Capítulo 22

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(Shang Lín)

 Dizem que os sonhos são importantes, que nos lembram de coisas que queremos esconder ou daquilo que não podemos esquecer. Deve ser por isso que não tenho sonhos, não há nada escondido em mim e não tenho ninguém importante para lembrar, eu durmo para esquecer, para encontrar a paz e silenciar os gritos que passo o dia lembrando.

Mas não essa noite, esta noite todos os gritos vieram a tona, o rosto da mulher adormecida os trouxeram de volta a minha mente, uma fogueira arde próxima a nós mas mesmo assim ela treme de frio e febre, não era seguro transportá-la a noite , observo seu peito subir e descer em um ritmo inconstante enquanto ela repete vez após vez o mesmo nome. Interessante como dois reinos se arriscam tanto por uma mulher, sua vida os faz se arriscarem, o que sua morte causaria? Abalaria impérios inteiros e os deixaria cegos.

 Observo as chamas brilhando na escuridão, o pescoço dela está parcialmente descoberto e mesmo distante consigo ver uma veia saltando no ritmo de seu coração, mas outra vez algo me impede de tocá-la, sua inútil resistência aos poucos me interessou e sua futilidade e arrogância se mostraram uma mascara, ela não se importou em ferir seu corpo por uma escrava e arriscou a vida por um filho de plebeus e então por fim salvou o príncipe de Jin. Eu por certo apreciaria tamanha lealdade se fosse minha.

Ela deveria ser a chave não para a vitória em cem batalhas mas para vencermos o inimigo sem precisar combater, uma princesa mimada criada com todos os caprichos e alheia ao mundo, no entanto suas pequenas e poucas ações mostram como ela não é simples e fácil de se ler, seus olhos no começo ingênuos como os de uma lebre se mostraram afiados como os de uma águia, ela havia controlado suas emoções e atuado perfeitamente sabendo exatamente como jogar, logo percebi suas intenções fazendo pequenos aliados entre os escravos, seus olhos decorando cada movimento de meus homens e cada saída possível, vez após vez mudei as posições dos soldados para impedir que encontrasse uma brecha. 

 Mas então ela cegamente saltou para os braços do principe Yáng Shun, sem pensar ou calcular uma estrategia, talvez eu tenha superestimado sua mente e ela seja mesmo apenas como outra princesa qualquer, que passa os dias pintando, escolhendo o vestido mais bonito ou a joia mais cara. 

 Mais uma vez ela chama por ele enquanto dorme, escuto ela tossir e levanto indo até ela e medindo sua temperatura com minha mão, o vento assovia gélidamente e até mesmo as corujas pararam de cantar, o cavalo ergue a cabeça com meu movimento apenas para logo depois a abaixar, a noite ja está mais clara, o fogo se apaga deixando apenas um amontuado de brasas, a lua já não pode ser vista dando lugar aos primeiros raios de sol.

 Fico sentado toda noite ao seu lado e mais uma vez coloco minha mão em sua testa conferindo sua temperatura que surpreendentemente já voltou ao normal, assim que toco sua pele seus olhos se abrem em um susto como se a tivesse puxado de seu sonho, seus olhos se arregalam ao me ver mas ela nada diz, vejo uma pequena lagrima contida no canto de seu olho, seus labios entreabertos estremecem mas não sei se de frio, dor ou tristeza por me ver.

- Consegue levantar?

 Ela continua em silencio mas aos poucos levanta, vejo a dor passar por seu rosto apesar disso ela mantem sua postura e cambaleia em minha direção tentando me acertar com seu punho, desvio facilmente e seguro seu pulso a girando prendo seus dois braços a frente de seu corpo a deixando de costas para mim.

- O que você fez com ele? Que tipo de covarde ataca com um exercito apenas um homem?

 Dou risada antes de a soltar. 

- É assim que agradece?

 Ela me empurra com raiva, deixo que me empurre algumas vezes, ouço em silêncio enquanto ela chora e pergunta por ele, não a respondo mas entendo o porque de sua confiança cega nele, ela parece se recuperar mais rapidamente que uma pessoa qualquer, se tem forças para tentar lutar por certo tem para caminhar, sorrio de leve e assovio para meu cavalo enquanto ela ainda acerta meu peito com as duas mãos.

A queda de LíangUnde poveștirile trăiesc. Descoperă acum