Capítulo 45

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O nariz dele coçava e pinicava por causa da nuvem de poeira que subiu na direção do seu rosto. Apesar de serem todos bem cuidados, alguns dos livros fornecidos pelos bibliotecários eram tão antigos que seria praticamente impossível não terem acumulado poeira ao longo dos séculos.

Lucien espirrou três vezes seguidas, virando o rosto rapidamente para evitar atingir qualquer um dos preciosos livros espalhados na mesa. A última coisa que ele queria era que um dos estudiosos de Helion lhe arrancasse as bolas, ainda mais por causa de algo tão insignificante quanto um espirro. Elas não estavam sendo muito úteis nos últimos tempos — um efeito colateral da castidade proveniente de ter um laço de parceria com alguém que não o queria —, mas não sentia a menor vontade de se desfazer delas só por causa disso.

— Que droga! — coçou violentamente o nariz com a costa da mão, sentindo-o formigar como se fosse espirrar novamente.

Estava ali desde que terminou o desjejum, horas atrás. Depois que deu por encerrado o treino com Gwyneth, ele tomou um banho rápido e seguiu direto para a sala onde faziam as refeições. Helion já se encontrava sentado, como no dia anterior, com a diferença de que lia com muita atenção um pergaminho. Ele estava tão concentrado com o relatório — Lucien achou que era um, devido ao nível de foco do Grão-Senhor — que sequer percebeu a chegada do ruivo, que precisou pigarrear audivelmente para ser notado.

Lucien suspirou, exausto e com a motivação abalada. Até aquele momento, não tinha encontrado nada de promissor em suas pesquisas. Não ajudava que estivesse fazendo o trabalho de três pessoas naquela manhã, já que Gwyn e Azriel tinham ido até os estábulos com o Quebrador de Feitiços. O ruivo não tinha o menor interesse em passar mais tempo do que o necessário ao lado de seu pai biológico, pois temia que Helion olhasse duas vezes para seu rosto coberto de cicatrizes e descobrisse acidentalmente, só a Mãe sabia como, sobre seu parentesco. Todavia, o Vanserra tinha ficado bastante tentado diante da menção de cavalos alados extremamente raros.

Uma batida firme soou na porta do quarto de Lucien, onde ele tinha decidido fazer sua pesquisa. Sem saber quem era, lançou seu poder até o corredor para tentar descobrir a identidade da pessoa, enquanto todo o seu corpo ficava tenso em preparação para um possível combate. Quando percebeu que era apenas uma das criadas do palácio, seus músculos relaxaram na cadeira e ele gritou dando permissão para que entrasse em seus aposentos.

— Príncipe Vanserra — curvou-se elegantemente, a voz soando límpida como as águas do Sidra.

Lucien se levantou, evitando torcer o nariz ou corrigir a fêmea diante dele. Não usava o título de príncipe da Corte Outonal desde o momento em que o coração de Jesminda parou de bater, tampouco fazia uso de seu sobrenome. Quanto menos pudesse ser associado à sua antiga corte ou ao crápula que era seu pai, melhor ainda. Mesmo que agora soubesse não ser filho de Beron, o mundo não tinha conhecimento disso e provavelmente jamais saberia.

— Em que posso ajudar? — perguntou educadamente, verificando todo o corpo da criada com o olho mecânico, em busca de armas escondidas.

Ela trazia uma bandeja de prata nas mãos, que era muito bonita e cheia de dobras no metal. Em cima da bandeja estava um cloche do mesmo material, escondendo o conteúdo dela e sendo tão elegante quanto. Lucien ficou cauteloso, temendo que pudesse haver alguma arma ou animal venenoso ali. Seu olho mecânico não denunciou nada, apenas um pedaço de papel, mas talvez algum encantamento poderoso pudesse ter escondido algo, de modo que mesmo seu olho dourado fosse enganado.

Como eles três eram convidados de Helion, os bons costumes da hospitalidade o proibiam de lhes fazer qualquer mal e o obrigavam a punir qualquer um que os ferisse em seu território. Ainda assim, nada impedia que alguém sem boas intenções aproveitasse a oportunidade, mesmo que isso fosse contra as vontades do Grão-Senhor. Olhar sempre por cima do ombro era algo que Lucien havia aprendido muito jovem, devido aos ardis da nobreza da Corte Outonal, especialmente de seus irmãos mais velhos.

Corte de Melodia e Luz Escarlate - ACOTARDonde viven las historias. Descúbrelo ahora