TWENTY SEVEN | SORRY

2.6K 435 130
                                    



A porta de restrição escondia nada mais, nada menos do que um corredor estreito com dois cômodos, a sala do que supus ser o gerente e uma sala de descanso para os funcionários - que consistia em um sofá, uma mesa redonda com algumas cadeiras, um armário e um cantinho para o café -, e no final dele havia uma escada que nos levava até uma saída de emergência.

— É o segundo andar — Aiken disse ao voltar da saída, ele havia se voluntariado para checar se estávamos seguros ali dentro — Tem alguns mortos perambulando por lá também, mas nada que não possamos dar conta.

— Será a nossa saída — Carter concluiu e eles acenaram um para o outro com a cabeça, como se concordassem.

Okay, estranhos.

— CHARLES! — o grito de Margot fez com que todo mundo corresse para a sala do gerente para ver o que acontecia.

A loira estava ajoelhada ao lado do meu amigo que parecia ter desmaiado na cadeira giratória do escritório empoeirado.

— O que aconteceu? — Ayla perguntou, parecendo preocupada.

— Nós estávamos conversando sobre esses computadores antigos, ele chamou de relíquia e estava me contando que era o mais avançado da época e aí ele apagou — relatou tudo rapidamente, colocando a mão na testa do garoto — Ele está com febre e está pálido.

— Pode ter sido cansaço pelo esforço físico, nós corremos muito — Amon chutou a causa.

— E também levamos o susto com a queda da Ninka, então a pressão dele pode ter baixado — Victoria concordou.

— Não — eu disse quando minha cabeça formulou uma teoria — Ele está pálido demais.

Ganhei a atenção dos meus amigos quando me agachei ao lado de Charles e levantei a sua calça de pano, vendo que o seu curativo estava manchado de sangue. Engoli em seco e desfiz o nó da faixa presa ao redor de sua perna. Quando ela finalmente saiu por completo, comprovei a minha teoria.

Tinha um pequeno buraco em seu tornozelo, a pele ao redor totalmente branca e o sangue estava em três tons mais escuro. As veias ao redor estavam bem mais evidentes, como sinal de que estava bombardeando aquilo para todo o seu corpo.

— O que é...— antes que Margot terminasse a sua pergunta, eu a respondi, sentindo tudo dentro de mim doer.

— Ele foi mordido — a minha afirmativa fez com que todos fizessem expressões de pânico.

— Mas...como? Eu estava lá o tempo todo e não vi quando aconteceu — Victoria tentou entender, atordoada.

— Você disse que vocês foram atacados por um aldeão recém-transformado, certo? — Ayla perguntou e Victoria assentiu — Em algum momento, quando ele caiu, pode ter mordido o Charles. Pessoas recém-transformadas possuem a mesma quantidade de vírus que um morto antigo, a diferença é que o corpo ainda não passou por todas as mudanças físicas.

E o coitado deve ter pensado que a dor foi por causa do outro machucado.

— Eu preciso de remédio, eu preciso de ervas pra passar na mordida ou pode infectar. Eu preciso de...— Margot se levantou, começando a andar. Ayla a segurou pelos ombros, fazendo a menina parar para lhe encarar.

— Margot, eu sinto muito, mas isso não tem cura — disse o que todos nós já sabíamos.

Não, não, não, não...— minha amiga se jogou nos braços da andarilho enquanto choramingava em negação.

Me levantei, me sentindo um pouco zonza. Um bolo ficou alojado na minha garganta e meus olhos queimavam pelas lágrimas que eu me recusava a soltar.

Baker...— Carter tentou se aproximar.

— Eu preciso ficar sozinha — o cortei, me desviando dele para sair da sala e ir para a outra.

Levei minhas mãos até a minha cabeça e comecei a andar de um canto a outro. Eu disse que estava com um pressentimento ruim sobre aquela fuga, eu deveria ter escutado os meus instintos. Não podia estar acontecendo de novo. Eu não podia estar perdendo outra pessoa que amava. Eu não podia perder o meu melhor amigo.

— NÃO! — gritei com raiva e soquei a primeira coisa que apareceu no meu campo de visão: o armário de alumínio, que acabou ficando amassado.

Comecei a socar com a mesma mão várias e várias vezes seguidas, tentando transformar a dor no meu peito em uma dor física.

Ei, ei, ei, ei, ei! — alguém me puxou por trás e eu comecei a me debater, eu precisava fazer aquela dor parar.

— Me solta! — ordenei com a voz embargada e o corpo trêmulo.

A pessoa me virou para si e só então me dei conta que era o Aiken.

— Ei...calma — pediu em um sussurro, segurando o meu rosto com as suas mãos.

As lágrimas vieram novamente e desta vez eu não consegui as segurar por tanto tempo.

— Aiken, eu não consigo passar por isso de novo — eu falei, sentindo minhas pernas fraquejarem, então ele me abraçou com força — Tá doendo. Tá doendo muito.

Minha voz soou abafada contra o seu peito, mas ele escutou mesmo assim.

— Eu sei — ele começou a alisar as minhas costas e eu escorei minha testa em sua clavícula, me sentindo vulnerável naquele momento — Está tudo bem, Ninka. Pode se permitir sentir, ninguém vai te julgar por isso.

Então eu chorei. Chorei e solucei ao ponto de encharcar a camisa do Aiken que só me largou quando teve a certeza de que eu havia me estabilizado novamente. E quando parei, ele me olhou e sorriu. Não um sorriso alegre, mas um sorriso reconfortante. Como se dissesse que não precisaríamos falar sobre aquilo e que ele estaria ao meu lado para caso eu precisasse dele. E eu sorri de volta, o agradecendo silenciosamente.

— Com licença — Ayla bateu na porta ao nos ver parados olhando um para o outro — Vão trazer o Charles para o sofá — informou e eu assenti, colocando o cabelo atrás da orelha e enxugando o meu rosto de qualquer vestígio de lágrima.

Logo Amon e Karl estavam entrando na sala carregando o Charles pelos braços e pelas pernas. Me apressei em tirar as almofadas para que não atrapalhasse e depois as botei embaixo da cabeça dele, que ainda estava desacordado.

Aproveitei a nossa aproximação para lhe sussurrar:

— Eu sinto muito, Charles.

Ninka Baker e Os RecrutasWhere stories live. Discover now