36| Revelações

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C A P Í T U L O 36

R E V E L A Ç Õ E S

Aquilo não era uma alucinação. Não era pelo simples facto de que a Ava também estava a ver o mesmo que eu. Era real, e confuso. Não conseguia compreender. Nem sequer conseguia dizer uma palavra ou mover o meu corpo. Parecia que estava tudo a passar-me à frente dos olhos e ou eu agarrava em algo, ou então ia ficar sem nada.

Aqueles olhos azuis claros comprovavam que durante aqueles anos uma mentira dominou-me e fez-me querer acreditar que eu tinha cometido um crime, que eu tinha matado o meu melhor amigo, com as minhas próprias mãos, quando na verdade, nada daquilo tinha acontecido. Mas, mesmo a vê-lo, eu não deixava de estar confuso. Como poderia ser possível? Eu tinha visto com os meus próprios olhos. O sangue à volta dele. Eu tinha visto...

- Harry... o que é que fazemos? – senti a voz da Ava perto do meu ouvido. Não me virei. Tinha medo que aquele corpo à minha frente desaparecesse. Tinha medo que tudo voltasse a acontecer. Que tudo aquilo que eu acreditava que era certo não passasse de uma criação da minha imaginação, que me apunhalava e me fazia crer em coisas impossíveis, mas que na sua realidade eram a mais pura das verdades.

Não havia oportunidade para conseguir formar algo coerente como resposta. Eu estava... completamente sem palavras. Eu sentia-me traído por ver o Niall ali à minha frente. Havia alguma coisa que me garantia que ele tinha grande culpa do que se tinha passado, e que eu tinha sido apenas usado, pelo meu próprio melhor amigo. E isso eu nunca tinha imaginado.

Ele tinha sofrido exatamente o mesmo que eu nas mãos do Matt. Nós éramos os seus bonecos favoritos, aqueles com que ele podia sempre brincar quando se sentisse entediado com a vida. Ele usava-nos e manipulava-nos. Nós fomos comprados por ele como se nos tratássemos de meros objetos. E sem mais nem menos, o meu melhor amigo resolveu aparecer-me à frente, quando eu o tinha matado...

- És mesmo tu? – acabei finalmente por conseguir dizer algo, ainda que a minha voz estivesse demasiado presa no fundo da minha garganta para ser totalmente compreensível.

Tudo o que recebi pela pessoa à minha frente foi um aceno de cabeça.

Aquele não era o meu melhor amigo. Era impossível tal ser real. Não havia mais cabelo loiro. Já estava num castanho deslavado e coberto por um boné velho. As roupas escuras que ele outrora usava tinham sido substituídas por umas roupas com cores monótonas. Ele parecia dez anos mais velho.

- Preciso de te levar para casa. – virei-me finalmente para a Ava. – Eu preciso de perceber o que se passa. – voltei o meu olhar para o rapaz, que não sei se por cobardia, medo, arrependimento, ou o que quer que fosse, ainda permanecia junto à porta. – Só que tu. – apontei um dedo para ele. – Vens comigo, antes que fujas. Precisas de me explicar muita coisa.

Passei por ele e saí, indo diretamente para o carro. Logo a Ava ocupou o lugar do pendura e o Niall o detrás. Fiz inversão de marcha e conduzi pela estrada demasiado concentrado nos meus pensamentos para me preocupar com a velocidade. Num instinto parei o carro. Não me tinha apercebido através do olhar que estava em frente à casa da rapariga que me controlava estranhamente, mas algo dentro de mim tinha-me feito perceber tal coisa. Saí do carro e acompanhei-a até à porta de entrada.

- Promete-me que não vai acontecer nada. – a Ava olhou-me com medo, como se pressenti-se algo. Aproximou-se de mim, como numa necessidade urgente de eu não a deixar.

- Não vai acontecer nada. – eu queria estar firme enquanto àquilo, mas com a raiva que balançava dentro de mim, qualquer coisa poderia acontecer. Porém eu não podia deixa-la no embalo da negatividade. – Não saias de casa sozinha. – olhei-a nos olhos. – Depois eu passo por aqui.

Callous | h.sDonde viven las historias. Descúbrelo ahora