Capítulo 29

38 3 0
                                    

— Vamos jogar um jogo — eu propus, depois de encarar o teto cavernoso como se fosse o céu estrelado por uma hora.

A chuva nos interrompeu muito rápido, dormir nesse horário parecia impossível. Agora ela se foi e Oliver se encostava em um dos cantos, brincando com sua faca entre os dedos com a mesma familiaridade de um carpinteiro com madeira.

— Calynn, vá dormir — ele murmurou.

— Não estou com sono e você também não está.

— Não acho que você entenda o quão perigoso é andar por essa floresta.

— Não acho que você entenda o significado de diversão. Não faremos barulho, ninguém vai reparar.

— Eu não estou aqui para me divertir, Laskaris.

Laskaris. Não sabia se era a lembrança de meu pai ou o jeito que ele falava, mas eu odiava aquele nome.

Eu me sentei para encará-lo.

— Tudo bem, mas ao menos fale comigo.

— Do que você quer falar?

Oliver inclinou a cabeça cuidadosamente, um gesto que tomei como desafio.

— Já se apaixonou?

Oliver respirou fundo, revirando os olhos.

— Não acho que tenha — continuei. — Você me parece muito frio para saber o que é paixão. Ou talvez tenha conhecido o amor e é por isso que é frio. Qual dos dois seria?

— Nenhum. E não fale como se você conhecesse o amor.

— Eu já me apaixonei, para a sua informação.

— Você se apaixonou ou caiu pela primeira pessoa que te deu atenção?

Era impressionante como em todas as nossas conversas eu saia com algum tipo de dor. Odiava como as palavras arranhavam meu coração com garras de leão. Eu sempre conheci a dor, mas não esse tipo. Quem vive no silêncio não sabe o poder de uma palavra.

Fechei meus olhos, apenas por alguns segundos.

— Por que não pode ser os dois?

— Talvez possa, mas acho que você nunca conheceu a parte mais pura do amor. Você amou alguém que te deu atenção, imagina amar alguém que se entregou por completo a você.

— Parece um sonho distante demais para ser verdade — murmurei, inclinando a cabeça, analisando o espião a minha frente. — Você é sonhador, Oliver?

Ele pigarrou.

— Eu não tenho tempo para sonhos, apenas vi o amor, mas já faz tempo.

— Então nunca conheceu ninguém que você, como disse antes, se entregaria por completo?

— Conheci uma menina anos atrás. — Ele me encarou, a luz do luar que entrava pelos buracos da caverna e dançava na escuridão dos seus olhos como água e tinta. — No momento que a vi soube que eu jamais amaria alguém além dela.

— Então você a ama — conclui, e aquelas quatro palavras saíram com mais dificuldade do que eu gostaria de admitir.

— Não. Mas se vou amar alguém sei que será ela.

— Oliver, você é tão confuso! — Ergui meus braços em pergunta, uma que eu nem conseguia formular. — Por que não está com ela, então? Quem é ela, afinal de contas? O que...

— Calynn, se eu jogar seu jogo, você vai parar de fazer perguntas que eu não quero responder?

— Não pode parar de me responder agora que me confundiu toda.

Coroa de CinzasWhere stories live. Discover now