• Vinte e Seis

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Ruggero

Dizem que quando você está à beira da morte um filme se passa diante dos seus olhos e toda a sua vida começa a fazer algum tipo de sentido.
Romantizam a morte como se ela fosse um anjo que te guia pela mão até um ponto infinito do universo onde você irá se resguardar e esperar pelo momento em que terá paz.

Eu sempre pensei na morte. Desde criança, para ser sincero.
Quando os meus pais morreram, quando o Luigi me molestou, quando a Elisa foi abusada, quando eu planejei a minha vingança e quando perdi a minha esposa por causa das mentiras. Pensei, inclusive, quando soube da morte da minha filha.
Contudo, neste instante, a morte parece quase palpável e pela primeira vez não quero pensar sobre ela. Não a quero. Não estou pronto.

Por isso, teimando, seguro o volante do meu carro e deixo o celular cair no chão do veículo. Ouço-o tocar diversas vezes, mas não posso atender.
Preciso ser mais rápido.

Meu pé afunda no acelerador e meus olhos se fixam na estrada lisa. Uma parcela generosa de chuva está caindo e a neve começa a invadir a estrada, obstruindo alguns pontos.

Carros passam zunindo por mim e os sinais apagam. Parece estar havendo uma pane elétrica na cidade.
As buzinadas correm soltas.

Olho pelo retrovisor e constato que continuo sendo seguido. Eles não fazem questão de disfarçar e sempre que podem aceleram mais, obrigando-me a girar o volante e derrapar, fugindo.

A cada quilômetro que dirijo constato que estou mais perto de Turim. As árvores sinalizam o caminho, mas também tornam a estrada mais estreita.

Forço as minhas mãos a pararem de tremer.
Não posso ficar nervoso. Não posso fraquejar. Não posso e não vou ser o homem que desiste assim.

— Eu não vou morrer agora! — esbravejo. — Eu não vou!

Entretanto, como que para provar que não sou o responsável pelo meu destino, o pneu de trás estoura. Demoro um pouco para perceber que não foi nada por acaso, mas sim graças a um disparo de arma de fogo.

Mais e mais tiros se seguem.

O vidro de trás se estilhaça em milhares de pedaços, então eu me curvo, protegendo o rosto.

Outro tiro... Outro... Outro... Outro...

Não sinto absolutamente nada. Não consigo nem mensurar o tamanho da sensação de vazio que me abraça quando perco o controle e vejo o meu carro ir diretamente contra uma árvore, batendo nela com tanta força que o air-bag inflam contra o meu rosto, machucando o meu nariz.

Sou atirado brutalmente contra o volante, mas o cinto de segurança me puxa para trás.

Sinto um gosto forte de sangue descer pela minha garganta.

De resto, percebo apenas um barulho tão alto e tão intenso que titubeio. Quero levantar e sair, mas minhas pernas estão presas nas ferragens. Ao menos é essa a conclusão que chego, já que elas estão pesadas e doem.

Fumaça cobre o ar assim como a chuva.

Por um mísero segundo tenho vontade de rir. Rir do maldito tumor que apesar de ser terminal, é a última coisa que pode me matar agora.

— Acho que está vivo! — falam.

Zum... Zum... Zum... Os carros passam. Zum... Zum... Zum... Mais carros. Parecem borrões. Zum... Zum... Zum... Há sangue escorrendo do meu nariz e cobrindo os meus lábios. Zum... Zum... Zum... Escuto se aproximarem.

— Isso foi só um aviso, entendeu? — ralham, empurrando contra a minha bochecha o cano de uma arma. — O chefe não vai te perdoar por aquele soco. E ele te quer longe da garota dele. Ouviu? É o último aviso que vamos dar.

Fuego En La Sangre - Livro 2Onde histórias criam vida. Descubra agora