Capítulo 39

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— Tem certeza que está bem? — perguntei uma última vez a Oliver antes de começarmos o caminho.

— Pela décima vez. Já estou totalmente recuperado — ele afirma, levantando sua blusa para mostrar a pequena cicatriz que ficou no lugar do corte envenenado. — Vamos.

Parei de insistir, ainda que insatisfeita. Não dava para não me preocupar sabendo que quase não faz vinte e quatro horas desde que Oliver estava quase morrendo bem na minha frente.

— Vou estar esperando aqui com o transporte, cuidado e boa sorte — Aisha sussurrou.

— Se não voltarmos em quarenta minutos, esqueça o transporte e vá embora — avisa Auryn.

Quarenta minutos. Parecia tão pouco e, ao mesmo tempo, uma eternidade. Aquele era todo nosso tempo.

— Vamos — Octavia falou já entrando no túnel.

Sim, um túnel. Eu não sabia que existia uma prisão no castelo que agora eu reconhecia como o do meu tio Edgar Ferri, muito menos que existiam entradas subterrâneas para a tal prisão. Sinceramente, eu nunca gostei muito dele. Edgar andava sempre com o nariz empinado, arrastando seus robes vermelhos como sangue pelo castelo, e não olhava nos olhos de ninguém além do meu pai. Ele nunca se envolvia em assuntos sérios do reino, entretanto. Saber que ele dormia sobre centenas de pessoas sofrendo fazia muito sentido ao mesmo tempo que era surpreendente. A entrada deste túnel era tão isolada, tanto da cidade quanto dos muros do palácio, que eu não me surpreendia que Auryn tenha conseguido escapar.

Liam seguiu Octavia e Oliver me esperou, mas eu esperei Auryn. Ela encarava o túnel, sua face neutra de sentimentos. Até que a menina de cabelos brilhantes suspirou e assentiu para mim, criando uma bolinha de luz em sua mão e adentrando o subterrâneo.

— Boa sorte — falei para Aisha, seguindo Oliver para dentro também.

Por um tempo apenas desviamos de obstáculos no caminho e nos esprememos entre paredes estreitas. Estávamos focados em executar o plano, saber nossos afazeres e direções, mas eu já sabia tudo o que tínhamos que fazer, e o silêncio estava incomodando mais do que ajudando.

— Auryn, não precisa responder se não quiser, mas como você descobriu esse túnel?

— Não fui eu — sua voz ressoou baixinho. — Foi meu irmão Dag. Ele conseguia se transformar em qualquer animal desse mundo. Uma semana, os guardas estavam nos dando um líquido diferente. Pela primeira vez a substância não nos enfraquecia, ela nos fortalecia e ampliava nossos poderes. Os guardas não perceberam o quanto aquele líquido nos afetava. Mesmo com o veneno e mesmo com as correntes anti-magia nós ainda conseguimos usar eles. Dag se transformou nos menores animais e explorou toda a prisão em dois dias. Foi ele que descobriu o túnel, ele descobriu onde eu estava e me resgatou. Nós escapamos, mas acabamos chegando perto demais dos muros e os guardas nos viram. Eu fugi, mas só porque Dag ficou para distrair os soldados. — Auryn deu um tempo para a sua voz voltar ao normal, sem carregar tanta dor e tristeza. — É por isso que preciso do espelho. Preciso saber se ele continua vivo. Ou qualquer um da minha família.

Eu assenti, por mais que ela não pudesse ver. Já podíamos escutar os guardas se movimentando, então a entrada não deveria estar muito longe. Eu não conseguia imaginar a dor de Auryn. Depois de anos presa na cadeia, separada do irmão, ela o perde novamente no momento em que eles escapam. Eu não a culpava por não querer entrar. Nosso acordo era que ela nos levaria até a cadeia seguramente, não que ajudaria a tirar pessoas da prisão. Sem falar que se eu passasse boa parte da minha vida dentro de uma cela, não arriscaria voltar para aquele lugar também.

— Todos lembram o que devem fazer? — Auryn perguntou quando chegamos na entrada.

Para falar a verdade, aquele lugar só parecia ser o final do túnel, mas eu não duvidava que havia uma porta secreta bem ali.

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