CLXV

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— Ela é um mulherão da porra, não é?

Eu nem sei que horas são, estou vendo-a de longe e o cara do bar está me olhando com aquele ar de "eu já vi muito isso por aqui". Eu pedi tequila, ele pôs na mesa e antes de virar eu disse:
— Ela é um mulherão da porra, não é?
Ele balançou a cabeça, riu e foi atender outra pessoa, a pior coisa, porque eu fiquei só com meus devaneios. Lembrei de como ela não se sentia segura em usar um decote tão belo quanto o que está agora e muito menos esse batom vermelho com toque aveludado. Eu respirei fundo. Antes eu estava ao lado dela, sentindo o perfume e reclamando da demora pra se arrumar. Eu nunca pensei na hipótese da perda, ela parecia tão apaixonada por mim, que eu transpareci não me apaixonar mais. A maior farsa já sustentada por mim. Eu fiquei acomodado ao tê-la sempre no fim da tarde a hora que eu bem entendesse, ela sempre estaria com a minha camisa cinza e um sorriso radiante. Eu pensei em como ela adorava chocolate amargo e ainda assim eu evitava, a ponto de quase nunca comprar pra ela, porque nunca fui do tipo "meloso". Mas, cara, ela era a minha garota. Eu demorei pra ver, mas era. Demorei tanto que ao invés de fazê-la querer ficar mais, eu a fiz querer ir mais. Eu não deixei que ela voasse comigo, eu cortei as asas e a pus o que eu chamava de curativo e ela de corrente. Ela queria conhecer o mundo, mas eu queria ser o mundo dela. Do meu jeito egoísta e infantil. Eu recusava os seus convites pra sair, sentia ciúmes de cada olhada dos amigos que ela tinha. Mas não era nada demais, eles só sabiam mais do que eu o quão mulher ela era. Do tipo incrível, que dá vontade de apresentar pra família, pros amigos e até pro bispo. Do tipo que te chama pra um bar, cinema, casa, café o que for. Aquela que te olha com malícia e te excita com um simples dedilhar de unhas. Aquela que te encanta e fascina, mistura de sereia e rainha. Porque ela sabe o que quer, e, de tanto saber, não me quis.
Por isso, meu caro garçom, desce mais 3, que hoje eu vou beber, pra lembrar o que eu tentei esquecer, por mais de uma vez.

Transbordo, logo escrevo.Where stories live. Discover now