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- Você está bem?

Pandora estende a mão para se apoiar no braço que o estranho lhe oferece. Suas pernas dobram de início, mas logo suportam seu peso com firmeza. Ainda com lágrimas escorrendo dos olhos, ela passa as mãos pelo corpo, a respiração se estabilizando conforme se certifica de sua integridade física.

- Estou bem.

- Você não parece bem. O que aconteceu?

- Ele ia atirar em mim. Foi isso que aconteceu.

- Só isso? – o sujeito arqueia as sobrancelhas, a esquerda cortada por uma falha que atravessa de sua testa até tocar as bordas dos lábios, uma cicatriz que deve quase ter custado seu olho – Eu passo por isso todos os dias e não me molho de medo como você.

Ela baixa os olhos instintivamente para as calças.

- Eu estou falando do seu rosto. Nunca vi um garoto chorar tanto. Você nem levou um soco, por que está desse jeito? Devia estar pulando de alegria por aquele covarde ter uma mira péssima. Se fosse eu com uma daquelas, teria atravessado todos os seus órgãos de olhos vendados.

- Eu não sou um garoto. – ela cospe com rispidez – E você não está me tranquilizando.

- Desculpe. – o Surdo ri com certo embaraço, passando a mão pela nuca – Aquele cretino não me contou que você era uma... – seus lábios apertam em desconforto – Garota. Isso explica o choro.

- Se não calar a boca agora, quem vai te fazer chorar sou eu. – a voz de Helena surge, seu corpo ainda escondido atrás do tronco desfigurado pelos tiros – Não tem uma guerra para você lutar não, seu merdinha? Prefere perder seu tempo tirando sarro de uma menina visivelmente em pânico?

- Olhe só, a esposa ainda vai te defender...

- Pandora, faça-me um favor e enfie essa adaga no olho dele?

- E ainda te dá ordens. – debocha, voltando a cobrir a cabeça com o capuz.

- Ela não é de falar muito. – Helena retruca – Mas se quiser conversar no seu nível, chegue aqui que eu te mostro uma coisa bacana. Não pense que eu não sei quem você é, nem o que fez, Alastor. Boa parte disso é culpa sua, rato delator. Nenhum Surdo esqueceu o que você fez.

- E você por acaso esqueceu que eu acabei de salvar sua vida? Você fala com muita coragem pra quem ainda nem conseguiu sair do chão sozinha.

Ele caminha para a árvore perfurada. Pandora o segue após recolher cuidadosamente a adaga perdida entre a grama, mantendo-a firme em sua mão.

Helena está sentada com as costas apoiadas sobre o tronco, seu peito subindo e descendo em respirações curtas, os dentes trincados em dor.

- Você consegue mexer os pés? – Bruno abaixa ao seu lado, seu tom provocativo tornando-se bastante sério. Ele toma sua mão, sentindo o pulso. Os dedos de Helena estão manchados com sangue.

Respirando em lufadas inconstantes, ela flexiona e estende os pés, um gemido de dor escapando.

- Não pegou a coluna. – ele continua, puxando as roupas de Helena para analisar a ferida – Mas está alojada no quadril. Você sabe o que significa, não sabe?

Pandora se inclina para o lado, enxergando com dificuldade o rombo que penetra a lateral direita do quadril de Helena, deixando a carne exposta. Uma onda de náusea contorce seu estômago.

Helena fixa os olhos destoantes no rosto do Surdo.

- Significa que você vai me deixar pra trás, eu sei.

Pandora (COMPLETO) - Livro III - Trilogia DantálionWhere stories live. Discover now