Chapter LXIX

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Episode: apathy

As vezes, quando desviava-se da realidade para se perder em seus próprios devaneios internos, Gulf questionava-se vagamente se o desespero e as lágrimas constantes eram melhores do que a sensação vazia que, eventualmente, parecia tomar conta de todo seu interior.

Era confuso, na maioria das vezes, pensar que aquela sensação fleumática, como uma caverna escura que ecoava morbidamente sons de pequenas gotas de água caindo em chão de pedra, era comumente descrita como apatia. E, de fato, se analisasse superficialmente, talvez fosse exatamente a essa conclusão que chegaria.

Kanawut sentia-se como um moribundo na maior parte do tempo, andando por aí sem salvação ou aspirações. Não estava triste, nem alegre, não estava com raiva, nem frustrado, não estava mal, menos ainda bem. Kanawut não estava.

Não sentia, não respirava, não vivia. Ele era uma casca vazia e fragilizada, sem nada bom ou ruim para carregar, apenas um passado sujo e pesado que lhe doía as entranhas.

Mas, qualquer um que lhe olhasse mais de perto, que decifrasse sua recém incapacidade de sentir, logo descobriria todo o vazamento que derramava-se pelas bordas. Seu nada era um reflexo de tudo. Sua apatia e indiferença era apenas uma forma de abrandar o sangue que jorrava em seu peito, uma forma de esconder a ferida aberta que lhe tirava a vida aos poucos, lentamente o levando ao último suspiro.

Kanawut já não chorava. Não mais. Não na maioria do tempo. Não na maioria dos dias. Nem mesmo quando queria. Não deixava que as lágrimas escorressem em seu rosto cálido, não se permitindo achar que tinha o direito de gritar aquela dor para fora de seus pulmões.

Era como um tic tac de uma bomba, inofensivo a princípio, mas que seguiria com uma explosão ensurdecedora a qualquer instante.

No entanto, era inegável que, as vezes, quando a quietude de estar completamente sozinho entre as paredes brancas de sua casa, seu peito era esmagado por concretos que o fazia sangrar pelas beiradas e quase ceder a vontade de arquejar com as lamentações que estavam presas em sua garganta.

Sua dor, embora anestesiada, ainda lhe tirava todo o ar de seus pulmões, a força do seu corpo e a sensação de estar vivo.

No entanto, acreditava que merecia isso.

Seu pesar era consequência de suas ações e isso era como se houvesse um espelho que constantemente estivesse refletindo suas mentiras, seus erros, suas decisões patéticas, lembrando-o que fora fraco em agir de forma correta

Perdido nessa espiral de pensamentos conturbados, o jovem professor levantou a cabeça, abraçando o próprio corpo com os braços trêmulos, para deixar que a água gelada do chuveiro caísse por todos os seus membros. Um segundo depois, porém, estendeu o braço arrepiado e fechou o registro, passando as mãos no rosto para afastar a água, e abriu os olhos com pesar.

Mais um dia.

Seus pés ensopados molharam o tapete do banheiro, mas ele estava imerso demais em sua apatia para se preocupar com a bagunça que causava. Kanawut apenas penteou os cabelos com as pontas dos dedos e enrolou uma toalha na cintura, saindo para o quarto em seu automático.

Não havia vida em seus olhos, não havia vida na forma que se movia pelo cômodo.

Kanawut era uma cápsula vazia, condenado a carregar um peso que seu corpo frágil não deveria ser capaz de suportar.
Mas que ele o faria, porque, ao menos, suas promessas não eram vazias.

Ele ficaria bem. Havia prometido que ficaria. Mesmo que precisasse fingir até que a mentira soasse como verdade.

Com uma respiração fraca, ele parou no meio do quarto, observando a tigela de comida quase intocada no perímetro da janela.

The Blue Of Your Voice • Fanfic MewGulfWhere stories live. Discover now