TWELVE | PIG

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Em um determinado ponto da caminhada, fomos surpreendidos por mortos. Muito deles. O grupo inteiro entrou em desespero até Charles nos informar que aquelas coisas estavam amarradas às árvores por seus pescoços. E ele estava certo.

— mas que merda é essa? — Carter perguntou quando observou os bichos com mais atenção. Eles estavam sem metade dos braços e suas bocas estavam costuradas, além de estarem presos como cachorros.

Tudo ficou mais claro quando um dos aldeões, que estava com a gente, assobiou e os mortos foram afastados por outros aldeões, que surgiram por de trás de algumas árvores, revelando grandes portões de madeira com plantas trepadeiras.

Era a entrada da aldeia.

— Andem! — o aldeão de pele azulada ordenou, sem muita paciência, quando nos deram passagem. O obedecemos.

Voltamos a caminhar, agora, por um caminho sem muito mato e iluminado por tochas. Logo, foram aparecendo pequenas casas feitas de madeira e palha que certamente serviam como moradias. Entre elas, existiam pequenos cercados que abrigavam e separavam diversos animais.

— Onde está todo mundo? — Victória sussurrou atrás de mim e eu lhe devolvi a pergunta com o olhar.

A nossa pergunta foi respondida quando os aldeões nos encaminharam para o outro lado da aldeia.

Ficamos surpresos e assustados quando encontramos todos os moradores da aldeia sentados no chão, em frente à uma grande tenda de palha que era iluminada por uma grande fogueira, todos fazendo movimentos sincronizados com os seus troncos.
Um pequeno grupo deles batia em tambores e tocava instrumentos enquanto cantavam algo em outra língua.

De repente, eles pararam e, de dentro da tenda, surgiu uma mulher. Ela era negra, possuía os chifres de algum animal na cabeça e o seu corpo estava coberto por uma tinta branca. Todos se curvaram perante ela ao ponto de suas testas tocarem o chão. Depois da reverência, os tambores voltaram a ser tocados, dessa vez com mais força.

Do outro lado, um aldeão puxava um porco grande e forte até a mulher. Ele amarrou o animal por suas patas traseiras e o pendurou de cabeça para baixo. O porco grunhia de forma agonizante, se sentindo torturado. Em baixo dele foi posta uma bacia de barro larga e funda.

— Eu não to gostando nada disso — Margot confessou assustada, mas sua voz foi abafada pelos gritos da mulher que começara um pequeno discurso.

* — Ọlọrun ti awọn Ọlọrun! Iya Ẹwa! Eleda ti awọn ọkunrin! — a mulher parecia invocar alguém — A nṣe ẹbọ ati ẹbọ lati ṣeun fun irọlẹ ti ilẹ ati fun awọn ẹmi ti awọn ẹranko ti o wọ ati ifun wa — ela se agachou, melou a mão direita de terra e a lambeu. Ela se levantou, abriu os braços e um aldeão colocou uma faca que brilhava em sua mão recém-melada. — gba, iya, ẹjẹ ẹranko yii bi ẹri ti oore ati ife wa! — parecia clamar.

gba, iya! — o povo clamou junto em uníssono.

Então, a mulher acertou o porco com a sua faca e o rasgou ao meio de um jeito que seus órgãos pularam para fora. Todos os recrutas recuaram um passo, exceto Charles que virou para o lado oposto e vomitou.

isimi ni alafia, ẹjẹ ti ẹjẹ mi — a mulher disse e o povo repetiu.*

Ela pegou a bacia de barro que agora estava cheia de sangue e levantou aos céus. Depois, um aldeão se prontificou a segurar essa mesma bacia, onde a mulher mergulhou suas mãos e levou o sangue ao seu rosto com os dedos. O povo começou a se levantar e a formar uma extensa fila em frente à mulher que melava o rosto de cada um deles com o sangue do animal sacrificado.

Um dos dois aldeões que estavam com a gente, se aproximou da mulher e trocou cerca de duas frases que a fez nos encarar com os olhos estreitados. Ele voltou para perto de nós e, sem dizer nada, nos arrastou para uma das tendas mais afastadas.

— Guardas. — ele disse quando nos empurrou para dentro da mesma e apontou para dois outros aldeões que eram maiores e mais fortes — Não saiam. Morte. — ele fez um sinal com a mão no pescoço, como se uma faca passasse por ele.

Essas quatro palavras e gestos foram suficientes para que entendêssemos que estávamos sendo vigiados e que qualquer tentativa de fugir ou sair dali de dentro, resultaria em nossa morte. E depois do que acabamos de presenciar, sabíamos que eles não hesitariam em nos matar.

A tenda em que estávamos era minúscula e não possuía nada demais, além de palhas amontoadas e baldes enferrujados.

— Eu não acredito que saímos daquele buraco em que vivíamos para sermos mortos em um ritual satânico! — Karl praguejou assim que o aldeão nos deixou, chutando uma pedra.

— Nós não vamos morrer, Karl — eu tentei o tranquilizar.

— Ainda — Victória retrucou.

— Como não vamos morrer? Você viu o que aquela louca fez com o porco? — ele apontou para a porta da tenda — Se ela fez aquilo com um animal, imagina o que não fará com nós — dramatizou.

— Vocês podem, por favor, evitar falar sobre aquele pobre animal? — Charles pediu com as mãos na barriga, ele havia se sentado no chão assim como a Victória.

— Você está bem? — Margot perguntou preocupada e se sentou ao seu lado. Charles estava enjoado e traumatizado, ele estava longe de bem.

— Vamos pensar pelo lado positivo. Eles não estavam matando nenhum ser humano, possa ser que só nos queiram como escravos — eu tentei os tranquilizar novamente.

— Esse é o seu lado positivo? — Karl perguntou de maneira debochada.

— O que vamos fazer, capitão? — Amon perguntou para o Carter que suspirou em frustração.

— Não temos muitas escolhas, a não ser cooperar com eles. Não posso arriscar perder mais um de vocês. — respondeu verdadeiro, parecendo estar esgotado fisicamente e mentalmente. Ele se afastou mais um pouco dos recrutas e se sentou perto da entrada da tenda.

— Carter — eu o chamei e o mesmo me encarou — aonde foi que a gente se meteu? — murmurei temerosa, sentando ao seu lado.

— Eu não sei, Baker — ele respondeu, suspirando e bagunçou seu próprio cabelo — eu não sei — disse, desta vez, para si mesmo.

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Dicionário:

*Ọlọrun ti awọn Ọlọrun = deusa dos deuses

Iya Ẹwa = Mãe natureza

Eleda ti awọn ọkunrin = criadora dos homens

A nṣe ẹbọ ati ẹbọ lati ṣeun fun irọlẹ ti ilẹ ati fun awọn ẹmi ti awọn ẹranko ti o wọ ati ifun wa = Oferecemos este sacrifício e adoração para agradecer-te pela fertilidade do solo e pela vida dos animais que nos vestem e nos alimentam

gba, iya, ẹjẹ ẹranko yii bi ẹri ti oore ati ife wa = aceita, mãe, o sangue deste animal como prova de nossa gratidão e amor

isimi ni alafia, ẹjẹ ti ẹjẹ mi = descanse em paz, sangue do meu sangue*

Os Recrutas nesse momento:

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Ninka Baker e Os RecrutasWhere stories live. Discover now