29| Ódio

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C A P Í T U L O 29

ÓDIO

Entrei no escritório. O Matt tinha-me chamado trinta minutos antes. Estava sentado na sua cadeira grande, preta e confortável, com os pés em cima da mesa e segurava algo nas suas mãos. Sustentava um sorriso que mostrava superioridade e logo percebi que ele estava a planear alguma coisa.

Não o via desde o dia em que tinha saído com a Savannah para o Dubai. Preferia que eles lá tivessem ficado. Era um favor que me faziam. Mas claro que isso não podia acontecer. Se o Matt não tivesse regressado o jogo seguinte não teria tido tanta adrenalina. Ele fez com que as coisas se tornassem mais intensas e confusas.

- O que queres? – perguntei ríspido.

O olhar dele caiu em mim e uma gargalhada escapou-lhe da boca. Não compreendia o porquê das reações dele para comigo. Eram algo de uma certa incógnita. Ele levava-me aos extremos até eu querer acabar com a minha própria vida, mas primeiro com a dele.

- Boa tarde para ti também Harry. – parecia bem disposto, o que era de admirar. Por isso aquilo mostrava que ele estava a ter o controlo em algo que o iria fazer chegar a um lugar mais avantajado na vida. – Espero que tenhas sentido saudades minhas.

Ri-me sem vontade. – Não tenho a tua paciência Matt. Diz o que queres de uma vez por todas.

Estava vestido nas minhas roupas de treino. Tinha ido até ao ginásio para descarregar alguma da minha raiva num saco de boxe, mas precisava de fazê-lo por mais umas horas e com uma intensidade maior devido ao encontro com aquele monstro.

- Espero que estes dias sozinho com a tua namoradinha tenham sido agradáveis. – foi então que consegui ver o que ele segurava nas mãos. Era uma fotografia. Da Ava e do Evan. Era a fotografia do Carl, aquela que eu andava à procura.

Quando ele percebeu que eu tinha visto a fotografia o seu sorriso cínico alargou-se. Queria destruir-lhe tudo naquele momento. A minha raiva estava no pico mais alto e eu não estava a conseguir suporta-la dentro de mim. Só queria descarrega-la no Matt e dar cabo da cara dele. Não compreendia o porquê de tanta tortura psicológica comigo.

- Ela até que é bonita. Boa escolha. – cerrei os punhos quando ele olhou para mim. – Agora a Savannah é que não achou muita piada.

Aquela cabra. Pensei com vontade de lhe arrancar os cabelos.

Eles eram autênticos monstros. Autênticos Holman que queriam tudo, nem que para isso ficassem sozinhos no mundo. Eles queriam poder através da fraqueza dos outros. Quem se estava a tornar fraco naquele meio era eu. Devia de ter parado no momento certo. Ou melhor, devia de ter sabido distinguir as coisas e apenas continuar com a minha posição inicial que era descobrir o que se passava e tentar com que mais ninguém se aproxima-se. Mas não, eu envolvi-me pesada e destruidoramente para mais tarde cair e não me conseguir levantar. Mas talvez eu já estivesse a ser levado de rastos para o lado mais negro do inferno.

- Dá-me essa fotografia. – disse entre dentes. Não deveria de mostrar tanta raiva e preocupação. Mas era inevitável depois dos últimos acontecimentos. – E afasta-te!

- Que bonito. – a falsidade nas suas palavras era tão presente. No entanto ele dizia-o com alguma satisfação pessoal. – Nunca pensei que fosses cair tão facilmente na filha do Carl. Logo na filha dele. Que coincidência. Até estou desejoso para assistir ao espetáculo da revelação de toda a verdade. – naquele momento fiquei confuso. Mas mais tarde percebi que tudo aquilo era algo planeado pelo Matt há muito mas muito tempo.

- Para de a perseguir. – estava possesso. Não compreendia muito bem porquê. Eu gostava do contacto físico com ela. Mas só isso. Não havia mais nada para além de tal. Confesso que estava um pouco faminto de tal. Era uma necessidade forte para mim. Ela correspondia muito rapidamente ao meu toque e brevemente eu queria intensifica-lo. Só que em certos momentos eu desejava nunca o ter começado. – Deixa-a em paz. Mete-te no teu caminho.

- E se eu quiser que ela venha para o meu caminho? – os olhos odiosos dele encararam-me profundamente.

- Eu não vou deixar.

***

- Precisamos de falar. – pousei as mãos em cima do balcão e logo o olhar da Ava pousou em mim. Parecia um pouco assustada com as minhas ações.

- Olá para ti também. – moveu-se lentamente pousando um copo. – Eu estou a trabalhar, como podes ver.

- Pois, mas o que eu tenho para te dizer é mais importante que isso. – bati com os dedos no balcão em sinal de impaciência.

Nem devia de ter ido com ela. Devia sim de ter arranjado maneira de parar com os avanços do Matt. Estava completamente sozinho para lutar contra ele. O Carl estava debilitado a um nível demasiado intenso. E a Ava parecia completamente fora do mundo, psicologicamente. Ao esconder a verdade de ambos não tinha para onde me virar.

Num mês a minha vida tinha dado mais voltas de 360º do que todo o meu percurso neste inferno. Estava sempre a tropeçar em mim mesmo e a arrastar as pessoas comigo. Pessoas que eu nunca imaginei que viessem a ter uma posição tão decisiva na minha existência insignificante.

- Tu não podes nunca, mas nunca mais andar sozinha. Nem para ir apanhar ar. – era compreensível que ela fizesse perguntas sobre isso. Para os outros, porque para mim não.

Olhou para mim com um olhar interrogativo. Ainda não conseguia perceber o porquê de ela não se mostrar assustada com o facto de eu ter morto uma pessoa. Não era normal as pessoas fazerem tal coisa. E eu tinha-o feito, com o meu melhor amigo. Por isso o mais provável era ela querer que eu nunca mais olhasse para ela e desaparecesse completamente do seu campo de visão. Só que ela queria-me perigosamente de perto assim como eu também a desejava.

Éramos mentes confusas em corpos estagnados.

- Estão a acontecer coisas muito perigosas. – com tantas mentiras tinha de começar a revelar suavemente algumas peças. Era prejudicial, mas por vezes nem eu sabia o que fazer propriamente.

- Que tipo de coisas? – algum receio pairava no seu tom de voz. – Preciso que me comeces a esclarecer da situação uma vez que é a minha vida.

- É a minha também! – disse de forma rígida. – E há coisas que é melhor estarem suspensas. Esta é uma delas. Apenas faz o que eu mando.

- Não vamos jogar a jogos de submissão. Diz-me o que se passa de uma vez por todas. – ela parecia necessitada em certas situações. Mas depois muito dona de si mesma.

- Há muita coisa em jogo. – disse de forma mais calma. – Há vidas em risco e eu não quero ter de voltar a matar alguém...

A frase ficou suspensa no ar. Eu não me sabia expressar e o olhar de desespero na cara da Ava deixava-me frustrado.

- Não percebo nada Harry. – a voz falhou-lhe um pouco.

- Eu também não. – era verdade. Havia uma enorme confusão que eu não podia dominar. Não tinha respostas para as minhas próprias perguntas, por isso não podia ter para as dos outros.

Senti o meu telemóvel tremer. Tirei-o do bolso das calças e tinha uma mensagem.

De: número desconhecido [3:45 p.m]

Foi mentira.

Li as duas palavras repetidas vezes. Não encontrava nexo nenhum para tal. Mas depois associei aquilo ao bilhete que tinha encontrado à beira da arma. E não eram ameaças. Eram só avisos para me proteger de um golpe que revirou tudo.





Callous | h.sWhere stories live. Discover now