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Utilizando os tubos de álcool que tinham nas mochilas, ela ateia fogo em pontos estratégicos da mata, o vento seco da manhã espalhando os focos rapidamente. Em cerca de uma hora e meia, mais de um terço da floresta arde com labaredas incontroláveis.

Caminhando sem pressa, com um pedaço cortado da túnica negra cobrindo sua boca e nariz, Pandora segue para a cidade, fumaça e cinzas estendendo um véu majestoso por onde passa.

Era a única glória que teria: a glória da destruição.

Arrastando o fim do mundo atrás de si, ela cruza a praça principal.

Centenas de rostos curiosos e espantados a acompanham, parando suas ocupações para admirarem a entidade medonha envolta em sangue, terra e fuligem que desfila audaciosamente no meio deles, como uma criatura mitológica nascida da floresta. Outros, recém-chegados, ainda encaram com horror os escombros esfumaçados do Palácio.

- Eu quero Helena. – ela diz, sendo ouvida por todos – Onde ela está?

Despertados pelo tumulto, alguns soldados da guarda chegam, cercando-a com incerteza a respeito do que fazer.

- Eu quero Helena. – repete, sacando a adaga – Vou me entregar depois de falar com ela.

- Ela está com o Sacerdote. – responde timidamente um dos homens encouraçados, buscando sinais de aprovação dos outros, que se tornam ridiculamente frágeis diante da mulher demoníaca que lhes ordena.

- Mandem chamá-la. E se quiserem tragam o cretino também.

Obedecendo a um sinal, um soldado abaixa a arma e segue para as ruas estreitas. Obviamente, eles não estavam no Palácio. Deviam ter elegido um novo edifício para o governo.

A multidão se reúne ao redor do palanque, como sempre costumavam fazer durante as Audições, esperando pelo espetáculo curioso que se seguiria. Sem se importar com sua identidade, Pandora sobe ao Púlpito diante do Templo, a adaga à mostra, desafiando os olhares da massa.

Depois de as sombras terem se alongado sutilmente, um corredor de corpos é formado, a população de trabalhadores e os soldados abrindo caminho para a figura solitária que chega, um objeto escuro dependurado em sua mão esquerda.

Helena sobe com dificuldade as escadas laterais do palanque, encarando Pandora nos olhos, o embrulho em sua mão chamando a atenção dos curiosos.

- Você veio aqui para me matar, impostora?

- Me dê um bom motivo para não fazer.

- O primeiro – Helena sorri – é que você não conseguiria, nem que eu deixasse. O segundo... Bom, acho melhor você mesma dar uma olhada.

Ela lança o embrulho em suas mãos.

Apoiando o embrulho sobre o Púlpito, Pandora o abre.

Gritos de horror explodem na multidão enquanto observam, estarrecidos, o objeto familiar e destroçado que lhes é apresentado.

Nas mãos de Pandora está a cabeça sem corpo de Camilo. Sua barba grisalha enlameada com sangue. As fibras de seu pescoço pendendo sob ela.

- Eis o seu Sacerdote! – Helena grita, batendo palmas e levantando os punhos – Acho que o poder o fez perder a cabeça!

- Você... – Pandora larga o cadáver, virando-se para Helena, incapaz de terminar a frase.

Em resposta, a garota ruiva sacode a adaga que havia recebido de Lúcio. A Destruidora da Voz.

- Você já devia ter aprendido a nunca acreditar em mim, impostora. Já devia saber que a cama é o melhor lugar para matar um homem.

Os soldados avançam, tomando posição para atirar nas duas.

Antes que possam agir, porém, um rugido grave se ergue da floresta, lançando uma onda de calor sobre a cidade.

As labaredas logo aparecem, devorando tudo em seu caminho.

Em pânico, as pessoas correm, disparando em todas as direções e esbarrando nos soldados que, desistindo da luta inútil sem um comando para seguir, largam as armas e correm também.

Pandora e Helena permanecem de pé sobre o palanque, assistindo à debandada violenta enquanto o fogo inunda as casas de madeira, uma a uma, espalhando-se como o oceano até o centro da cidade.

- Você sabe o que não pega fogo? – Helena comenta casualmente, como se a calamidade diante de seus olhos não passasse de mera apresentação teatral – Mármore. Mármore não pega fogo. Principalmente quando tem portas grossas de pedra.

Compreendendo a ideia, Pandora caminha até o Templo. Elas entram, fechando os grandes portais a tempo de conter o fogo que já havia se alastrado pelas vigas de madeira do palanque.

- É irônico, não é? – Helena recosta numa das paredes, aproveitando o frescor do ar parado – Entrar num templo para nos salvar do inferno lá fora. Seria quase como uma dessas histórias de fim do mundo, quando Deus salva um punhado de gente boa enquanto tortura todo o resto até a morte.

- A diferença, - Pandora recosta ao seu lado – é que nós não somos a gente boa.

Helena ri sonoramente, fechando os olhos ímpares com satisfação.

- Cordeirinho, cordeirinho...

- Cordeirinho, cordeirinho

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Pandora (COMPLETO) - Livro III - Trilogia DantálionOnde histórias criam vida. Descubra agora