22.

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- Haverá uma reunião com a cúpula da Ponte amanhã, senhor Sacerdote. Eu prefiro ir sozinho, se não se importar. Será mais fácil não levantar suspeitas se apenas um de nós se ausentar.

Ele me levou por um caminho diferente naquele dia.

A quantidade de caminhos secretos no subsolo do Palácio é impressionante. Eu podia andar nele por semanas, e ainda assim tenho certeza de que existiriam passagens e corredores para descobrir.

Camilo insistia que eu chamasse aquele lugar de casa. Eu nunca conseguiria. Um labirinto jamais seria minha casa.

Minha casa de verdade era pequena, só tinha três cômodos, que mal eram divididos por tapumes improvisados que meu pai havia achado flutuando na praia, provavelmente restos de embarcações ou mesmo de casas que podem ter sido engolidas pelas marés descontroladas das últimas décadas.

Quando tínhamos sorte, um ou outro pallet aparecia na areia. Eles eram úteis, principalmente para fazer móveis encaixados, já que, por alguma razão, meu pai se recusava a manipular madeira.

Eu costumava pensar que minha casa tinha pouca privacidade, com meus pais dormindo na mesma esteira que eu, o banheiro mal isolado que deixava raios de luz passarem entre os juncos da porta, o espaço minúsculo e cheio de areia que dividíamos como cozinha... E além daquilo, o mar. O mar que sempre me causou a impressão de ter um milhão de olhos nos espreitando ao longe.

Eu costumava pensar que minha casa tinha pouca privacidade, mas ela era um cofre seguro perto do Palácio.

O Palácio tinha dezenas de quartos, salas e corredores. Tinha banheiros gigantescos em cada ala. E, com o número de Auxiliadores beirando o limite mínimo, o Palácio também tinha muito silêncio, e muita solidão.

Mas aquele vazio não era nem um pouco privado. As paredes frias e cinzentas jamais seriam uma casa. Eram um corpo nu. O corpo nu de um estranho que eu evitava tocar a todo custo. Estar no Palácio era como estar no lugar errado. As paredes me odiavam, eu podia sentir. As paredes estavam loucas para me expelirem de lá.

E quando Camilo caminhava comigo pelos corredores, eu sentia que as paredes saltariam sobre mim e me esmagariam a qualquer momento.

- Quando minha mãe vai chegar? – perguntei, atenta aos ecos que percorriam aqueles muros intermináveis.

Ele retorceu os lábios.

- Tivemos um pequeno contratempo, e não pudemos enviar nosso transporte ainda. Mas amanhã estará tudo resolvido. Até o fim da semana ela estará aqui, certamente.

- Você disse que ela estaria aqui na semana passada, e depois disse que ela estaria aqui ontem, e agora só no fim da semana! Quando ela vai chegar?!

- Ela vai chegar quando puder chegar, senhor.

- E quando vai ser?!

- O mais rápido possível. Estamos com problemas de orçamento, além da segurança na fronteira. Os Surdos estão nos atrasando.

- É mentira! Eu vi um carregamento de tabaco chegar ontem! Não tem nenhum problema com orçamento ou com a fronteira!

Eu não esperava pelo que ele fez.

Ele se virou para mim e acertou a palma da mão em meu rosto com força, quase me derrubando. Apertei as mãos contra as bochechas que ardiam incontrolavelmente. Meus olhos já estavam pingando lágrimas antes que eu pudesse freá-los.

- Nunca ouse dizer que estou mentindo, está entendendo?! Eu estou te protegendo! Eu estou garantindo sua segurança! Se não fosse por mim, você estaria morta agora!

Ele se recompôs, sorrindo com amabilidade e secando minhas lágrimas.

- Você já está grande o bastante para não chorar, e já está grande o bastante para não depender de sua mãe. Não há necessidade de agir assim.

 Não há necessidade de agir assim

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Pandora (COMPLETO) - Livro III - Trilogia DantálionOnde histórias criam vida. Descubra agora