42| A melhor mãe do mundo

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O dia de hoje tinha sido excecionalmente quente e húmido, o que me deixava rabugenta e com vontade de destruir todos aqueles maluquinhos que se pavoneiam pelas ruas de casacos até aos joelhos ou com roupas pretas e pesadas, que mais os faz parecer velhas de luto. Suspeitava, porém, que estes ares aquecidos e tropicais se devessem ao aquecimento global, esse tão grande problema que afeta todo um planeta e toda uma pessoa, que neste caso ces't moi. Preferia passar uma semana no polo norte, acompanhada de uns adoráveis pinguins (e provavelmente de Luke), do que viver neste país tão tipicamente quente, e, verdade seja dita, tropical. No caminho para casa, vários jovens passaram por nós, alguns em grupo, outros a passear o cão, mas grosso modo, todos eles em tronco nu. Que mais poderá uma bela criatura de cabelo roxo querer ver? Um pinguim não é de certeza. E é portanto satisfatória esta vida miserável que eu levo na Austrália, onde tudo é mais quente e carnal.

Saltitei até ao exterior do carro quando este parou à frente da porta da garagem, onde tão amavelmente Richard o havia deixado, a pedido de Michael. Este, que parecia ainda não ter-se recomposto do susto dos CD's vendidos, cambaleava como um bêbado e ria-se como um maluco, insistindo em agarrar no meu corpo e servir-se dele como pilar. Eu salvava-o de uma queda e ele torturava-me ao calor do seu corpo.

"Eu já disse para estares quieto!", resmunguei pela quinquagésima vez, enquanto seguíamos atrás de Rich, que, já com as chaves na mão, se preparava para nos abrir a porta. Não sabia bem como raio tinha ele acesso àquelas chaves, visto que nem morava ali, e nem tão pouco devia ser autorizado a frequentar aquela habitação, mas a verdade é que o homem estava ali, pronto para nos abrir a porta. Karen provavelmente tivera pena dele, porque, conhecendo Elsa como conhecendo, não me parece que tenha sido ela a meter uma cunha ao ex-marido.

"Mas tu cheiras bem!", Michael voltou a pegar numa mecha do meu cabelo lilás-arroxeado e a cheirá-lo, fechando os olhos enquanto o fazia. Aquilo era sinistro, contudo, Mike já o havia feito umas seis vezes desde há uns minutos para cá. Ele parecia drogado... ou pelo menos a fingir que estava.

"Isso não tem piada!", bufei, empurrando-o contra os arbustos. Foi por um triz que ele não caiu, conseguindo agarrar-se ao braço do meu progenitor antes do espetáculo de comédia que estava prestes a proporcionar. "Chato d'um raio!"

"Parem lá com isso, crianças.", o mais velho murmurou, tentando rodar a chave, que parecia ter ficado presa na fechadura. Ele gemeu como um canguru a dar à luz e puxou o seu cabelo preto para trás, ameaçando partir aquilo tudo caso a porta não se abrisse nos próximos cinco segundos. "CARALHOS ME FODAM! MAS SERÁ QUE ESTA MERDA NÃO QUER COLABORAR?!"

"Modera a linguagem, seu atrasado.", revirei os olhos. "Estás perante duas crianças inocentes e isso não. é. um. bom. exemplo.", suspirei, acabando a frase de forma pausada e arrogante. Rich controlou-se para não me lançar o dedo do meio... podia vê-lo no seu rosto.

"Deixe-me tentar.", Michael ofereceu-se, amoroso como sempre no que tocava a Richard. Ele debruçou-se sobre o homem de meia-idade e afastou-o da porta, metendo mãos à obra. De um só gesto, Michael abriu a porta, deixando Richard a observá-lo de boca aberta.

"Esta juventude...", ele murmurou, passando por nós a correr. Ele cheirava a tabaco, o que era estranho visto que eu não tinha conhecimento que ele fumasse, e deixou aquele aroma a pairar no ar. Eu não fiquei admirada, como é óbvio, mas foi nojento.

"O teu pai...", Michael suspirou, com um sorriso aparvalhado nos lábios. Ele abanou graciosamente a cabeça e voltou a suspirar, como um adolescente apaixonado. "Bem, vamos?"

"Pois, como queiras.", abanei a cabeça, adentrado naquela casa quase vazia. Quando passei pela sala, encontrei o homem das cavernas sentado no sofá, com as suas botas imundas em cima da mesa de centro. Ele parecia divertir-se a mudar de canal, mas não disse nada. "Tu não devias estar aqui.", murmurei, aproximando-me.

Social Casualty ಌ m.cWhere stories live. Discover now