14- Sonho

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Eu estava só em um bosque estranho, tudo se resumia a um breu intimidador. Os galhos das muitas arvores me golpeavam como braços agressores sempre que tentava me mover, a temperatura estava abaixo de zero, sentia meus ossos rígidos como aço, flocos gelados acertavam impiedosamente meu rosto, o vento zumbia a minha volta e arremessava os flocos com tanta força que eu sentia que em breve minha pele começaria a se desprender do meu rosto.

SOCORRO!!!

Tentava gritar, mas minha garganta estava inchada por um medo febril, apesar de usar todas minhas forças para emitir algum som as palavras não tocavam meus lábios. Comecei a chorar, as lágrimas desceram como ácido no meu rosto, estavam abominavelmente quentes em contraste com o resto do meu corpo.

Deixei-me cair de joelhos no chão, uma dor latejante começou a crescer em meu corpo.

ESTOU SÓ, NÃO HÁ NINGUÉM POR MIM. SOCORRO. SOCORRO. SOCORRO.

De repente uma voz doce e familiar começou a clamar meu nome.

_Crystal, Crystal, Crystal.

Eu tentava gritar "ESTOU AQUI! Mas minha garganta se recusava a responder, não!

A voz começou a se afastar, tombei de lado no chão, me abracei como uma garotinha abraça sua mãe para ser salvar do Bicho Papão. Uma nova voz começou a se formar, mas dessa vez dentro da minha cabeça.

_Crystal você pode vencer isso! _ sua dona era uma mulher, de voz doce e com um efeito calmante.

NÃO, SOU FRACA!

_ É forte! Acredite.

PRECISO DE ALGUÉM PARA ME AJUDAR.

_Não, há certas batalhas que temos que travar sós.

A voz em minha cabeça sessou, e eu ainda ansiava por ela, precisava de algum conforto.

_Crystal. _a primeira voz, a familiar voltou a me chamar.

Queria correr até ela, mas eu não encontrava forças, estava absorta em meu medo.

_Acredite em você. _A voz feminina voltou a se manifestar em minha mente.

_Crystal. _a primeira voz voltou a me chamar, mas desta vez estava mais distante.

De repente meu medo maior não era o escuro, as árvores a me acertar ou a neve ou seu mensageiro vento. Meu maior medo era de ficar ali sozinha. Me levantei lutando contra a dor que crescia em meus ossos, sabia que se fosse devagar logo mudaria de ideia e me entregaria ao medo deixando que ele me consumisse, portanto eu corri o mais rápido que pude no meio da floresta. As árvores me golpeavam, a neve o vento e o frio me torturavam, mas a única coisa que eu conseguia era correr, correr em direção a voz.

De súbito eu me encontrei não mais em uma floresta sombria, adentrei em uma doce campina alegrada por pássaros e flores. Tudo era de um verde esmeralda lindo, apenas as flores de muitas cores quebravam o padrão de verde.

_Vê, basta lutar e acabamos deixando as dificuldades para trás. _a mulher voltou a balbuciar em minha mente.

As palavras da mulher dessa vez não demonstravam preocupação, havia apenas orgulho nelas. Me senti muito feliz com isso, me abaixei para colher uma linda flor vermelha do chão e quando levantei minha visão vi algo que me deixou ainda mais feliz. Tyler estava na minha frente, sua calça, blusa e sapato eram de um branco puro, seus olhos verdes jade conversavam com o verde esmeralda da vegetação, eu andei em direção a ele, de presente ganhei um sorriso branco e encantador. Olhei para baixo encabulada, neste momento me dei conta que também usava branco, era um vestido solto no corpo, possuía delicadas alcinhas de renda.

Estava maravilhada com tudo, parecia ter vencido o temor que sentia segundos atrás, mas quando levantei minha visão novamente pude ver uma densa sombra querendo invadir a campina, o terror passado voltou a vir à tona. Corri em direção ao Tyler, ele me abraçou em um gesto gentil.

_Me ajude! _exclamei, e para minha surpresa as palavras dessa vez tocaram facilmente meus lábios.

Ele me avaliou por um momento.

_Sempre. _seu olhar era verdadeiro.

Me senti tão protegida naquele instante que o mais expansivo sorriso inundou meu rosto.

_Mas para que eu te ajude você também precisa querer se ajudar. _sua voz era como uma cantiga de suaves sinos ao vento.

O sorriso se foi. Como eu haveria de não querer ajudar a mim mesma?

_Sim. _foi um sim fraco e confuso.

Tyler pareceu animado e satisfeito com minha aceitação, me deu um sorriso tímido, e como um menino que mostra pela primeira vez o seu brinquedo mais sublime ele retirou algo enrolado em seda branca do seu bolso. Quando ele desenrolou a seda do objeto eu fiquei meio espantada, se tratava de uma adaga em reluzente prata.

_Para que isso? _estreitei os olhos curiosa.

Ele não me respondeu com palavras. Com bastante calma ele segurou o cabo da adaga, virou sua ponta para mim, aos poucos começou a aproximar a adaga da minha barriga. Me assustei, dei um passo para trás com os olhos arregalados. Tyler agarrou minha mão com sua mão livre, deu um aperto reconfortante nela, fixou seus olhos nos meus, e senti que deveria confiar nele. Ele soltou minha mão e começou a pressionar a adaga em minha barriga até um fino filete de sangue escorrer timidamente do local. Ele parou de pressionar a adaga e gentilmente a entregou a mim.

_Agora é sua vez. _disse sério.

_O que quer que eu faça? _perguntei com a voz entrecortada.

_Ás vezes para começar uma nova vida temos que pôr fim na anterior. _suas palavras foram claras, seu rosto uma máscara de seriedade.

Percebi o que queria que eu fizesse.

_Faça isso por mim! _ ao mesmo tempo que horrorizada eu estava conformada, confiava nele.

_É um passo que ninguém pode dar para você. _dizendo isso se afastou alguns passos.

_Mas tenho medo.

_A questão não é não ter medo mas a sua capacidade de o superar. _me lançou um sorriso triste.

Posicionei a adaga contra minha barriga, estava com medo, mas quer saber? Tentaria o vencer. Não esperei muito tempo, pois quanto mais esperamos para tomar uma decisão mais difícil fica para toma-la. Respirei fundo, levantei a adaga no alto, e de uma vez só abaixei a adaga com toda minha força. Ela deslizou com facilidade em minha carne, se cravando fundo em minha barriga. O antes fino filete de sangue se transformou em uma quente torrente. Caí de joelhos com a adaga ainda cravada na minha carne, comecei a soluçar, cada soluço vinha encharcado de sangue. Uma dor crua logo se manifestou, me precipitei para um lado, mas antes de cair no chão com o corpo todo mão fortes me seguraram.

Tyler me embalava no colo como a uma criança. O vermelho do meu sangue corrompia a brancura das nossas roupas.

_Estarei sempre aqui. _disse ao meu ouvido.

Arrancou a adaga da minha barriga, isso me fez a começar a convulsionar, o sangue em minha boca se tornou mais abundante.

Naquele momento de fragilidade deveria estar com medo, a morte se aproximava, mas não tinha medo, nunca antes havia me sentido tão forte. A medida que meu sangue tocava a relva a escuridão retrocedia, momentos antes do fim ainda pude ouvir a voz do Tyler.

_Para sempre.

Tudo havia acabado, mas não veio a escuridão, pelo contrário, diante de mim se apresentou a luz mais intensa que qualquer luz que algum dia pensei que poderia existir.

A Ordem Da LuaOnde as histórias ganham vida. Descobre agora