#17

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Continuei tomando meu banho, lentamente, devido aos machucados que ainda doíam, e muito. Coloquei aquela roupa me sentando ao chão do banheiro e observando a parede a minha frente.

    — Beatriz? Está tudo bem? – Ouço uma voz feminina e abro a porta.

    — Sim. – Encarei Roberta. Estendeu sua mão para mim.

   — Toma, um remédio para ajudar. – Sorriu, retribui o sorriso. Não demorou muito tempo para minha barriga fazer um som estranho, fome, é verdade, eu ainda não havia comido.

    — Não esquenta, Beatriz. Grenw foi buscar comida. – Apenas assenti, a mesma saiu do quarto me deixando sozinha. Andei até minha mochila pegando meu celular que já não estava mais ligado, porcaria, esqueci de carregar. Me deitei ao colchão observando o teto. Oque eu fiz para merecer isso? Uma das pessoas que eu mais “odeio”, estava me ajudando, confesso que isso era surpreendente, mas era de certo modo, estranho. Escutei um barulho que parecia vir da porta e olhei de canto de olho naquela direção, observei Grenw entrar pela porta com uma sacola de supermercado.

       — Voltei. E trouxe comida. – Apenas assenti e continuei no colchão. — Toma. – me jogou um pacote vermelho junto a uma latinha. — Acredito que você goste.

     — Obrigada.- Abri lentamente a pequena lata tomando um gole. Um silêncio constrangedor pairou sobre nós, Suspirei começando a comer. — Preciso perguntar, por que está sendo tão legal comigo?

    — Hum? – Me encarou comendo. – Ah. – Deu de ombros. — Não tenho um motivo específico, é só que, não sou tão babaca quanto pareço ser. – Apenas assenti.

    — Bom, obrigada. – Sorri fraco e terminei de comer. Escovei meus dentes e deitei ao colchão puxando a coberta sobre mim e virando de costas para a cama do garoto. Não tenho certeza de quanto tempo se passou, mas era praticamente impossível dormir. Virei de barriga para cima fitando o teto e escuto um resmungo vir de alguns metros de mim. — A última vez que estive aqui, uma porta foi arrancada.

    — Então, e custou muito caro, viu senhorita.

    — Há, a culpa foi sua mesmo. Duvidou de mim, e aconteceu aquilo.

   — Mas, eu estava blefando! – Dei  de ombros.

   — E eu ia saber?

   — O mais engraçado, foi você querer bater naquele cara. Já observou seu tamanho?

  — Ei, me respeita. Devia ter me deixado machucar aquele cara.

   — Mais? Não! Sério, quando você mexe com gente ignorante, você acaba se ferrando, experiência própria.

   — Ora ora, olha só quem está dizendo. – O encarei sarcasticamente.

   — Não me olha assim, sei que sou idiota, mas as pessoas podem mudar, Okay? – Soltei uma risada.

  — Okay, se você diz. – Me sentei a cama cruzando as pernas.

   — Mas, me diga, por que agrediu o Loan?

   — É, o dia que todos ficaram contra mim? – Ele apenas Assentiu. — Basicamente, ele foi um machista escroto, e aquilo me irritou. Na realidade, eu já estava farta daquele garoto, e aquilo foi a gota d'água.

   — Entendo. Lhe julgaram mal, então. Disseram que você o atacou, sem mais nem menos.

  — Há , as pessoas sempre pensam isso, já estou acostumada. Só acho incrível a capacidade de não percepção.

   — Oque?

  — As pessoas, elas não percebem o quanto uma pessoa é ruim, parece que só ligam para o status social, ou algo parecido. – Percebi um silêncio, sim, sabia exatamente, que ele se identificou com aquilo. – E começam a seguir essa pessoa, como se ele fosse um rei, sabe? Isso é irritante. – Soltei um suspiro e me deitei novamente. Um silêncio voltou a pairar sobre nós, até o toque do celular soar pelo quarto, uma mensagem? Um telefonema? Não sei, e não me importava. Virei de costas para a cama novamente e fechei os olhos. Não sabia exatamente se havia se passado alguns segundos, alguns minutos, ou até algumas horas, para mim, é como se não tivesse dormido. Não é de se estranhar, maldita insônia. Permaneci deitada, enquanto pensava em muitas coisas, mas, meus pensamentos começaram a desaparecer quando escutei uma fungada vindo ali de perto, virei minha cabeça lentamente na direção da cama. Será que esse garoto está.... Chorando?  — Grenw? Está tudo bem?

    — Uhum. Você ainda não dormiu?

    — Não. Está tudo bem ,mesmo? Você parece estar chorando.

   — É só a sua imaginação. – Me levantei me sentando a cama, perto de seus pés.

   — Tem certeza?

   — Sim, pode voltar para o colchão.  – Suspirei irritada.

   —  A mensagem que você recebeu, ou o telefonema, foi ruim? – Tentava ver seu rosto, mas estava virado para o lado oposto.

   — Não!

   — Seu pai te disse algo? – Houve um silêncio, e nenhuma resposta. — Entendo, é sobre ele, então. Quer me contar?

   — Por que eu deveria? – Se sentou a cama de pernas cruzadas enquanto passava a mão esquerda pelo olho esquerdo. Provavelmente para secar as lágrimas. Enquanto o olho direto estava ofuscado pelas mechas de seu cabelo que caíam sobre o mesmo.

   — Não sei, só estou querendo te ajudar.

   — Não precisa, obrigado. – O encarei.- Deve ser frustrante, não é? Ver um homem chorando.

   — Não. Oque que tem a ver homem chorando com frustração?

    — Bom, sabe aquele ditado “Homem não chora.”.

    — Não, isso não é um ditado. É só uma sobreposição feita por homens provavelmente machista que não entendem, que todos tem sentimentos, que sentem dor, e precisam chorar para aliviar um pouco. – Meu olhar continuou sobre o mesmo, segurei seu ombro deitando a cabeça do mesmo sobre minhas pernas. Seus olhos estavam estalados. Tentou se levantar mas o impedi. — Vamos, me diga, oque houve?

    — N-Não vou dizer.

    — Caso não diga, vou te manter nessa posição. – Estalou os olhos novamente suspirando e desviou o olhar.

     — Eu só, estava lembrando do passado. Lembranças, alguma te dão nostalgias e outras te atormentam para o resto da vida. – Suspirei abaixando o olhar, sim, eu me identifiquei bastante com isso. — Eu, já fiz tantas coisas ruins nesses anos. Magoei pessoas que realmente se importavam comigo. Me envolvi com pessoas ruins e superficiais. Resumindo basicamente, eu já fiz tanta merda, que me arrependo todo santo dia. E como se não bastasse, sou forçado a ser esse babaca, não exatamente, mas, desde que meu pai se casou novamente, as coisas não são fáceis. Minha madrasta pega no meu pé, todo santo dia. “Você tem que ser assim, tem quer ser de tal jeito.”. “ Não pode ir para a praia se divertir por que é coisa de pessoas de classe baixa, não pode caminhar no parque por que não é coisa de gente rica.” Pelo amor, as coisas que eles fazem não são divertidas! Tipo, as festas são entediantes, tem mulheres gatas, sim, mas, sabe quando não adianta? Não posso fazer nada. Por que acha que saio para encher a cara? Preciso de uma folga, algo que me distrai dessa vida. – Parou alguns segundos. — É irritante! Mas, vai falar alguma coisa para você ver, nossa, parece que eu mandei matar alguém. No dia que fomos no parque, sendo sincero, no começo fiquei com receio, mas eu avistei cachorro, e desde criança eu sempre amei cachorros, mesmo tendo apenas um nesses 17 anos de vida. Foi legal, sabe, eu me diverti aquele dia. Mas.... – Se calou apenas suspirando

    — Não posso dizer que lhe entendo, não sei exatamente oque você está sentindo, mas, posso te dizer. Ter muitas coisas não é sinal de felicidade, e nunca será. Você pode ter poucas coisas, mas ser uma pessoa feliz. Não se deixe levar pelo pensamento de ter tudo. – Sem perceber comecei a movimentar meus dedos que estavam sob seu cabelo. Senti o mesmo me observar, e logo desviar o olhar. — Você pode mudar, se quiser.

    — Como? Me forçam a fazer determinadas coisas, não é como se eu pudesse mudar assim do nada. E... – Suspirou.— Tem a minha mãe, eu sinto tanta falta dela. Precisava de um ombro amigo, mas, onde está ela? Parece até que nunca teve um filho. Sei que sou um inútil, mas se todo mundo tem uma segunda chance, por que não mereço também? – Colocou aos mãos sobre os olhos e lágrimas começaram a deslizar pela sua bochecha e caiam em direção a minha calça onde formavam pequenos círculos. Tirei suas mãos do rosto e observei seus olhos.

   — Não diga isso. Sua mãe com certeza lembra de você e se importa com você, ela provavelmente ainda não encontrou a maneira certa de demonstrar isso, mas deve estar a procura. E Grenw, você não é inútil. E assim como os outros, você merece uma segunda chance. É só ir atrás dessa chance. Para conquistar ela, você tem que correr atrás.

   — É difícil... – Continuou retribuindo meu olhar.

   — Sim, mas vale a pena. – O mesmo assentiu. — Você já tentou, amadurecer longe de seus pais?

    — Não quero. Não quero voltar a ser o garoto solitário, aquilo machuca, sabe? – soltei um Suspiro.

   — Eu sei, mas, você não vai voltar a ser um garoto solitário. Tem gente que vai estar do seu lado. Roberta é uma delas, acredite se quiser, ela realmente te considera um irmão.

    — Não sei... Mas, provavelmente, você tem razão. – Assenti e continuei o cafuné. Alguns minutos depois senti sua respiração ficar cada vez mais lenta e voltei a observar seus olhos, ele havia dormido. Soltei um sorriso e continuei ali.

   — Você é apenas uma criança que precisa de cuidados.


   GRENW.

     Me mexi lentamente contra o travesseiro, mas algo estava errado, meu travesseiro que geralmente era fofinho, agora estava duro. Abri os olhos lentamente olhando para o lado e vendo algo que parecia uma perna ao meu lado esquerdo, virei o olhar na outra direção e também havia um perna, oque que está acontecendo?! Me levantei lentamente e observei Beatriz meio deitada. Suas pernas continuavam cruzadas mas seu corpo estava deitado sobre a cama. Continuei observando a mesma e meus olhos de focaram em seu rosto, tão fofa. Me trazia uma serenidade, uma calmaria. Ouvia sua respiração profunda e senti seu cheiro, o mesmo cheiro da noite passada. Provavelmente, estava em seu décimo sono, seu cabelo estava todo bagunçado no rosto e espalhado na cama. Algo nela, me atraia ao mesmo tempo que me repulsava. A curva sinuosa que seu corpo fazia até a cintura, descendo do tronco e subindo ao quadril. Por um instante, desejei toca-la, mas, não iria atrapalha tamanha serenidade.

   Senti uma sensação estranha que me causava medo, mas inevitavelmente percebi estar atraído por ela. E nem a baba dela no meu lençol poderia evitar isso. Balancei a cabeça negativamente para tentar esquecer tal pensamento, e arrumei com cuidado a mesma no travesseiro. Coitado do meu travesseiro, iria estar coberto de baba mais tarde.

     Enquanto escovava os dentes, não pude deixar de observar a mim mesmo no espelho e soltar um leve sorriso de canto de boca, sentindo uma mistura de excitação, vergonha e um pouco idiota. Desci para a cozinha pegando uma xícara de café e enquanto observava a fumaça sair da xícara, meus pensamentos não paravam de debater. Oque exatamente foi aquilo. Não, não pode ser.

    Voltei para o quarto com uma xícara de café. Abri a porta e logo a fechei, observei a garota de antes sentada a cama se espreguiçando, oque fez sua camiseta, que não caso é minha, subir, mostrando sua barriga.

    — Bom dia! – Disse secamente enquanto pegava a xícara de café das minhas mãos.

    — Bom dia.  Seca logo de manhã? – Sorri sarcasticamente, recebendo apenas um movimento de cabeça. — Fico feliz que seus machucados tenham melhorado, inclusive seu olho.

   — Oque, como assim “seus machucados”?

   — É que, sua camisa está um pouco levantada, então basicamente, consigo ver um pouco dos hematomas. – Aponto os olhos propositalmente em direção a sua barriga e um sorriso malicioso de admiração. A garota estala os olhos segurando a base da sua camiseta e a puxa em um movimento único e firme. Me encara com um olhar mortal.

   — Seu pervetido, pode tirar esse sorrisinho dos lábios. Não sou as meninas que você pega, não. -  Mal sabe ela, que agradeço por não ser igual a elas. Mas, que ela é marrenta, chata e gostosinha, além de mal educada, ela é.
  
  Roberta entrou ao quarto e começou a falar com a garota freneticamente, percebia de longe que Beatriz estranhava comportamentos muito animados logo cedo, soltei um sorriso enquanto minha suposta irmã convencia de qualquer maneira a garota a ir em uma cafeteria. E ela conseguiu, depois de tanto insistir, Beatriz cedeu.

    — Tchau, garoto. E obrigada. – Me mandou um aceno de longe e se dirigiu a porta.

    — Tchauzinho, porquinha.

    — Oque, porquinha? Por que? – Sorri.

  — Não esquece de lavar o rosto inchado e pentear os cabelos, ein. – A garota bufou e saiu pela porta. Comecei a rir. Roberta parou a porta encarando a mim e logo a porta.

   — Eu perdi alguma coisa ? Rolou algo aqui ontem? – Dei de ombros andando em direção a porta e a fechando lentamente.

   — Bom dia, Roberta, e Tchau. – Fechei a porta e me joguei a cama.



   

 

 

     
    
   
    
   
   

Diferente do meu Passado? ( A Rockeira e o Playboy).Where stories live. Discover now