Capítulo 7

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Ele estava sentado, com a perna cruzada sobre o joelho, segurando uma xícara de chá delicada demais para sua mão calejada e enorme. À sua frente, o anfitrião apertava fortemente os braços da poltrona, claramente desgostoso da visita. O convidado trajava uma camisa branca, sobreposta por um colete cinzento com botões prateados, e uma calça de couro. A única arma que portava era uma adaga, o cabo e a bainha simplórios, indignos de alguém de nascimento elevado como ele.

— A que devo a honra de sua visita? — não havia gentileza na voz do anfitrião, nenhuma hospitalidade. A bem da verdade, ele parecia mais inclinado a pular no pescoço da visita, que não demonstrava qualquer tipo de incômodo com a grosseria evidente.

— Um amigo não pode visitar o outro? — pegou um cubo de açúcar, colocando-o com exagerado cuidado na xícara e mexendo-a lentamente.

— Um amigo não ajuda a noiva do outro a fugir. Um amigo não se alia ao inimigo do outro. Um amigo não se cala e assiste enquanto difamam o outro e destroem a imagem de sua corte — a voz dele se elevava a cada sentença, ódio e desprezo e decepção em cada palavra.

— Um amigo — manteve a voz suave, contida. O macho racional de sempre — não força o outro a se calar. Um amigo não se aproveita da lealdade do outro. Uma amigo não agride o outro. Um amigo, querido Tamlin, não permite que o outro seja forçado a se deitar com uma fêmea que odeia e também não permite que essa fêmea tente abusar do outro. Repetidas vezes.

Tamlin se calou a contragosto. As garras, que já se afundavam no braço da cadeira, recuaram, retraídas pela vergonha do Grão-Senhor.

Ele estava horrível: os cabelos loiros, desgrenhados e opacos; círculos roxos se formavam embaixo dos olhos verdes, que perderam todo o brilho; o corpo, que sempre havia sido musculoso, estava magro, como se não comesse direito e tivesse abandonado as atividades ao ar livre. Usava roupas surradas, as amarrações da camisa estavam frouxas o suficiente para exibir a cicatriz em cima do peito, onde o coração dele foi atingido em Sob a Montanha.

— Eu não tive escolha — resmungou. — Você sabe o que ela fez comigo — ela, Lucien sabia, era Feyre. O nome que Tamlin não conseguia pronunciar, não importava que tivesse ajudado a ex-noiva a salvar Rhysand, seu parceiro e marido.

— Também sei o que você fez com ela. E o que se recusou a fazer por ela — Lucien alfinetou — “Você não destrói a pessoa que ama, mas a trata com gentileza e cuidado”, lembra?

Aquilo era o que a mãe de Tamlin dizia sempre que o filho presenciava as agressões do pai e começava a se mostrar igualmente agressivo e descontrolado. O loiro trincou o maxilar, grunhindo em aviso, mas o mais novo dos Vanserra não se deixou intimidar.

— Ela estava em pedaços por nossa causa, pelo amor que sentia e por tudo que abriu mão para nos salvar. Ela lutava para se reconstruir. Você não permitiu, mas a privou de qualquer resquício de liberdade, de qualquer meio para lutar pela própria sanidade. Não a culpe por juntar os caquinhos do que você se recusou a colar.

— Então, você toma o lado dela — foi sua única resposta, sem acusação ou mágoa evidentes, mas apenas uma pontada tímida de curiosidade e o receio notável.

— Tomo, pois assim como faltou com ela, faltou comigo, ainda que de modos diferentes — não hesitou por um segundo. — Isso, no entanto, não diminui o amor e a gratidão que sinto por você. Por isso estou aqui. Para te ajudar a colar seus caquinhos, mesmo que os meus estejam longe de ser consertados.

— Não estou quebrado e se você acha que está, deveria se tomar por prioridade.

— Sua corte está indefesa, qualquer um pode entrar e sair quando bem entender — pontuou cuidadosamente, temeroso de qual seria a reação do Grão-Senhor — As outras cortes não lhe dão crédito, a Outonal provavelmente pensa em expandir ou simplesmente tomar a Primaveril. Sua casa está aos pedaços e, honestamente, estou surpreso por encontrá-lo na forma humana, ainda que sua aparência e modos deixem a desejar.

O loiro grunhiu em aviso, mas não fez menção de reunir seu poder ou partir para a agressão animalesca que já havia se tornado habitual para ele.

— Deixe-me ajudá-lo, Tam — implorou, franzindo levemente as sobrancelhas ruivas.

Um macho melhor. Ele sabia que Tamlin só queria ser um macho melhor. Por sua corte, por sua herança e pelo que pretendia legar a quem viesse depois dele. Pela sua mãe, que acreditava na bondade dele e tentou incutir alguma delicadeza no mais selvagem e amoroso do filhos. E para merecer alguma felicidade, ainda que apenas uma migalha.

— Vou considerar — foi tudo que respondeu.

Lucien sabia que aquilo era um dispensa educada, um bom sinal.

Ele se levantou, deixando a xícara, ainda cheia, na mesinha intacta. O resto da mansão não teve a mesma sorte. Aquele cômodo, o quarto da mãe de Tamlin, era o único que não estava tomado por espinhos ou marcado pelos arranhões de sua forma bestial. Um santuário desde que ela foi morta pelo pai de Rhys.

Quando estava perto da porta, Lucien sentiu algo se agitar em seu estômago, antes de estremecer violentamente e se dobrar, levando a mão ao peito ao sentir uma fisgada dolorosa.

Tamlin levantou-se imediatamente, saltando a mesinha e colocando a mão grande nas costas do amigo, que o usou como apoio ao se erguer cambaleante.

Medo puro, tangível, inundou o laço de parceria. Desespero assolador foi o que seguiu as sensações que se chocavam contra ele, e o filho do Outono sentiu quando a fêmea do outro lado gritou em agonia.

Antes que pudesse pensar, que pudesse tomar uma decisão calculada e racional, ele já estava atravessando. Não para a Mansão dos Exilados, onde Jurian e Vassa o instruiriam a agir com cautela, mas para Velaris, onde sua parceira sofria.

O que acharam? FINALMENTE o Lucien fez sua aparição, né? Só faltava ele do nosso quarteto de protagonistas, sempre o esquecido do rolê, coitado. Espero que tenham gostado da aparição dele e da conversa (bem sincera, diga-se de passagem) que ele teve com o Tamlin. Vocês acham que ainda há esperanças pra essa amizade, ou o Lulu deveria largar de mão?

O próximo capítulo deve sair na semana que vem (provavelmente no domingo ou segunda, mas não faço promessas kkkk), porém ainda não está pronto porque eu preciso decidir com muuuito cuidado como vou desenvolver as coisas agora. Estou tentando não deixar as ideias se embolarem e organizar os capítulos direitinho, então talvez o próximo não seja exatamente na perspectiva de quem vocês esperam (ou talvez seja, porque ainda não decidi, né?).

Enfim, não esqueçam de comentar o que acharam (e suas reações enquanto forem lendo, eu adoro elas) e favoritar o capítulo, ok?

- Anny Fireheart

Corte de Melodia e Luz Escarlate - ACOTARWhere stories live. Discover now