capítulo 1

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Vladimir

Esta manhã está muito fria, apenas oito graus, em Campos do Jordão, um baita frio que estou com preguiça em levantar da minha cama.
Não está muito frio, eu vou ficar aqui, mas um pouco, penso eu.
É meu dia de folga no hospital em que trabalho como pediatra. Desde muito novo, eu sempre quis ajudar as crianças a encontrarem alívio para suas dores, e estudei muito para chegar onde eu estou. Meus pais até tentaram me colocar para jogar futebol, decolei quando estava no sub-20, era considerado o melhor jogador do time, mas percorri o sonho de cursar medicina. No futebol, eu dava alegria para a molecada e lhes dava a esperança de que um dia seriam tão bons jogadores de futebol quanto eu. 
Sai e abandonei o sonho que era dos meus pais e fui atrás do que eu realmente queria, ser pediatra.
Vi muitas crianças nascerem, outras infelizmente não resistiram e faleceram. Como médico, eu sei que é doloroso, não só para mim, mas para os meus colegas de profissão também. 
E hoje estou de folga depois de um duro plantão no hospital em que trabalho na área pediátrica.
Meus dias são puxados, mas eu gosto do que faço. Eu trabalho na Santa Casa de Misericórdia e Maternidade. 
Mesmo estando com três cobertores, eu sinto frio, me espreguiço na cama.
Minha vida é ótima, persegui meu sonho e sou feliz. Claro que eu tenho algumas tristezas, não é possível ser feliz o tempo todo, mas vivo a minha vida com intensidade dentro do possível. 
Sei que tenho que me levantar, não é possível ficar o dia todo deitado, mesmo estando frio, mas mesmo assim enrolo muito na cama, ainda não quero levantar, mas se eu pudesse ficar deitado na minha cama eu ficaria, mas um serzinho acordou e não me deixa quieto na cama, se esfregando em meu rosto e amassando o pãozinho em meu peito.
Alisson é o nome dele, optei quando me mudei a ter um gatinho por meu companheiro, para não me sentir tão-só, eu amo os animais, e estava decidido a adotar um cachorro, mas quando cheguei e o Alisson me viu ele pulou na grade e começou a miar desesperado, escalava até o fim da grade na jaula em que estava e saltava no assoalho da mesma, se aproximava da portinha e miava para mim. Ele fez isso por três vezes até que percebi que fui escolhido por ele para ser o seu "papai".
Dessa forma, eu o adotei e ele faz parte da minha vida há um ano.
— Alisson, vejo que acordou, meu frajolinha querido. — Tenha calma, já vou me levantar, seu sapeca peludo.
Me espreguiço novamente:
— Ah, amiguinho, eu estou com preguiça, jura que vai me fazer levantar nesse frio?
A resposta veio com outra passada de Alisson pela minha cabeça.
— Oh, está bem, está bem, já estou me levantando, Alisson!
Tiro Alisson do meu tórax e o coloco à minha esquerda na cama.
Me sento e levanto os meus braços para cima, me alongando.
Está muito frio, então eu me levanto e visto o meu roupão, chamo Alisson e juntos seguimos para a cozinha.
Preparo o meu café da manhã e sirvo para Alisson um delicioso sachê de cordeiro, seu preferido, e enquanto nos alimentamos, eu decido que, já que é minha folga, não vou sair, ficarei em casa e assistirei a uma boa programação na televisão.
Quando estou cuidando da louça, alguém toca a campainha e eu acredito ser sério, pois a pessoa não dá intevalo para tocar.
Deixo a louça na pia e vou atender a porta.
— Calma, estou indo, não precisa tocar assim com tanta insistência. 
Digo eu em alto, em bom-tom, para a pessoa parar de tocar a campainha.
Ao abrir a porta, me deparo com ele, o homem que um dia eu amei na adolescência estava ali na minha frente. Sem reação, dou um tapa no meu próprio rosto, pode ser que eu esteja sonhando, e acredito que, se me alto bater, vou acordar e ver que continuo na minha cama com o Alisson dormindo ao meu lado.
Não tenho sucesso, eu estou realmente acordado em frente a ele, João Carlos.
— Foi quase impossível te encontrar Vladimir, mas finalmente te encontrei após meses te procurando.
João Carlos sorria, embora eu não conseguia esboçar reação, não tinha força para me mexer, minhas pernas não respondiam e eu me sentia uma estátua viva.
— Não vai me convidar a entrar? Está frio aqui, Vladimir.
Apenas saio da porta e o deixo passar para dentro.
Não conseguia me mexer nem para fechar a porta, quem fechou para mim foi o João Carlos, que me tirou da corrente gelada de vento e fechou a porta.
— Eu não esperava que eu causasse esse impacto em você.
— Afinal, faz muito tempo que não nos vemos.
Sim, faz mesmo, e eu achava que tinha superado o amor que tinha por ele, mas me enganei, eu ainda o amo com a mesma intensidade ou até mais que antes.

Melhor que antes Where stories live. Discover now