Capítulo 19

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A Suriel foi embora tão rápido quanto chegou, o corpo ágil como o vento sumindo de vista em meio ao verde e marrom da floresta. Ele sabia que Feyre estava ao seu lado, uma presença sólida e estável, tão diferente da confusão que se passava dentro dele.

Naquele momento, tudo que queria era ter a capacidade de se transformar em uma besta, como Tamlin, e sair correndo pela floresta. Queria se esconder, nunca mais ser visto e, se possível, deixar de existir. Sentia como se tivessem-no derrubado de um precipício, todo o ar fugindo dos pulmões e aquela sensação de queda inevitável, de morte iminente e certeira.

Não tinha ideia do que faria a seguir, se deveria ir com Feyre de volta para Velaris, até sua mãe na Outonal atrás de respostas ou diretamente para a Corte Diurna, conversar com o Grão-Senhor que a governava. Verificar se eles tinham algo em comum, se havia a menor chance, mesmo que mínima, de que possuíssem laços de sangue.

Mas o que ele diria?

Olá, eu sou Lucien. Então, pode ser que você seja meu pai e a minha vida inteira tenha sido uma mentira. Já se deitou com minha mãe?

De que adiantaria, de todo modo, ir até Helion para discutir aquilo? Certamente, o Grã-Senhor não poderia ter interesse algum em conviver com Lucien, assumi-lo como seu filho. E merda se ele por algum acaso fizesse isso, por menor que fosse a possibilidade, Lucien Vanserra se tornaria o herdeiro da Corte Diurna, a porra do próximo Grã-Senhor daquelas terras.

Merda, merda, merda.

— Lucien? — a voz de Feyre era suave, calma como as águas intocadas de um lago há muito esquecido pela civilização.

Ele começou a ofegar. Conseguia sentir o modo como o suor se acumulou em seu corpo, deixando-o pegajoso e nojento em poucos segundos, completamente ensopado. Suas pernas falharam e ele mal teve tempo de registrar o que se passava antes de se ver de joelhos, as folhas caídas e a terra fofa amortecendo o impacto. Levou as mãos ao rosto, desespero e confusão e agonia se apoderando dele por completo.

— Lucien... — ele viu quando ela se aproximou mais, ajoelhando-se na frente dele, o olho mecânico funcionando mesmo contra a sua vontade. Feyre colocou uma mão em seu ombro, apertando o suficiente para que ele tirasse as mãos que cobriam o rosto. — Sinto muito que tenha descoberto dessa forma, eu...

— Você sabia? — perguntou em choque.

Então parou para analisar a sua expressão corporal com o cuidado minucioso de um cortesão. Os ombros dela estavam curvados, como se um peso invisível os forçasse a ficar daquela forma. No entanto, foi o modo como os olhos dela estavam tristes e carregados de culpa, o cenho franzido em pesar, que a delatou.

— Você sabia — não era mais uma pergunta, mas uma acusação carregada de mágoa — Por que... por que não me contou? — sua voz era um sussurro, um choramingar fraco. Tinha certeza que soava como uma criança chorona, mas era exatamente assim que se sentia ao ter sua confiança traída.

Tentou controlar sua respiração, segurar o poder que rugia para ser libertado, para se vingar por ter seu portador ferido. Lucien empurrou o poder para baixo, o esmagou e pisoteou, segurando as rédeas das chamas revoltas que pinoteavam para serem libertadas.

— Eu... não sei — suspirou, levando a mão livre para a ponta da trança que caía sobre o ombro esquerdo. — Estávamos no meio da guerra quando descobri e você estava procurando Vassa... não era um bom momento.

— A guerra acabou tem mais de um ano, porra — não pôde segurar o rugido que veio com as palavras. De maneira geral, gostava de evitar o uso de palavras sujas na frente de damas, era uma questão de etiqueta e também de respeito, sua mãe ensinara. Naquele momento, porém, não pôde conter os próprios modos.

Corte de Melodia e Luz Escarlate - ACOTAROnde histórias criam vida. Descubra agora