33| Energúmeno de meia tigela

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Quando alguém afirma estar com uma pedrada, a primeira coisa que nos vem à cabeça é que essa pessoa andou a consumir drogas, o que significa, muito provavelmente, andar nas nuvens a passear com unicórnios voadores. Ninguém vai pensar no sentido literal da coisa. No entanto, no meu caso, tudo indicava para que eu estivesse com uma grande pedrada, e, como eu sou uma grande inventora de novos significados, no meu vocabulário avançado, pedrada significava ter levado com uma pedra em cima – o que não é assim tão original, para que conste. Era assim que me sentia. Sentia que um enorme peso tinha caído sobre os meus ombros, que dores horríveis tinham consumido os meus músculos e que espasmos incessantes haviam percorrido os meus lábios dormentes. Só quando abri os olhos e olhei à minha volta, comecei a refletir acerca do verdadeiro significado de pedrada, coisa que não correu lá muito bem. A minha cabeça ameaçava explodir e se eu não me obrigasse a fechar os olhos de novo, era bem provável que a Cloezinha-fugitiva-das-pedras ocupasse um lugar no céu, junto dos melhores compositores de música clássica. Mozart!

"Bom dia.", uma vozinha rouca sussurrou no meu ouvido. Imediatamente, senti a minha pulsação aumentar drasticamente, como o alerta vermelho para o erro daquela situação. Um arrepio percorreu os meus braços descobertos, e, após alguns segundos de silêncio, senti a superfície onde me encontrava deitada abanar ligeiramente. "Não finjas que estás a dormir. Eu já te apanhei."

Com um suspiro voltei a abrir os olhos, desta vez para fitar Michael. O seu cabelo encontrava-se desgrenhado, no entanto, a avaliar pelas suas roupas engomadas, não me parecia que ele tivesse estado a dormir comigo. Contudo, ao notar que o pijama que havia usado no dia anterior desaparecera do meu corpo e que o meu cabelo crespo se encontrava escovado e macio, arregalei os olhos e escondi o rosto atrás do édredon da cama de Mike. Por mais esforços que fizesse para me lembrar do que tinha acontecido aquando da minha chegada a casa, não conseguia recordar um único segundo.

"O que é que aconteceu!?", gritei, frustrada com a negridão na minha cabeça. Era estranho não conseguir dizer o que aconteceu, porém, a sensação de amnésia que percorria o meu subconsciente era curiosamente agradável.

"Como assim?", Michael sentou-se na ponta da cama, preocupado. Ele puxou a minha mão e acariciou-a com delicadeza, olhando-me com interrogação.

"Como é que eu vim aqui parar?", esclareci, mais branda. Michael soltou um adorável riso, e eu, chateada, voltei a esconder a minha mão debaixo das cobertas.

"Trouxe-te eu, ontem à noite. Não te lembras?" O riso adorável foi substituído por um sorriso pretensioso. O moreno franziu o sobrolho e abanou a cabeça, levantando-se novamente da cama. "Quando chegámos tu estavas a dormir, já passavam das sete.", explicou. "A tua mãe tentou conversar contigo mas tu só murmuravas coisas estranhas. Eu acabei por te trazer para o quarto mas havia imensa poeira na tua roupa, por isso, enfiei-te no chuveiro."

"TU VISTE-ME NUA!?", a questão fugiu dos meus lábios, tão rápido que Michael quase saltou devido ao susto. Os meus olhos pareciam estar quase a fugir das órbitas, contudo, a minha reação não era tão descabida quanto isso. Michael revirou os olhos, pouco surpreendido.

"Foi com a maior das inocências, juro.", ele juntou as mãos, proferindo tais vocábulos com solenidade. "Eu tinha de te ajudar, Cloe."

"Pois, claro. Que conveniente.", bufei, descontente com a situação. Era demasiado vergonhoso e eu não queria, sequer, imaginar as coisas que Michael me poderia ter feito. Ou fez?

"Desculpa." Depois de soltar um breve suspiro, Michael caminhou até à porta do quarto falso e fitou-me com um ar severo. "Agora acho que é melhor ires lá abaixo. A tua mãe está à espera com uma pessoa."

Social Casualty ಌ m.cWhere stories live. Discover now