Bônus - Scarlett

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Scarlett:

— Olha o fim que eu tomei. — Sussurro, analisando a cela que será minha casa pelos próximos  longos anos.

Aqui dentro não se tem ideia do dia da semana e do mês que estamos. Nunca sei de nada, mas já ouvi por aí que o natal está se aproximando.

Parece que estou aqui há anos mas uma das carcereira me disse que já faz um ano. Minha sensação é que faz muito mais de um ano.

Eu olho pra trás, e não consigo achar aonde exatamente foi que eu me tornei tão fria e desumana a ponto de matar meu próprio pai. Eu sinto nojo de tudo que eu fiz, sinto um arrependimento que não cabe dentro de mim. Mas já aconteceu, e eu viverei pra sempre com esse tormento.

Ficar aqui todo esse tempo me fez analisar toda minha trajetória. E eu não poderia ter tido um outro final sem ser esse. Aqui se faz, aqui se paga. Sempre escutei uma tia minha dizendo isso, e embora não concordasse, aprendi da maneira mais dura que sim... Aqui se faz, e aqui se paga.

Eu estraguei minha vida por obsessão a um garoto...

Fiz tantas coisas ruins, sequestrei, matei e tudo na minha cabeça era amor. E não era. Nunca foi. Talvez eu tenha me acostumado a ter tudo na mão e nunca soube verdadeiramente o que era amar e ser amada...

Meu pai passou a vida dele inteira no Japão, vinha duas vezes ao mês e voltava. Minha mãe, uma mulher muito vaidosa, cheia do dinheiro. Esquecia que tinha duas filhas que precisavam de amor e de atenção. Coisas que o dinheiro jamais comprou.

Cresci rodeada de dinheiro. Rodeada de empregados. Mas sabe o que me faltou? O colo da minha mãe pra quando eu quisesse contar sobre meu dia, sobre minha primeira desilusão amorosa. Faltou eu escutar da boca dela ou da boca do meu pai um “Eu te amo” ou “Você é importante pra mim.”. Quando na verdade eu escutava: “Você é fracassada” e “Você é perdedora”.

Eu estou longe de ser vítima nisso tudo, e longe de querer achar uma justificativa para tudo o que eu fiz mas... É doloroso ver que eu joguei toda minha vida no lixo por conta do meu ego e que eu tinha tanto pra viver ainda pela frente...

Não tenho esperanças como será daqui a vinte e seis anos. Não sei se irei aguentar chegar viva até lá mas eu fiz por merecer, não é?

Eu não recebo visitas de Chloe há muito tempo. Ela vinha mas eu percebia no olhar dela medo, angústia. Eu sei que não era fácil olha pra mim e saber que fui causadora da morte do nosso pai e de mais duas pessoas.

Minha mãe me largou aqui. Nunca veio me visitar. Não pagou advogados. Nem mesmo uma ligação.

E no fim, eu realmente acabei sozinha aqui...

Jade e Nicholas, eu espero que eles estejam bem e que estejam juntos. Eles merecem depois de tanta maldade que fiz pra eles. E também espero que eles possam me perdoar quando eu sair daqui, se eu sair...

Me deito no colchão duro jogado no chão, e respiro fundo analisando o teto.

— Eu sinto falta da minha vida...

Aos meus onze anos eu fui abusada por um tio meu. Ele tentou me estuprar mas felizmente minha tia chegou na mesma hora e o botou pra fora de casa. Mas isso não o impediu de passar a mão pelo meu corpo, falar coisas nojentas... Foi muito difícil lidar com isso.

Pouquíssimas pessoas sabem disso. Minha família, no máximo. Fui há diversos psicólogos por anos pra lidar com esse trauma, e não digo que superei porque é algo que fica marcado pra sempre. Mas, eu fui ensinada a lidar e fingir que isso nunca aconteceu.

Eu tive muitos problemas, problemas que ninguém nunca jamais imaginou que Scarlett Mateo passou.
Mas eu seria hipócrita em dizer que esses problemas foram o que me tornou assim. Não foram.

Eu não sei exatamente o que eu me tornei, e quando me tornei esse monstro. Mas eu me arrependo de tudo a cada manhã que eu acordo. Mesmo que seja tarde...

— Scarlett Mateo, tem visita pra você. — Levo minha atenção até uma das polícias que abre a cela e caminha até minha direção.

— Pra mim?

Ela só pode ter me confundido. A possibilidade de qualquer pessoa ter vindo me visitar é quase zero.  A única pessoa que vinha aqui era Chloe, e faz tempo que ela não vem mais.

A policial algema meus braços enquanto me leva até a sala de visita. Será que Chloe sentiu minha falta e resolveu vim me ver?

Assim que a porta é aberta, me deparo com um homem alto, de cabelos loiros e todo vestido de preto de costas para a porta.

Me sento na cadeira, com as minha mãos em cima da mesa em silêncio. Analisando a silhueta do homem há alguns metros de distância de mim.

— Quem é você? — Pergunto, fazendo ele soltar uma risada alta e macabra ainda de costas pra mim. E eu conheço essa risada muito bem...

O homem passa a mão pelos seus cabelos loiros, e se vira lentamente pra mim. Sinto todo o meu corpo arrepiar e recuo pra trás assim que vejo quem é.

Pai?

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É isso, um enorme beijo!
Vejo vocês na segunda temporada!

P.S: Agora a briga é outra!

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