Capítulo 46

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Os sonhos costuman mudar com a idade, mudar com nossas decisões e mudar de acordo com a nossa prioridade. Alguns sonhos nos são roubados, outros simplesmente não dão certo ou não foram feitos para nós. Mas quem é que decide quais serão os nossos sonhos ? Quem escolhe o que cada pessoa deve fazer para tentar ser feliz ?
Nós mesmos decidimos isso ou os sonhos quem nos escolhe ?
Para muita gente o menino mau dos Grayson's não tem sonhos além de passar o resto da vida em viagens e orgias, bebendo e fazendo de tudo para aumentar a fama e o rombo na conta da família. Entrar em uma faculdade calaria fácil a boca de todos esses abelhudos, a necessidade de provar a todos o meu valor vem junto com todas as vezes em que cometi erros.
Nos ensinar a levantar logo após tomar uma rasteira foi fácil, mas na prática tudo fica diferente. Por alguns anos eu serei obrigado a fazer algo que não quero, mas que sou bom. E depois ? Depois eu posso ter outros pensamentos, outras ideias.
Outros sonhos.
O tecido felpudo da toalha toca meu rosto, secando e fazendo o favor de me arrancar dessa linha de pensamento excêntrica. Encaro o espelho embaçado, não gostando nenhum pouco de estar tão largado. Uma barba está querendo crescer, olheiras estão aparentes e meus cabelos um pouco maiores do que deveriam.
Cinco minutos Grayson.
Tento filtrar meus pensamentos, querendo reservar meus pensamentos aquela ruiva que ainda me espia pela janela. Saio do banheiro, uma pequena pontada de nervosismo ao me aproximar da cortina. Estico o pescoço, começando a enxergar a casa da frente.
Lá está ela.
Com os cabelos soltos e os olhos fixados em minha direção, uma das mãos acaricia levemente a pele do pescoço e eu não consigo me segurar, acabo desistindo de manter o sigilo e deixo que ela me veja. Mia não parece se assustar, nem mesmo demonstra algo por eu ter a flagrado. Apenas tomba a cabeça para o lado e se encosta no batente de madeira, ajeitando os óculos antes de sorrir rapidamente. Sinto minha boca ficar seca, como se todo o ar do mundo não fosse suficiente para me manter o meu coração batendo.
Isso é o suficiente para melhor o meu dia. 

Caminho rápido demais pelo corredor da escola, os dedos anciosos segurando a jaqueta do time. Alguns ombros chegam a se chocar com o meu, mas duvido muito que alguém tenha se importado com isso. Empurro a porta da sala de alemão de uma vez, me enfiando em meio as carteiras e atrapalhando algumas conversas antes de encontrar um único lugar vazio no final da fileira. Largo a mochila sobre a mesa, deixando a jaqueta sobre o colo antes de me acomodar. Os olhos da senhorita Fisher estão fixados no pequeno grupo próximo a sua mesa, as vozes deles em tons altos e incrivelmente chatos de se ouvir. Não sei se para ela o assunto pode ser interessante ou indispensável, mas duvido muito que ela e sua língua afiada deixem isso barato.
- Que futuro vocês esperam ter ?
Todas as cabeças inativas despertaram, se virando para encarar a mulher provocante encostada no quadro negro. A pergunta parada no ar, os olhos focados no nada e até mesmo no teto.
- respondam, por favor. Que futuro vocês esperam ter ?
O silêncio continua por mais alguns segundos, o que visivelmente irrita a senhorita Fisher ao ponto da mesma pegar seu caderno de anotações nas mãos e se sentar em sua cadeira.
- espero que passem a refletir mais sobre esse assunto ao invés de ficarem conversando durante a aula sobre que biquíni vão usar na próxima festa, a vida de vocês vai começar de verdade em menos de um ano e ela não vai ser nada gentil. Então procurem buscar o seu lugar no mundo antes que ele te devore com todos os dentes. - ela abre o caderno, foleando algumas páginas. - abram o livro na página setenta e cinco e façam os exercícios, vou corrigí-los em meia hora e introduzir a próxima tarefa.
Abro o livro, me perguntando se algum dia eu já parei para pensar no que aconteceria se eu largasse tudo o que é relacionado aos meus pais e começasse do zero. É uma situação bem complicada, ter de tudo durante anos e do nada não ter mais nada além das próprias roupas do corpo. Tento dispersar esse pensamento, retomando a minha tarefa e começando a forçar meu cérebro a traduzir alguma palavras.
Eu realmente deveria ter estudado mais.
Me remexo na cadeira, o jeans está um pouco justo demais nas coxas e eu desconfio que Susan devolveu algumas das peças pequenas ao meu closet. Retiro o celular do bolso lateral da mochila, a tela acende com o meu toque e então eu sinto minha testa ficar levemente franzida. Uma mensagem curta e estranha vinda de Sam e toda a sua animação.

Convenci minha morango a ir na festa do McQuade.
Suspeito que ela queira te ver, então não jogue fora essa chance.
Sam.

Bloqueio a tela e devolvo o celular ao bolso em que estava, tratando de terminar logo essa tarefa antes que a " adorável " senhorita Fisher corrija e retire meus pontos.
Literalmente, alemão não é uma das minha matérias favoritas ! Está bem, eu não tenho muitas matérias favoritas, acho que isso não pode dizer muito sobre a personalidade de alguém mas eu posso estar errado. Esportes sempre estiveram em primeiro lugar para mim, mas para me manter neles eu deveria ter notas um pouco acima da média.
Nunca seis para baixo, ora sete e oito, sempre nove e dez.
- Ich hoffe, Sie können sich produktiv auf die nächste Klasse vorbereiten, das Tafel-Skript befolgen und ich garantiere die Genehmigung am Ende des Semesters. ( Espero que vocês possam se preparar produtivamente para a próxima aula, sigam o roteiro do quadro-negro e garanto a aprovação no final do semestre.)
Mordo a ponta da minha língua, notando que mais uma vez eu fiquei perdido e não escutei nada do que ela falou. Isso não acontece com tanta frequência, normalmente eu sei evitar de pensar em coisas aleatórias quando estou em uma aula importante para o meu currículo escolar mas as vezes eu acabo fraquejando. O som estridente do sinal me faz levantar com pressa e agarrar minha jaqueta e a mochila, sabendo que se não sair o mais depressa possível serei questionado sobre o motivo do meu atraso.
- senhor Grayson, posso perguntar uma coisa ?
Puta merda.
Me viro, fazendo o máximo para disfarçar a cara de poucos amigos por ela ter notado a minha tentativa de fuga.
- claro.
Coço levemente a bochecha esquerda, não me sentindo confortável em ficar a sós com a senhorita Fisher.
- quer me contar o motivo do seu atraso ? - ela molha os lábios recheados de batom vermelho, algo bem desnecessário para a situação.
Bem, eu me atrasei por ter ficado quase dez minutos encarando a garota que me faz perder toda a minha sanidade.
- eu tive um probleminha com o meu carro, mas eu cheguei aqui a tempo.
- dez minutos não fazem diferença para você ? Eu poderia ter passado um conteúdo importante.
E mais uma vez ela se aproxima, ficando mais perto do que eu gostaria. O perfume forte e doce incomodando meu nariz, mas não como a proximidade com toda essa maquiagem.
- o corredor ainda estava cheio, então não é só para mim que dez minutos não faz diferença.
Os olhos dela ficam um pouco cerrados, provavelmente ela não esperava uma resposta grosseira da minha parte. Desculpe senhorita Fisher, mas não posso deixar que estrague a minha manhã agora tentar garantir uma transa no final do dia.
- eu deveria te deixar de castigo, acho que isso o faria pensar melhor sobre dez minutos da minha aula perdidos e por ter sido grosseiro.
- acha mesmo que eu ficaria de castigo por causa de um atraso idiota ? Seria uma perca de tempo, mais da sua parte do que da minha. - ela parece estar furiosa, o rosto com uma leve coloração avermelhada.
- está indo contra a minha autoridade de professora ? - seu tom de voz não se eleva, mas fica um pouco mais mandão.
Sério que isso está acontecendo ?
- saiba que eu posso ser muito boa com aqueles que escolhem fazer muito mais do que uma prova ou atividade.
- sinto muito senhorita Fisher, mas eu tenho que ir. Tenha um bom dia.
Finjo um sorriso e saio da sala o mais depressa possível, temendo que aquela louca pulasse em cima de mim a qualquer momento. Balanço a cabeça em negativa enquanto sigo o caminho da biblioteca, não reparando ao menos em quem está na minha frente. Sinto minhas sobrancelhas se erguerem, a dúvida e espanto do que realmente acabou de acontecer.
Entro na biblioteca, caminhando até um dos últimos corredores e me sentando na mesa do canto. Abro a mochila, pegando um dos cadernos e rabiscando qualquer coisa na última folha.
- não achei que encontraria você aqui Andrew. - ergo a cabeça, estendendo a mão esquerda para cumprimentar Brandon.
- e o que você está fazendo aqui ?
- vim pegar um livro de biologia, tenho prova amanhã no segundo período. - ele se senta na minha frente, os olhos curiosos. - como anda na empresa ?
- está indo bem, só preciso ficar mais atento com algumas coisas.
Como pegadinhas do meu pai.
- legal cara, e aí, alguma novidade no caso indefinido com a Mia ?
- eu vou tentar falar com ela na festa, talvez tentar descobrir o que a impede de ficar comigo de vez.

E eu vou conseguir que ela fale.

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