Capítulo 3

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As horas parecem voar com o vento e se transformar em dias. As luas mudam e ele não é encontrado em parte alguma. Sua ameaça é desacreditada e muitos duvidam de sua existência. Até eu duvido de meus próprios olhos toda vez que acordo aos prantos no meio da noite com seus olhos assombrando minha mente, mas ele nunca está lá.

Levanto e um pé de cada vez vou até a janela.

— Não há o que temer. Não há o que temer.

Repito vez após vez em minha mente.

 Ele não ousaria voltar aqui, não importa o quão habilidoso seja para ter escapado de todos os guardas, ele não seria tolo o bastante para voltar. Respiro fundo e por uma fração de segundos meu coração parece parar de bater. Com as mãos ainda trêmulas e de olhos fechados abro lentamente a janela. Após alguns segundos, abro-os novamente e percebo que eu estava prendendo a respiração. Lá fora vejo apenas a lua cheia na imensidão do céu noturno. Suspiro e apoio as mãos no parapeito da janela, coloco uma mecha de cabelo atrás da orelha e respiro fundo sentindo a brisa suavemente bater em meu rosto. Desde o dia em que ele apareceu em meu quarto há um grande peso no meu coração. Tentando focar a mente em alguma outra coisa fecho a janela e cubro minha camisola com um roupão, logo em seguida saio do quarto.

— Gōngzhǔ? Precisa de algo?

O guarda ajeita a postura ao mesmo tempo em que engole seco. Seu rosto mostra que ele está cansado e sonolento, provavelmente estava bocejando a um segundo atrás. Sorrio de leve vendo seu nervosismo e aceno com a cabeça para que relaxe.

— Perdi o sono preciso de um bom copo de chá. Não se preocupe, está tudo bem.

Ele continua me olhando. É apenas um garoto de no máximo vinte anos e parece assustado por estar ali. Provavelmente está sendo forçado a cumprir um turno mais longo devido a falta de guardas. Teríamos mais soldados no palácio se não houvessem tantos ataques de espiões e traidores se rebelando, se não fosse isso todos poderiam dormir em paz.

— Vou pedir que tragam para a senhorita!

Aceno negativamente com a cabeça assim que ele diz isso e fecho a porta atrás de mim. Tento não transparecer que a poucos instantes eu estava com medo de que até minha própria sombra pudesse ser o assassino que voltou para cumprir suas palavras. Sorrio para o guarda.

— Eu mesma busco, não se preocupe. Eu volto em minutos!

Sem esperar resposta, começo a caminhar em direção a cozinha. O cômodo é grande e a essa hora está ocupado apenas por algumas mulheres que passam a noite aqui caso precisemos de algo. Quando me veem levantam rapidamente e fazem reverência, logo após se afastam um pouco.

— Por favor, gostaria de dois copos de chá.

Peço sorrindo suavemente. Uma das mulheres vai até a chaleira sem dizer nada. Elas parecem incomodadas. Vejo uma das mulheres ir até uma das janelas e acender uma lamparina que logo ilumina todo o local. Dou um sorriso ao enxergar melhor o ambiente em que quando era pequena entrava sorrateiramente para roubar bolinhos. Ao passar meus olhos pelo local próximo a janela, onde ela deixou a lamparina sinto estranheza pois se a deixasse na mesa, o lugar seria melhor iluminado. A mais velha volta com dois copos fumegantes de chá e estende para mim. Isso me tira de meus pensamentos paranóicos.

— Aqui está Gōngzhǔ. A senhorita precisa de mais alguma coisa?

Sinto meu sorriso se alargar em meu rosto e faço uma leve reverência em forma de agradecimento. Ela me responde com um olhar assustado ao perceber meu gesto. Sinto meu sorriso desaparecer.

— Não. Obrigada pelo chá!

Viro as costas e começo a caminhar de volta para meu quarto. No caminho há guardas me observando por todos os lados. Subo as escadas até o terceiro andar e o guarda que estava na porta suspira aliviado ao me ver. Paro à sua frente e estendo um dos copos para ele, que fica apenas me encarando.

— Vai ajudar a descansar melhor. Não precisa se preocupar..

Ele aceita o copo e devolve um sorriso singelo ao tomar um pequeno gole de chá. Faço um leve gesto com a cabeça e entro em meu quarto. Sento em minha cama de frente para a porta e fico observando algumas folhinhas se movimentando dentro do líquido fumegante no copo e o levo aos lábios. Quase que imediatamente meu corpo começa a relaxar. Observo os finos galhos de cerejeira pintados na parede enquanto tomo outro gole de meu chá.

— Como está o chá?

Sinto um choque que percorre desde a ponta dos meus pés até a altura da minha nuca e meu corpo estremece ao ouvir a voz grave e suave ecoar pelo quarto. Levanto em um pulo e me viro para a janela antes fechada. Lá agora há um homem, devido a luz do luar consigo ver um pouco de suas feições calmas e aterrorizantes que me fazem entrar em desespero.

 Tento correr até a porta mas sinto meu corpo ser puxado para trás e minha boca ser tampada. O copo cai no chão espalhando o restante do chá. Luto para fugir, porém é em vão. Me debato tentando fazer com que ele me solte ao mesmo tempo em que tento gritar, mas sua mão abafa meus pedidos de socorro. Minha visão parece começar a embaçar, mas antes que eu desmaie mordo sua mão o mais forte que consigo. Isso faz com que ele me solte. Tento correr, porém há algo errado com meu corpo. Ele está pesado e minha visão está escurecendo. Minha cabeça dói. Cambaleio até a porta e estendo minha mão em direção à maçaneta...


A queda de LíangWhere stories live. Discover now