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- É aqui?

Helena pisa sobre a madeira podre caída, escutando pelos ecos subterrâneos.

- Por tudo que é sagrado, pare de pular desse jeito! Eu não devia ter trazido nenhum de vocês aqui!

- Não existe nada sagrado. – ela agarra Lúcio pelo colarinho, aproximando seus rostos. Curiosamente, Helena é mais alta que ele, e o disparate da altura dos dois faz Pandora rir por dentro – Você entra primeiro, antigo Sacerdote. Mostre o caminho.

- Eu não vou entrar aí.

- Ah, você vai! - Helena saca a pistola, pressionando-a contra a têmpora de Lúcio - Nessa altura da história, você sabe que já se tornou inútil. Eu posso muito bem continuar sem você. Se não vai nos ajudar, é melhor não termos um parasita para comer nossa comida. Me avise se quiser desistir agora. Uma bala custa menos que um prato de arroz.

- Por favor... Você não faz ideia de como isso dói.

- O que dói? O tiro na sua cabeça ou relembrar seu namoradinho morto?

- Eu sinceramente apreciaria mais o tiro.

- Não seja por isso...

- Parem, vocês dois! - Pandora segura a mão de Helena antes que destrave a arma – Qual o seu problema? Não pode atirar em todo mundo que te contraria!

- Eu tenho uma arma. Eu posso.

- E também pode dar um tiro no próprio pé! Saia de perto dele! Você vai acabar matando meio mundo assim.

- Como quiser, meu Sacerdote. – a ruiva se curva numa reverência irônica, rindo.

Quando se afasta, Pandora puxa Lúcio para o canto, sussurrando perto de seu rosto:

- Escute... – seus dentes emperram, incapazes de chamá-lo de pai – Você é um homem agora. Por que tem tanto medo de voltar lá? É só uma casa.

- Não é só uma casa! – suas mãos apertam as laterais da cabeça – Você não entenderia! Nenhum de vocês entende! Eu passei a vida toda tentando esquecer o que aconteceu aqui! Eu passei minha vida...

- E não conseguiu.

Ele para de falar, fechando as mãos em punho. Pandora desvia os olhos para a copa das árvores enquanto tenta se recompor. Poucas frustrações em sua vida haviam sido tão grandes quanto ter de lidar com a infantilidade do próprio pai. Ele deveria ser quem a protegeria, quem a guiaria através dos problemas, mas, aparentemente, ela estava obrigada a assumir esse papel também. O peso em seus ombros já a estava esmagando. Assumir a liderança do grupo, apesar de ser a estratégia mais inteligente, já estava começando a sugar sua energia.

- Você não conseguiu enterrar o passado aqui, não foi? É por isso que está com medo? O que você tem medo de encontrar lá embaixo?

- Não é exatamente medo, é... – ele esconde o rosto sob as mãos, tremores percorrendo sua pele – Eu não sei como explicar isso... Quando se trata de algo que aconteceu com você, você pode ter pena de si mesmo, e pode se odiar, e pode lidar com isso, sabendo que a culpa não foi sua, mesmo que tenha cometido um erro. Mas quando se trata de algo que você fez, Pandora, o que você faz? Como você escapa disso? Como você se perdoa, se não há ninguém para pedir perdão? Como você lida com o fato de ter de se encarar no espelho e ver tudo que você fez diante de você, e estar completamente sozinho? Se ele tivesse simplesmente morrido, eu teria sentido dor, e ódio, e desespero, e teria canalizado isso para a vingança. Mas ele não morreu, simplesmente. Eu... Eu o matei, Pandora. De quem eu devo me vingar?!

Ele chora descontroladamente, prostrando-se sobre a grama, apertando raízes e folhas úmidas entre os dedos, desistindo de esconder o real estado de seu espírito.

Pandora (COMPLETO) - Livro III - Trilogia DantálionWhere stories live. Discover now