Capítulo 41

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A estrela do norte era nosso único guia. Era toda a informação que Geórgia deu para nós. Sigam a estrela do norte. Ainda não falei com Oliver sobre como a vaga instrução da irmã talvez seja um problema. E nem quero. Ele estava certo, Geórgia passou por muita coisa e eu não seria a pessoa a pressioná-la. Então nós seguimos norte o dia inteiro. Andando, e andando, e andando.

Eu me sentava perto da fogueira, por mais que o calor era até forte demais para dormir tranquilamente. O céu não tinha uma nuvem e as estrelas brilhavam com todo seu louvor. Na cidade elas eram ofuscadas toda noite, mas aqui nunca. Eu as apreciaria por muitas noites no futuro, mas hoje eu estava apenas entediada. Andar, andar, e andar é praticamente tudo que fazemos há quase um mês. Nesse ponto era simplesmente uma rotina cansativa. Por outro lado, Liam não parecia nem um pouco incomodado. Neste momento ele se apoiava em uma árvore e eu não entendi o porquê até ver Auryn caminhando de dentro da floresta para nossa direção. Ela não conseguia ver Liam, mas eu também não avisei. Auryn, com seus passos confiantes e os cabelos brilhantes que pareciam balançar com um vento divino, não parecia o tipo de pessoa que era pega desprevenida. Tipo, nunca era pega desprevenida.

Observei de canto de olho, como todos ao redor da fogueira, até que Liam saltou na direção da menina. Um grito que eu nunca esperei ver sair de Auryn ecoou pela floresta, logo seguida do estrondo, o qual foi o soco que ela deu na cara de Liam.

E que soco Auryn deu.

Cheguei até a ofegar com a imagem e podia jurar que, neste momento, Liam via estrelas também.

— Seu louco! — Auryn falou abrindo e fechando o punho vermelho.

Aquelas palavras se livraram da surpresa em mim, substituída por uma boa gargalhada. Quer dizer, gargalhadas de todos os lados estouraram. Eu já não tinha ar quando Liam conseguiu caminhar e despencar ao meu lado.

— Aí Deuses, você tem que assustar ela mais vezes — eu disse enquanto tentava recuperar meu ar.

— Vou precisar me recuperar primeiro — ele choramingou com sua mão apoiando o rosto.

Auryn lançou um olhar furioso que Liam nem viu. Octavia, Oliver, e Aisha ainda tentavam se controlar.

Quando o silêncio voltou vagarosamente, a minha inquietação também. Eu não queria dormir agora e sabia que eles tinham uma facilidade em adormecer que eu não tinha.

— Deveríamos jogar um jogo — eu sugeri.

Ao meu lado, os olhos de Liam se acenderam, mesmo com sua cara ainda vermelha.

— Finalmente uma ideia boa, princesa.

— Vocês estão falando sério? — perguntou Octavia com um misto de descrença e tédio.

— Eu quero jogar! — Aisha disse batendo palminhas.

— Eu jogo. — Auryn deu de ombros, mas eu via o jeito que seus olhos brilhavam. Eram quase como os de Liam. A menina de cabelo brilhante tinha cara de quem gostava de um bom desafio.

Oliver olhou para a irmã. Geórgia mal trocava palavras com a gente. Mais cedo perguntei se ela precisava de ajuda com alguma coisa, mas ela me dispensou e se deitou. Eu sabia que ela nem estava dormindo, mas o que eu podia fazer? Ela falava bem mais com Oliver, mas eu conseguia sentir a distância entre eles, especialmente pelo jeito que Oliver sempre parecia um pouco abatido quando estava ao lado dela. Eu não julgava, devia ser difícil ter sua irmã finalmente ao seu lado e perceber que tudo mudou. Os olhos azuis-claros encontraram os meus, o espião estava com uma expressão indecifrável.

— O que você está pensando? — Ele levantou uma sobrancelha.

----- ••• ----- 

— Tudo bem. — Eu bati uma palma. — O jogo é simples: a bola passa pelo quadrado do oponente e a equipe ganha um ponto. Não pode mexer nos quadrados nem segurar o oponente. Se a bola cair no chão, vai para a outra equipe, só para deixar as coisas mais interessantes. E sem poderes!

Criei os quadrados de madeira com meus poderes e a bola também, só que esta era feita de pedra. Liam, Oliver e Aisha estavam de um lado, enquanto eu, Octavia, e Auryn estávamos do outro. Todos assentiram e eu quebrei um galho e segurei de um jeito que ninguém poderia ver qual era o maior. Octavia e Oliver foram competir para quem começaria com a bola e é claro que foi Oliver que tirou o maior galho. Com muita má vontade, entreguei-lhe a bola e acompanhei Octavia para o nosso espaço.

— Três, — Auryn começou, todos se colocaram em posições e eu não deixei passar despercebido o olhar travesso que Liam e Oliver trocaram. — Dois, um... Agora!

Eu quase não consegui ver o que aconteceu, só senti meu corpo imobilizado, enquanto vi Liam de repente aparecendo na frente de nosso arco, e jogando preguiçosamente a bola por ele. Aisha deu um pulo de alegria enquanto Liam voltava para o seu lado. Eu sentia o cheiro de chuva e carvalho vindo de trás de mim, me imobilizando, e a irritação subiu pelo meu corpo a ponto de eu jurar que vi fumaça saindo do meu nariz.

— Isso, — eu me soltei de Oliver e o joguei de costas no chão com um movimento rápido. — Se chama roubar na cara dura.

— Você não está mais no mundo humano, Laskaris. Jogos Elementais usam poderes Elementais. — Oliver disse, colocando os braços atrás da cabeça preguiçosamente.

Era estranho ver Oliver usando seus poderes, dessa vez com tranquilidade genuína. Mas era compreensível. Agora, estávamos oficialmente em terras Elementais. Dessa vez, eles estavam em casa.

— Você me segurou — eu acusei.

— Isso foi só para deixar mais interessante.

— Tudo bem, — Octavia disse, encarando Liam com raiva. — Se é assim que é para jogar, vamos lá.

Suspirei enquanto ela estalava os dedos. Acho que ninguém daquele grupo gostava de seguir planos e regras. Apenas ajudei Oliver a se levantar e voltei para meu time. Octavia estava certa, se aquele era o jogo tínhamos de jogar de acordo.

Eles começaram com a bola de novo, já que fizeram o ponto — roubado. Auryn fez a contagem regressiva novamente e eu vi nosso arco instantaneamente desaparecendo quando o jogo começou, como se não estivesse lá. Liam se teletransportou para perto do quadrado de novo, mas Octavia o atingiu com uma bola de água. Pego de surpresa, ele soltou a bola e com o ar eu a puxei para mim. Já sentia Oliver vindo para cima e joguei a bola para Octavia que estava mais perto. Ela estava com as mãos ao ar quando a pedra foi cercada por água e puxada para Aisha. Enquanto segurava a bola, Aisha jogou água na direção do quadrado, marcando suas bordas com o líquido e fazendo o formato aparecer novamente.

A partir daí foi uma bagunça. Liam me deu no mínimo quatro rasteiras, e eu perdi a conta de quantas eu dei em Oliver. Aisha molhou todo o chão fazendo todo mundo escorregar e se sujar. Auryn deu mais de dez sustos em Liam com suas ilusões. Oliver quebrava o quadrado toda vez que sua bola acertava a lateral. E Octavia, quando se via sem saída, esquentava a pedra e passava para Liam, que sempre queimava a mão.

Geórgia uma hora nos observou de longe e mesmo com a nossa insistência que ela participasse, ela simplesmente voltou a dormir. A menina precisava de tempo, eu sabia disso. Mesmo assim, tinha a impressão que havia algo a mais que ela precisava e não tinha. Algo que a deixava nessa situação.

Ninguém sabe quem ganhou, por mais competitivos que cada um de nós fosse. A verdade é que tinham tantos obstáculos para realmente conseguir marcar o ponto que nosso foco foi completamente sugado por isso. E estava tudo bem. Com eles, eu nunca precisava ganhar, e isso me confortava de um jeito que meu lar e minha família nunca conseguiram.

É claro que os dois chatos, Liam e Oliver, insistiram a noite inteira que ganharam, mas todos sabiam que eles não tinham ideia. O que só nos dava mais motivo para rir quando eles usavam seus argumentos fajutos.

Antes de meus olhos fecharem, eu lembrei do tempo que eu sentia falta de algo que eu nunca havia experimentado. Naquele momento, soube que era disso que eu sentia saudade.

Coroa de CinzasWhere stories live. Discover now