CLXXI

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Eu me servi de café, porque de amor eu já transbordo.

Hoje eu acordei mais cedo do que o de costume, percebi que esqueci minha janela aberta e vi o raio do sol entrar por ali. Estava tudo uma bagunça, já que ultimamente eu ligava pra qualquer coisa, menos com quantos pares de roupa eu podia cobrir o chão. Eu levantei e fui direto para o banheiro para sentir a água lavar e levar de mim tudo que estivesse ruim. Impurezas, sim. Eu estava cheia delas, não me reconhecia no espelho e passei a me perguntar constantemente o que eu estava fazendo. Respirei fundo e então, ao invés de focar em tudo que estava me deixando pesada, eu resolvi pensar no que era bom. Eu sorri ao reler prints de pessoas que eu só conhecia por um usuário, mas que me disseram que eu mudei a vida delas com algumas palavras. Eu me perguntei como era possível, se era real e se era sincero. A última pergunta não precisava ser feita, porque até músicas dedicaram a mim e eu sabia que quando se faz isso, inevitavelmente aquilo ganha significado novo. Por menor que seja a frase ou a melodia. Eu lembrei de ter dado a alguém no ônibus as moedas que havia separado pro meu sorvete. Eu lembrei de ter levantado, mesmo quando não estava em um assento preferencial e a moça com neném no colo disse que tudo bem. Lembrei do sorriso que recebi quando dei boa tarde ao motorista que aparentemente estava cansado demais para o serviço. Lembro de ter sido insultada e instigada a "retaliar". Mas também lembrei da minha mãe dizendo "A gente paga o mal com o bem" e tudo que consegui desejar foram coisas boas. Então, sorrindo eu me servi de café, porque de amor eu já transbordo. E a prova disso era o fato de saber que empatia não se trata só de pensar em se colocar no lugar do outro, se trata de fazer acontecer. Por fim, depois de esvaziar minha xícara e me servi mais uma, eu arrumei tudo o que precisava ser arrumado na casa e na minha cabeça. Afinal, é fácil exacerbar sentimentos ruins quando eles estão aqui, mas por algum motivo, é difícil exacerbar sentimentos bons que já passaram. Por sorte, eu aprendi que o passado é aquele professor de química que a gente detesta, mas sabe que precisa. Ou a gente aprende ou reprova. Eu quero passar.

Transbordo, logo escrevo.Onde as histórias ganham vida. Descobre agora