CXCI

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Poesia é foda.

A escrita é o grito de socorro da alma, é quando tudo que já não cabe, transborda. É lar pra quem não sente que tem casa. É casa pra quem sabe que tem lar. É o que queremos que seja. Escrever é por pra fora tudo que muitas vezes não se imagina sendo dito em voz alta, sendo exposto. Porque escrever é virar do avesso até as entranhas. É abrir a ferida e colocar álcool. Vai arder, mas a gente sabe que vai melhorar. É loucura de mente sã e sanidade dos loucos. Escrever poesia, então, é a verdadeira foda, que precisa de uns amassos antes que tudo se inicie. Um beijo seria a inspiração inicial. Precisa ser bom o suficiente para que se instigue o coração e a mente. Para que se deseje mais. Poesia é o que precisa de preliminares porque não se pode ser servida crua, é onde se inicia a nudez. Nudez de pele, alma, coração. Não se chega ao extremo sem uma boa preliminar, uma boa instigada. Um bom oral. Qual seria o oral da poesia? É o momento em que os versos começam a serem escritos sem rimar? Até que se encontre tom ou o tom nos encontre. Poesia é pensar em palavras melhores a cada releitura, cada pequena modificação que muda o todo, porque sempre pode melhorar. São beijos mais molhados, porque esse ainda não é o ponto. É toque suave ou nem tanto, porque ainda não - ou nunca - estará pronto. Um toque mais rápido, pra fazer gemer mais. Palavras mais escolhidas, pra causar o que se imagina. Poesia é arrepio do corpo e da alma quando atingimos o que queríamos. Uma palavra mais bonita, uma frase inesquecível, um verso inteiro. O ápice.

Mas eis aqui um impasse: o ápice de quem? Leitor ou escritor?

Poesia é a foda memorável, que serve de comparação para todas as outras, mesmo sabendo que comparar não é bom. Mas poxa, eu ainda posso ouvir os gemidos daquele dia. Para uma foda ser lembrada precisa ter doses certas de tudo aquilo que é necessário para ser levado ao extremo, a resposta do corpo ou da mente para o que foi lido/sentido. A preliminar de uma poesia é a sua releitura em interior, desnudamento de alma. Deixar do avesso e ainda assim escrever nas entrelinhas. O que eu escrevo agora? O que eu não escreveria agora? Responder perguntas e buscar rimas tornam-se dia a dia. Mas não uma rotina maçante, uma foda sem nada excitante, poesia é dar voz para a alma gozar.

E é por isso que eu escrevo, porque tudo que tenho, já não cabe. Na verdade, acho que nunca coube e eu sou poesia, eu transbordo. E, se Transbordo logo, escrevo. Sinto muito se sinto tudo. Sinto tudo, sinto muito. Tudo que tenho é mais que o máximo, não tem meio termo. As vezes eu me fodo, mas cabe a você tentar descobrir o sentido.

Transbordo, logo escrevo.Where stories live. Discover now