! Do que adiantavam as visões? Papai quis matar o macho galinha, eu e Dezessete arrancamos um monte de penas dele, mas o deixamos vivo e ele machucou Honest. Eu estive frente a frente com ele, poderia ter esfaqueado ele, mas eu não fiz nada!
Eu parei no começo da montanha, meu coração disparou com a proximidade da realização da visão.
Eu subi andando dando tempo ao meu coração para se acalmar, era uma alta montanha. Diziam que era o felino dentro dele que o fazia gostar de alturas. Eu como primata e canina gostava dos lugares baixos, da segurança do chão.
Eu me lembrei então do funeral de Honest. Foi a primeira vez que eu tive raiva de uma pessoa. Todos tratavam Lunna como se ela fosse uma companheira que perdeu seu companheiro, mas Honest nunca pediu para acasalar com ela. E eu também cuidei dele um dia, um em que tia Tammy foi ficar com ele e eu cheguei com vovó. Tia Tammy estava meio embananada com todos os fios e sondas, eu e vovó ajudamos. E foi a primeira vez que eu vi um pênis. Um adulto, é claro, eu e Dezessete tomamos banho juntos durante um bom tempo até papai dizer que não podíamos mais. Eu ajudei a vovó a trocar a fralda dele, havia uma sonda na ponta, mas deu pra ver bem como era. Estranho, mas...
Eu me lembro do vovô também chorando, mas não era um choro triste era um choro preocupado. Eu senti isso e quando eu chorei, vovô me abraçou dizendo que tudo poderia ter sido tão diferente! Eu não chorei muito, algo dentro de mim me dizia que Honest não ia gostar de me ver chorando, ele não iria querer ninguém chorando por ele, eu não sei como eu sabia disso, mas eu sabia.
Tudo voltou ao seu normal, eu não era muito de sair de casa, nunca fui, papai é muito violento. A notícia de um Nova Espécie resgatado da tal funerária chegou lá em casa pelos tios clones, eles eram amigos dele. Ele tinha cabelos brancos, todos diziam isso e eu me animei, mas num churrasco, ele estava lá com os leãozinhos e parecia tão triste! Eu pude sentir tristeza e saudade vindo dele, Dezessete disse que o viu com papai, papai disse que não se lembrava dele.
Papai foi criado numa instalação, uma que havia na nossa ilha e foi lá que eu e Dezessete nascemos. Papai disse que haviam outros Novas Espécies lá. O tal Doze era um dos que participavam das caçadas. Eu então entendi a distância e a tristeza que ele parecia sentir, pois se não fosse Honor eu e Dezessete teríamos morrido.
O tempo foi passando e de vez em quando eu sonhava com a visão, mas não tinha coragem de me aproximar. Algo me dizia que ficasse longe de Doze, mas eu também não conseguia esquecer a visão.
Eu ia subindo a montanha, andando devagar, pensando se eu devia. Mas aquele ali era Honest, não era?
Foi tão impactante saber que Candid tinha colocado ele no corpo de Doze! Meus tios clones tiveram uma experiência parecida, Tio Adam não falava nisso, mas Tio Noah falava, ele dizia que tinham de colocar para fora aquilo, que não foram eles que fizeram o que fizeram. Então, quando ele revelou que estava no corpo de Doze, pois seu corpo tinha morrido, todo mundo festejou. Vovô ficou muito feliz, todos lá em casa ficamos felizes. E Ella tinha sido o motivo para ele se revelar, não tinha sido Lunna. Honest foi pessoalmente testar o sangue de Ella para saber se ela era filhote de Joe ou de James. Ele era tão inteligente!
Ella era filhote de Joe e todos ficamos muito felizes por ele. Eu vi que James ficou triste e eu entendi James, por que eu sabia o que era querer algo que não se podia ter.
E eu fiquei observando Honest de longe, Lunna também não foi atrás dele, eu tive de respeitar ela nisso.
Até que ele ficou doente de novo e quando ele melhorou, vovô foi vê-lo e eu tinha de ir. E os olhos dele estavam diferentes, ele chamou vovô pelo nome do papai, ele parecia muito confuso.
Eu cheguei no topo da montanha com o coração disparado e as pernas bambas. Exatamente como minhas pernas ficaram hoje de manhã. Ele me olhou daquele jeito que olhou no hospital. Com calor nos olhos frios.
Eu queria correr até a cabana e também queria correr montanha abaixo, eu não sabia o que fazer e minha coluna até vibrava com tantos calafrios.
Ele abriu a porta e sorriu, ele usava só uma calça de moletom, mostrando seu peito enorme cheio de músculos. A pele dele era branca e haviam alguns pelinhos finos e brancos em seu peito formando uma trilha por sua barriga musculosa. Eu até tranquei os dentes, tudo em mim dizia para correr, mas meu coração queria ficar.
Ele foi até mim e sorriu. Eu sorri de volta. Ele era tão lindo! O calor dos olhos dourados de Honest, do Honest antigo parecia estar nos azuis de agora, ainda que eu sentia os olhos dele tão diferentes dos de Honest!
"Você veio." Ele disse baixinho, eu aumentei o sorriso, eu estava feliz por estar ali.
"Vem, a lua está bem no alto." Ele me guiou pela mão, o calor da mão dele na minha era tanto que eu me molhei entre as pernas, ele parou do lado de uma grande pedra, me pegou nos braços e pulou comigo no colo, eu gritei, ele riu.
E foi exatamente como a minha visão. Ele ria, eu ria, mas quando ele me colocou sobre meus pés, ele parou de rir. O rosto bonito, emoldurado pelas ondas de cabelos brancos se aproximou, eu mergulhei nos olhos dele, ele olhou para a minha boca, eu olhei para a dele. A boca dele foi chegando e o choque foi muito mais forte que na minha visão, percorreu todo o meu corpo, eu fiquei toda tensa.
"Calma, aproveite." Ele sussurrou contra a minha boca, eu lambi os lábios dele, ele lambeu os meus e enfiou a língua na minha boca. Eu pulei, foi...
Eu não sei explicar, foi bom, muito bom. Eu imitei ele, ele sugou a minha língua quando eu a enfiei na boca dele, eu o abracei, enviando todo o medo que me tomava e eu não sabia por quê para o fundinho do meu coração.
Ele me apertou contra ele, quando eu senti algo duro contra a minha barriga eu tentei me afastar, ele me apertou.
"Não fuja, minha Vinte e Cinco." Ele falou e não entendi.
Eu ia perguntar quem era Vinte e Cinco quando senti uma pontada de dor em meu pescoço, minha voz sumiu e tudo ficou escuro.

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