27.

45 15 5
                                    

Seus olhos se abrem subitamente, percorrendo o quarto inteiro com as pupilas enormes, todas as cores idênticas no escuro.

O lado de Helena está vazio. O lençol ainda emana o calor absurdo de seu corpo. Ela devia ter saído a pouco tempo.

Pandora vira o corpo, sentindo na lateral do rosto a brisa gelada que entra pela janela entreaberta. As cortinas brancas lambem a escuridão, deixando no ar o gosto de chuva que se aproxima.

Com parte do corpo ainda adormecido, ela se arrasta com dificuldade, atravessa o quarto e encosta um dos olhos à janela, tomando o cuidado de não mostrar mais que alguns centímetros de pele.

Helena está lá fora, de pé sobre o jardim. Três figuras vestidas com mantos negros a cercam. Suas vozes chegam distorcidas, baixas demais para que as palavras se desprendam do fluxo contínuo de rumores sem sentido.

Escondidos sob máscaras, é impossível decifrar as intenções dos Surdos. Helena parece calma, porém.

Sua cabeça está mais baixa que de costume, como uma criança diante de adultos. Excluindo-se isso, ela aparenta estar relaxada. Seja lá o que estiverem discutindo, é provável que ela não seja punida por desobedecê-los.

Mas ainda há uma pequena chance de tudo não passar de encenação.

Num movimento rápido, seus olhos faíscam em direção à janela. Pandora se lança de joelhos ao chão, desaparecendo do campo de visão. Por um breve instante, os olhos das duas deram a impressão de terem se chocado.

Pandora esfrega as mãos sobre os joelhos doloridos, desejando que não tivesse passado de impressão.

Quando ergue os olhos novamente acima da moldura da janela, as três figuras escuras estão se afastando, nenhum sinal de Helena.

Num único impulso, ela se lança sobre a cama, fechando os olhos e mantendo-se o mais imóvel possível enquanto o vulto de Helena cobre a luminosidade que entra pela janela.

Como alguém tão pesada podia subir aquela altura com tanta velocidade?

A cama estremece conforme Helena retoma seu lugar habitual, de costas para Pandora. Alguns minutos se passam até que sua voz rompe o silêncio:

- Eu sei que você está acordada, impostora, e sei que você me viu. Ninguém dorme dura desse jeito. Você finge muito mal.

Pandora mantém seu silêncio. Talvez ainda tenha alguma chance de convencê-la.

- Não se preocupe por ter visto meus amigos também. De hoje em diante o que você vê e o que não vê não fará diferença alguma. Seu destino já está definido, Sacerdote. Apenas relaxe e aproveite a paisagem enquanto pode.

 

Oops! This image does not follow our content guidelines. To continue publishing, please remove it or upload a different image.


Pandora (COMPLETO) - Livro III - Trilogia DantálionWhere stories live. Discover now