2. Parte 3

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Khlaos observa a mão coberta e a essência de flor e mel que havia acabado de oferecer à lavradora. Ele precisava ficar. Era de seus planos deixar o filhote da égua para Ama, mas sabendo que ela iria embora para a realização do Equinócio, não seria mais possível, além de já ser ruim separar a cria da mãe tão cedo. Haveria de deixa-los ali, apenas precisava da autorização.

O diálogo anterior o havia deixado tenso. Nikholaos era seu nome e havia sido um bom conselho usar apenas Laos, ao invés de Khlaos, mas já se fora. Ama havia mudado dentre os anos, havia finalmente atingido a maturidade física, diferente dos anos passados em que Khlaos a vira, ainda com os ossos crescendo e derrotada por sua lavoura. Tratava-se da primeira vez em que ela direcionava tantas palavras a ele, não sabia em exato como reagir ou responder quando seu instinto básico era de usar ou a formalidade ou a brutalidade. A Ama madura falava de magia e a importância das ideias, ele, com o passar do tempo, havia deixado de importar-se com tanto, estava a rodar o mundo como um adolescente do qual não sabe em exato o que deveria fazer, mas sabe que algo deve para continuar sobrevivendo, nem que para isso arranje interesses que outrora parecessem passageiros. Ele passara da adolescência e fora visto preso no que escolhera por não saber o quão fixas eram as consequências, havia se tornado alguém que tinha de driblar o mundo e atingi-lo com uma espada quando fosse necessário. Não sabia Khlaos que, embora passe a adolescência, emoções não bem desenvolvidas permanecem e as da juventude são as mais fáceis de conseguir levar a mente à mais uma "obsessão inofensiva". Pensara ele no passado: "Se eu não posso ser o dono de um restaurante em um futuro distante demais para ser pensado, ao menos posso aproveitar esta refeição."

Não achava que cometeria a ousadia de clamar o rosto alheio para jogar-lhe mel e flores, fora um impulso ruim de sua parte, mas pior havia sido machucar a outra. Não pensava claramente naquele instante. Olha para a égua de sua infância, realmente não sabia como Geada havia engravidado, mas lamentava por seu sofrimento. Havia tempos que não visitava os campos de Krishnaraj, estava ocupado com os "trabalhos sujos" que Ama se referira e ele não se orgulhava.

Toma uma tocha da cela e com seus próprios instrumentos a acende, era o princípio da noite. Em um bastão de madeira, como tudo ali, fincado na terra, deposita a tocha para que esta dê visão para Geada, mas a égua demonstra que não deseja ficar ali. Ela levanta mais uma vez e parece saber para onde vai, ele corre para seu lado, preocupado. Geada vai diretamente até o pequeno armazém ao lado do casebre e chuta a porta até que Khlaos tivesse de interferir e abrir em seu lugar, não entendendo o que se passava em uma égua que deveria estar deitada.

Quando a porta é aberta, cai Esperancza por todo o chão, a abertura havia desestruturado o monte nos cestos. Khlaos deseja impedir a égua, mas ela é mais forte e irritadiça, barrando-o de chegar perto. Com o focinho, Geada passa a espalhar Esperancza por todo o chão.

A égua choraminga em dor, as pernas cedem antes que ela termine ao trabalho, então Khlaos vai até o local e termina de espalhar a Esperancza pela qual não pagou. Geada, antes agitada, torna-se mais calma assim que se pode deitar e as plantas estão da maneira com que ela quer. Sente ao cheiro destas e deita o corpo em boa parte delas. O corpo relaxa e começa a tentar expulsar o filhote. Ela sofre, Khlaos aguarda enquanto a luz no distante se dissipa cada vez mais e a tocha se torne a mais forte fonte de luz. O ambiente urbano, quando transferida à escuridão, sente-se como se houvesse libertado o mais selvagem e silencioso de si, como um grande animal a pairar e não se saber, prestes a sempre poder engoli-lo. O céu do campo remoto ascende com todas as suas forças em suas estrelas e linhas de luzes, é como se este lado estivesse mais próximo da magia que a insipidez saturada do urbano. Silêncio lá, acreditava Khlaos, não significava a nada de bom, ali já parecia real.

EsperanczAOù les histoires vivent. Découvrez maintenant