Chapter IX

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Episode: Dancing with the devil

Na manhã seguinte, Mew Suppasit se encontrava dentro do seu carro com uma sacola de compras – contendo comida e algumas lâmpadas – e uma escada enfiada no seu banco traseiro.

Ele não pensara muito ao tomar aquela decisão na primeira hora do dia após acordar. Responsabilizando nada mais que a parte sensível do seu cérebro e a educação excelente que seus pais lhe ofereceram.

Quando ele sabia que podia ajudar de alguma maneira, mesmo que de forma mínima, não ignorava e o fazia.

Durante a noite, atormentado pelos próprios pesadelos, não conseguiu deixar de pensar na cena do outro professor enfrentando seus próprios demônios. Ele parecia ferido, frágil e diferente da imagem que pintava para os outros. Talvez também houvesse certa identificação entres eles, porque por trás daquela fachada confiante e arrogante havia mais do que Gulf permitia mostrar, e Mew podia se identificar com isso facilmente.

Então, lá estava ele, pronto para demonstrar um gesto de gentileza. Afinal, pessoas quebradas necessitavam de pouco disso algumas vezes, mesmo que nunca pedissem.

Ademais, não pretendia fazer daquilo algo grande. Não estava tentando se conectar ou conhecer o professor Kanawut profundamente. Não era nada além da sua consciência se negando a deixar-lo ignorar o rapaz.

Parando em frente a casa do professor e descendo do carro, logo buscou a chave que havia deixado embaixo do tapete ao sair na noite anterior. Mew carregou primeiro a escada para dentro, voltando depois para pegar as sacolas de compras.

Por um breve segundo temeu estar sendo invasivo e grosseiro ao ousar entrar na casa do rapaz sem permissão, mas colocou aquela culpa no fundo de sua mente e começou imediatamente a instalação das lâmpadas. Somente na cozinha e na sala, sem se aventurar em outro cômodos, limitando-se a não extrapolar ainda mais suas atitudes.

Contudo, após uma breve discussão com sua consciência, arriscou também subir no quarto de Gulf. Fitando ligeiramente o outro dormir profundamente.

Sem mais demora, conseguiu silenciosamente também instalar uma lâmpada lá. Kanawut não acordou em nenhum momento, nem sequer se moveu, então Mew pegou o bilhete que havia deixado no dia anterior e escreveu outro.

Fechando, então, a porta atrás de si ao sair, deixando o rapaz dormir confortavelmente.

Feito isso, ele se foi, decidido a passar todo o final de semana enfiado dentro do quarto assistindo seu pirata feito de borracha favorito. – Não que ele conhecesse outro.

***

Horas mais tarde, Gulf Kanawut abriu os olhos e gemeu de dor, sua cabeça latejando copiosasamente e parecendo carregar uma tonelada em peso. Ele costumava se gabar pela boa tolerância ao álcool, mas admitia que ultimamente estava exagerando na bebida. Ou, talvez, apenas tivesse perdido toda sua resistência, afinal passara quase quatro anos sem ingerir nem uma gota de bebida alcoólica.

Será que o tempo foi suficiente para fazer-lo perder toda sua tolerância? Ele esperava que não.

Sentindo suas pálpebras pesarem e sua iris ficar sensível a luz, Gulf retornou a fechar o olhos com força. Sua cabeça estava o matando.

Ele se perguntou brevemente o quão fodido era estar novamente naquela dança perigosa com o diabo. Em sua defesa, sentia que precisava beber, precisava disso para manter sua sanidade e não se afogar em si mesmo.

Gulf deu um suspiro profundo e lentamente voltou a abrir os olhos. Franzindo a testa ao ver que agora havia uma lâmpada no teto de seu quarto.

Que porra? – sussurrou com a voz rouca, sua expressão imersa em confusão.

O rapaz sentou-se no colchão e, olhando ao redor, achou uma garrafa d'água e comprimidos em cima da sua cômoda, acompanhados de um bilhete. A caligrafia elegante e legível, que dizia:

"Desculpe a audácia, mas me atrevi a instalar lâmpadas em sua casa. Na cozinha, sala e seu quarto.

Escuridão não é um lugar confortável de se estar.

Tome os remédios que deixei na cômoda, pois irá ajudar com a ressaca que provavelmente terá ao acordar. Também deixei algo na cozinha para você comer. Se cuide.

Ass: Mew Suppasit Jongcheveevat."

Gulf ficou estático por o que pensou ser horas, mas sabendo logicamente que não havia passado mais do que um, ou dois, minutos. Relendo o bilhete com uma expressão apagada, a dor de cabeça se tornando nada mais que um zumbindo de fundo.

Aquilo não estava certo.

Ele levantou da cama um pouco abruptamente, mas sua cabeça zumbiu, trazendo-o uma vertigem.

Gulf controlou a respiração e andou de forma cambaleante e desnorteada, talvez pela ressaca, talvez por causa do zumbindo no fundo da sua mente.

Ele desceu as escadas, seguindo para a cozinha em passos lentos e pesados.
Encontrou as compras, a qual Mew havia mencionado no bilhete, em cima do balcão. E começou a vasculhar freneticamente a sacola, vendo algumas frutas, pães e um suco de laranja.

Ele encarou aquelas comidas com olhos entorpecidos. Algo dentro dele ardendo como o inferno.

Gulf não queria nada daquilo, não queria piedade, pena ou qualquer merda bondosa.

E por isso, com o nariz franzido em desgosto, pegou as sacolas, que pareciam queimar sua derme, e as jogou no lixo com um estrondo. Aquele sim era um lugar mais apropriado para elas.

Ele fitou as sacolas jogadas no lixo e balançou a cabeça, soltando um chiado agoniante, e foi até o armário de sua cozinha – que estava completamente vazio de alimentos – e pegou uma garrafa de vodca de qualidade duvidosa.

Gulf meio andou, meio cambaleou, para a sala com a sua bebida em mãos, fechando as cortinas e deixando sua nova lâmpada desligada. Ainda entrava um pouco de luz, mas estava escuro o suficiente.

Ele bebeu um longo gole direto do gargalo, sentindo o líquido queimar suas entranhas, e encarou a lâmpada recém colocada em sua sala. O objeto cilíndrico e patético que Mew não deveria ter perdido tempo colocando ali.

Talvez Gulf o quebrasse mais tarde, mas preferiu ficar jogado no sofá por um tempo, encarando continuamente aquela lâmpada apagada.

Ele riu, lembrando-se do bilhete de Mew. O músico não sabia da missa a metade.

Escuro é o meu lugar, Mew – ele sussurrou para a lâmpada com a voz distante e perdida – você vai descobrir isso eventualmente – disse com uma risada depreciativa e ingerindo mais álcool.

Sim, pensou consigo mesmo ao sentir o líquido arranhar sua garganta, álcool era exatamente o que ele precisava. Aquele líquido forte seria o suficiente para afogar tudo que fazia de Gulf um ser humano.

The Blue Of Your Voice • Fanfic MewGulfWo Geschichten leben. Entdecke jetzt