• Dezessete

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Sol

Às vezes eu me pergunto o que o Ruggero pensaria se encontrasse uma outra versão de mim dentro de uma sacola de lixo na mala do meu carro.
Peruca, óculos, saltos... Será que ele amaria a Ivana desengonçada como ama a dançarina sexy e a advogada obstinada?
Bom, minhas suspeitas são de que ele ficaria assustado com aquelas mechas de cabelo vermelho saltando pelas brechas da sacola, como se um corpo estivesse comprimido ali dentro.

Dou um longo suspiro e ponho a delicada casa rosa ao lado da carcaça da Ivana. É como se o meu passado e o meu presente estivessem divergindo enquanto sacolejam na minha viagem até a clínica onde a Elisa está.

É o dia de me despedir dela.

— Mas como eu posso me despedir de tudo se você fica ressurgindo, seu italiano idiota?! — Murmuro segurando a porta da mala, olhando fixamente para a casinha.

Ele fez uma réplica exata do nosso refúgio. É igual. Deus, é idêntica! Até parece que voltamos no tempo e ele conseguiu salvar a casa antes que o fogo a consumisse.

Só eu sei o quanto me odiei por ter feito aquilo. Contudo, não havia volta. Eu queria machucá-lo como ele me machucou. E talvez no meio dessa merda toda eu é quem tenha saído mais ferida, porém, o que estava feito, estava feito. Sem chances de conserto.

— Que bom que eu te alcancei!

Viro o rosto, fitando Davi por cima do ombro.

— O que você quer?

— Você esqueceu o celular em cima da mesa.

Ele estende o aparelho para mim, então eu me viro e o pego, enfiando-o no bolso do meu sobretudo vermelho.

— Obrigada. E se era só isso... eu preciso ir.

— Espera. Eu acho que...

— Davi, eu tenho que ir até a clínica. A hora é marcada, então, se quiser brigar de novo é melhor esperar até que eu esteja desocupada.

— Sol, por favor, eu não quero discutir. Eu nunca nem gostei dessas coisas de briga, você sabe. Portanto, eu peço que me olhe nos olhos e pare de me tratar com tanta indiferença, porque eu não estou contra você.

Cruzo os braços.

— Não vale a pena entrar nesse mérito agora.

— Honestamente, eu acredito que precisamos nos acertar, porque a Luna percebeu que o clima estava diferente agora no café da manhã. Ela é uma criança muito esperta e não devemos magoá-la.

Desvio o olhar. Não sei exatamente porquê, mas procuro pelo carro do Ruggero, porém ele já foi. Provavelmente agora ele cumpra o que disse sobre se afastar, sem cobranças. Talvez... não sei se devo acreditar — ou se consigo.

— E o que você sugere, Davi?

— Em primeiro lugar? Que você não fique agindo como se eu fosse o seu inimigo. Poxa, Sol, eu amo você. Nós dois sabemos que eu amo e demonstro isso dia após dia.

O ar sai de mim de modo entrecortado por causa do frio que me congela de dentro para fora.
Sem contar que esse assunto sempre me deixa desconfortável.

Falar sobre sentimentos se tornou complicado para mim, e Davi sabe disso.

— Não sei se sou digna desse tanto de amor.

— Você é a pessoa mais digna de amor que eu conheço. — Rebate sem pestanejar, como sempre. — E eu vou repetir todos os dias se isso te fizer entender.

Fuego En La Sangre - Livro 2Where stories live. Discover now