CAPÍTULO 12. Vermelho

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― O que é magia para ti? Magia é o sobrenatural...

Ama começa a tentar falar após encher a boca de água para que ela deixasse de se sentir partida. As palavras agora saíam mais fluídas e baixas, sentia dores ao falar, mas não era como antes. Questionava suas capacidades antes, mas agora voltara a questionar seus valores.

― O que se tornara sobrenatural para mim por todo este tempo? Tudo...

"Um quase irreparável tudo", era o que dizia seu afastamento da sociedade. Ela era jovem, mas já havia deixado a tudo, dera todos seus custos. Tinha de lembrar-se que não havia nada a voltar, apenas pelo que avançar, mas naquele segundo com o corpo flutuante, sentira que não queria estar ali, em um lugar onde não fosse o lago flutuante permitindo que seu corpo pesasse menos e, destarte, a consciência. Tudo havia se tornado sobrenatural, ela não conseguia nem acreditar por completo na corda que passaram em seu pescoço ou os casarões próximos aquele lago, nada parecia real. As roupas, pessoas, motivações, todo a um equinócio. A estrutura distante do castelo-palácio continuava tão longínqua quanto a sua ideia dele.

Tentava imaginá-lo, mas não conseguia. Pegava a tudo que pensava ser luxuoso e belo e pensava: "Será se isso está no castelo? É tão bonito... Dever estar."

Não desejava ao castelo ou aos luxos sem fim, queria a tal magia que não a respondera. Queria não ter que morrer de exaustão como a sua linhagem e poder ver ao mundo fora da lavoura. Não queria ficar prestando opiniões a todo momento ou ser um alvo, queria a magia da qual não a havia respondido e sensações genuinamente bonitas para que tivesse uma vida contente, equilibrada. Queria trabalhar, mas que esse trabalho fosse recompensante e pagasse por todo o sofrimento que havia passado, trabalho que não fosse usado somente para esconder a perda e prostração perante o mundo. Era humilhante trabalhar todos os dias por nenhuma recompensa como um escravo que precisa dar satisfações para as pessoas que criaram a diferença de classes e que se esforçavam para manter a não equivalência de valores. Era exaustivo lidar com essas pessoas querendo tomar-lhe o pouco que tinha. Ela não podia desejar aquilo que não sabe o que é, deixava exceção para uma coisa, a única coisa da qual não a ignorava quando esta tentava comunicar-se.

Havia acontecido, fora deixada em silêncio por quem jamais havia a decepcionado, seu apoio na realidade desde que nada sobrara que não a terra e cadáveres para que a própria enterrasse. Ela deixava o estresse sair do corpo, nem sempre a magia no ambiente respondia, de fato, contudo jamais havia deixado de responde-la em sua fragilidade, nem quando preparara sua própria corda de forca nos galhos retorcidos. Ela continuara o trabalho de seus pais depois de enterrá-los no campo, a mente e o corpo não suportaram ir tão longe. Ama sabia muito bem fazer amarrações, sabia o porte da corda, galho e a estimativa do próprio peso, estava bem calculado. Todo galho que tentava suspender-se acabava desaparecendo ou mudando de forma e caindo junto de si. Jamais conseguira suspender ao corpo naquelas árvores, a floresta não permitia, embora silenciosa. Continuara trabalhando todos os dias, eventualmente conseguira preencher-se a um ponto que abandonara a ideia. A expectativa era o pior de tudo, então ela a suprimira, não deixara de trabalhar por um momento enquanto a luz estava alta.

Aqueles foram os primeiros dias, após tanto tempo, o qual não estava a fazer nada. Depois disso, também aprendera a jamais tomar decisões durante seu desespero, pouco daí provém da sabedoria. Sequer havia percebido o tempo passar, pouco assistira alguém envelhecer, sua noção de realidade se dava pelo crescimento da lavoura, não pelo seu. Não consumia ou fazia corrupção, não lidava com autoestima – a lavoura precisava dela para crescer, Ama –, ela era a única ali, tais coisas que precisavam de comparativos e deturpações não podiam encontrar campo em si.

Ama deixa seu corpo submergir e ela busca sua face. Seu corpo havia se alimentado das Desesperanczas, mas elas deram-lhe forças além da patologia desconhecida. As mãos arrancam cascas da face, os líquidos e ferimentos, lavando-os seguidamente. Não sabia se chorava ou algo do tipo, estivera seca por dias, mas agora era rodeada por água. Arranca as cascas dos olhos e deixa que vão ao fundo. O cansaço era tão profundo quanto sua determinação.

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