22: Data de validade

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( A capa tá melhorando)



Na mansão Towa estava tudo normal. Os irmãos Park discutiam em uma mesa do refeitório sobre quem ficaria encarregado da limpeza dos banheiros do segundo andar, na sala de tiro ao alvo Noham, o garoto novo de 19 anos e cabelos emaranhados, choramingava com seu tutor reclamando da dor que sentia por acidentalmente ter levado um tiro de raspão da garota Bora, que estava recém aprendendo (da maneira errada) como se usava uma arma. Na cozinha Naomi planejava o almoço, que incluiria uma grande pitada de pimenta e "molho especial", que provavelmente dificultaria a tarefa dos Park mais tarde. Enquanto isso, Seokwon e Takada estavam no porão limpando as celas recém vazias. Ou eram para estarem fazendo isso, ao invés de apostar cinquentão em quem ganharia no pife. Inu corria pelos corredores e perturbava os outros membros com piadas de pum. O velho Choi estava ocupado lendo livros na biblioteca. Alguma coisa sobre masmorras e dragões, ou algo assim.
"Towanenses" circulavam de um lado para o outro, todos ocupados com alguma coisa. Algumas úteis, outras... nem tanto. No canto mais afastado da mansão se via Satoru em sua sala, como de costume. Seung-hyun estava na empresa. E no meio de toda aquela confusão mais do que habitual, a porta dupla da frente se abre, revelando os dois indivíduos recém-chegados do Japão. Jooheon e Shownu.
Os passos pesados e apressados do Nomura fizeram barulho no piso de concreto, passou pelo refeitório, subiu as escadas, zanzou pelos corredores, chamando atenção por onde passava, mas olhando sempre em frente, com a cabeça erguida, expressão pesada e olhos fulminantes em um mesclado de raiva e, principalmente, preocupação. Seus passos firmes e mandíbula travada denunciavam sua determinação. Shownu ficara para trás com a pressa do mais novo.
As pessoas o viam passando e não desviavam o olhar. Algumas surpresas, outras admiradas, e outras, ainda, confusas. Embora as controvérsias, Jooheon era bastante respeitado e admirado pelos demais. Ele era Kobun, participara de diversas missões de riscos, missões honradas que provavam sua bravura, além disso, aqueles que não o conheciam, como os novatos ou os membros transferidos, muito já ouviram falar sobre Jooheon e ele construiu uma reputação a seu favor. Era como um herói para os mais novos (um herói bem destorcido), um irmão para os companheiros e um adversário a nível aos mais velhos. Para a Yakuza, quanto maior seu nível de dor, mais honrado você é. Principalmente a dor física. E Jooheon passou por bons bocados ao decorrer dos anos.
De frente para a sala do pai, ele nem bateu na porta e já foi entrando. Ele sabia que o Oyabun odiava isso, era como contestar sua autoridade. Era uma insolência e falta de respeito. Mas Jooheon o fez mesmo assim. Entrou no escritório sem se importar em deixar a porta aberta, a passos longos parou de frente para a mesa no superior que digitava no notebook e bateu as mãos sobre a madeira, se inclinando levemente sobre esta.
Oyabun ergueu os olhos afiados do aparelho para o filho. — Já disse para bater na porta.
— O que aconteceu com Changkyun? — Perguntou ríspido.
Suspirou e fechou o notebook. — Se está aqui é porque já sabe a resposta. Ele foi sequestrado.
— E...?
E o que?
Tirou as mãos da mesa, se pondo ereto. — Você não fez nada para impedir? Não tentou resgata-lo? Já mandou um grupo de busca?
— Traze-lo de volta pode ser mais difícil do que parece. — Cruzou os dedos das mãos em cima da mesa. — Kakuji está o mantendo bem guardado.
— Ele já está registrado no sistema da Towa. Eu mesmo chequei. A Inagawa não pode simplesmente sequestrar um dos nossos, isso vai contra a regra de conduta.
— Eu sei muito bem disso, mas ele tem algo a seu favor que pode mudar essas regras. Uma exceção. — Levantou-se e andou até a janela, ficando de costas ao filho. — Por enquanto precisamos ficar de fora.
Franziu o cenho. — Que exceção é essa? — Ele sabia que o pai tinha um motivo para ter mantido Changkyun protegido e que não era apenas por ter causado danos a ele e queria reparar. — Quer saber... não importa. Eu vou comunicar Shownu e Seokwon, talvez Minhyuk, e vamos atrás dele.
— Não! — Falou alto, antes do filho dar as costas e sair. — Esse precisa ser um ato pensado. — Tirou a atenção da janela e virou metade do corpo para Jooheon. — Aquele garoto é a chave da guerra, não podemos ter o descuidado de abrir essa porta. Não ainda. — Encarou o Lee. — Não vá atrás dele até que eu diga o contrário. Isso é uma ordem.
Riu soprado. — E desde quando eu obedeço às suas ordens? — Balançou a cabeça negativamente e deu as costas. Parou de andar quando estava na porta e olhou para trás. — Ah. E eu estou bem, obrigado por perguntar. — Enfim deus as costas novamente e saiu do escritório.
Sorriu de canto e balançou a cabeça em negativo. — Tão previsível. — E voltou a olhar através da janela.
Jooheon desceu as escadas para o primeiro andar. Shownu estava na metade da escadaria quando se encontraram e pararam de andar.
— O que você fez?
Sorriu de canto. — Onde está Seokwon?
.
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Hoseok havia terminado de dar uma rápida arrumada no quarto. Para a sua surpresa, quando saiu do quarto deu de cara com Kihyun no corredor, parado a sua frente.
— Kihyun. — Sorriu largo. — Você voltou vivo, que maravilha. — Deu tapinhas em seu ombro, mas parou ao ver que ele estava sério e o fuzilava. — Eh... Que cara é essa?
— Hoseok... — Falou entredente. — Eu vou te esganar.
E assim o fez. Enquanto Wonho ficava com cara de como é que é o negócio? Yoo rodeou seu pescoço com as mãos, balançando-o para frente e para trás.
— Pra que... a agressão? — Segurava com uma mão um dos pulsos de Kihyun e com a outra dava tapinhas tentando se livrar do sufoco. — Solta! Solta!
Kihyun soltou. — Seu idiota! Você disse para o Gun que eu gostava dele?
Wonho massageava o pescoço mas parou ao se lembrar da briga que teve com Gun. — Ahm... Não? — Kihyun levantou as mãos na altura do pescoço do outro, fazendo barulho com a garganta, como se se controlasse para não pular em seu pescoço de novo. — Tá, tudo bem. Eu talvez tenha comentado algo sobre isso. Mas, hey! Olhe pelo lado bom. Pelo menos agora você desencalha. — Deu cotoveladinhas no outro, entretanto Kihyun o encarou mortiferamente e partiu para cima, mas Shin foi mais rápido e se trancou no quarto, deixando Yoo batendo e chutando e xingando a pobre da porta.
Ele bufou e se afastou, indo para o seu quarto logo ali. Wonho abriu um vão na porta que considerou seguro e pôs a cabeça para fora.
— Desculpa Kiki, não foi por querer. — Deu seu sorriso mais inocente e piscou os olhos.
— Eu te odeio.
Sorriu mais. — Também te amo.
Kihyun ergueu o braço como se fosse lhe desferir um tapa na cabeça e essa foi a deixa para Hoseok fechar a porta rindo. Yoo balançou a cabeça em negativo, dando um pequeno sorriso pela idiotice do amigo. Suspirou não sorrindo mais e foi para seu quarto. O que viu quando entrou não foi bem o que ele esperava. Tudo estava normal e igual como sempre, exceto por sua cama que estava bagunçada como se alguém houvesse acabado de levantar e roupas que não eram de Gun, e muito menos suas, jogadas no colchão. Se aproximou e pegou o travesseiro, só para confirmar suas suspeitas ele cheirou. Aquele perfume não era de Gun e, novamente, também não era seu. Riu soprado da própria desgraça e soltou de qualquer jeito o travesseiro de volta na cama. Changkyun estava dormindo na sua cama esse tempo todo em que estava fora, em missão correndo perigo. E para piorar, ele sabia que foi Gunhee quem o mandou usar aquela cama. Umedeceu os lábios com a língua e se sentou nos pés na cama, a cabeça baixa. Ele chegara ao fim do poço. A porta do quarto foi aberta e ele nem se deu ao trabalho de levantar a cabeça. Sabia quem era.
Song entrou no quarto e fechou a porta, mas ficou parado ali, sem saber bem o que fazer ou falar. Kihyun olhou para trás, os lençóis bagunçados e a camisa de flanela vermelha jogada.
— Pelo visto você me substituiu rápido. Achou um novo companheiro de quarto.
— Não é assim. — Enfim se pronunciou, se aproximando um pouco do Yoo.
— O que foi? — Olhou para Gun. Agora a mágoa se mesclava com a irritação. — Achou que eu não voltaria? Que já estava morto? — Deu de ombros e olhou para o lado. — Tanto fez, tanto faz, não é?!
— Kihyun... — Se aproximou mais, a poucos passos.
Sorriu de canto. — Você não precisa se explicar, Song. Já estou acostumado a ser ignorado. Treze anos te dão experiência suficiente.
Gun suspirou e andou até a sua frente, se agachando e lhe olhando de baixo, com a cabeça levemente erguida. — Kihyun, olha pra mim. — Mas ele não o fez, então Song segurou uma de suas mãos, ganhando sua atenção. — Não fica assim, Ki. Eu me importo com você, nunca quis te deixar triste.
Kihyun era bem resistente e forte, mas essas simples palavras fizeram seu peito afundar e sua garganta arder. Engoliu a seco e baixou mais a cabeça, escondendo seu rosto, sentindo os olhos embaçando. Tentou puxar a mão, mas Gun não permitiu, continuou segurando.
— Ki, eu sinto muito. — Sua voz transparecia verdade e ressentimento. — Sinto muito de verdade. Eu fiz você passar por tanta coisa, fiz você sofrer. Sinto muito. Me perdoa. Eu sou um idiota.
— Para... — Falou com a voz baixa e tremula. — Para de me chamar assim.
Sorriu doce. Segurando agora suas duas mãos. — Mas eu te chamava assim, não lembra? Tínhamos a mesma idade, mas você parecia bem mais novo. Eu te chamava de Ki e você me chamava de Hyung. — Os ombros de Kihyun subiram e desceram ao prender um soluço. Gun parou de sorrir. — Eu deveria ter feito algo sobre isso, sinto muito. Me desculpe. Me desculpe por só pedir desculpas. Eu só sei sentir muito, mas sei que não é o bastante. Nenhum me perdoe pode reparar o meu erro e eu pagarei o preço eternamente por te fazer sofrer.
Foi o suficiente para Kihyun. Ele não conseguia mais se segurar e esconder as lágrimas. Com um soluço ele desabou no choro. Chorou como não chorava a muito. Seus ombros tremiam, sua respiração se entrecortava entre os soluços e seus olhos se desfocavam pelas lágrimas a banha-los. Se sentia fraco e desprotegido, sentia-se exposto. Gun se apressou e sentou-se ao seu lado, o puxando para um abraço. Song se sentia tão mau de vê-lo chorar. Seu peito afundava ao ouvir seu choro e senti-lo tremer. Ele poderia não gostar de Kihyun da mesma forma, mas gostava de Kihyun, tinha carinho pelo garoto, afinal eram amigos a tempos e embora não nutrisse sentimentos românticos, nutria sentimentos. Song o abraçava apertado, na esperança que ele se acalmasse, mas era difícil para Kihyun. Qualquer coisa relacionada a Gun, era difícil para ele.
— Não chora. — Pediu baixo. Ele já não sabia mais o que fazer. Estava nervoso, nunca foi muito bom em consolar as pessoas e geralmente não o fazia. Fez mais uma tentativa de o acalmar: massageou suas costas. Mas isso também não pareceu surtir efeito, embora agora ele não soluçasse tanto. — Está tudo bem. Me desculpe, a culpa é minha. — Segurou em seus ombros e o afastou delicadamente. Kihyun olhava para baixo, as lágrimas escorrendo pelo queixo. Gun levou as duas mãos ao seu rosto e secou suas bochechas com os polegares, mas era inútil, pois no momento seguinte estavam molhadas novamente.
— Desculpa, eu... — Soluçou. — Não... não consigo... — Tentava controlar suas emoções, mas se mostrava uma tarefa difícil. Era como se todos esses treze anos ele enchesse um balão de água, e cada vez mais esse balão aumentava, até ficar grande demais e explodir, esvaziando toda a água guardada por anos de uma vez só.
O mais velho fitou seu rosto úmido e desesperado. Parecia incrível e triste que aquilo era por ele. Não achou que fosse algo tão forte a ponto de o fazer chorar dessa maneira. Logo Kihyun que não era de demonstrar seus sentimentos e dores, que sempre foi controlado em suas emoções, resistente às dores da vida. Gun quase nunca o viu chorar, a última vez foi a anos, quando ele recém havia sido resgatado das ruas, ele chorava bastante naquela época. E agora ali estava ele, o menino inabalável e forte, em prantos na sua frente e por sua causa. Gun não sabia mais o que fazer para o confortar, então agiu sem pensar.
Com as mãos ainda em suas bochechas, ele levantou levemente seu rosto e sem mais nem menos selou seus lábios. Não houve língua nem movimento algum, apenas um selar demorado. Gun estava com os olhos fechados e não viu o semblante de surpresa de Kihyun, nem que seu choro parou abruptamente, como que por mágica. Quando se afastou, lentamente, os lábios se desgrudando com leveza e lentidão, os olhos ainda fechados, e coração acelerado por nervosismo, foi quando se tocou do que havia feito. Abriu os olhos bem devagarinho e encarou aos intensos de Kihyun, que parecia lhe fitar a mais tempo. Por um instante ficaram apenas assim: a centímetros de distância, as mãos sobre o rosto do rosado, encarando um ao outro sem dizer nada. Foi Kihyun, confusa e timidamente, a se pronunciar primeiro.
— O que...?
Gun piscou, como se voltasse a realidade e sorriu curto. — Consegui fazer você parar de chorar.
Kihyun estava confuso. Não sabia o que aquilo significava. — Gun... — Pôs suas mãos sobre as de Song em suas bochechas. O cenho franzido.
— Desculpa. Eu não deveria ter... — Foi puxar as mãos, mas Kihyun as segurou.
— Faz de novo.
Gun piscou algumas vezes, pensando se havia escutado direito, mas obviamente ele havia escutado certo. Kihyun o fitava profundamente. Gun não deveria ter o beijado naquele momento, mas agora não poderia simplesmente dizer não. O encarou por mais alguns segundos e desviou o olhar de seus olhos para seus lábios. Agora que não estava fazendo sem pensar, ficara mais nervoso ainda. Umedeceu os lábios, fechou os olhos e se aproximou, repetindo o ato. Dessa vez Kihyun também fechou os olhos e estava mais preparado (ou pelo menos o máximo possível). Novamente não houve o uso da língua, apenas um selar, mas dessa vez os lábios se moveram lentamente. O selo durou um pouco mais, Kihyun parecia relutante em parar e Gun não sabia quando já era "suficiente". Se separaram e Gun soltou seu rosto. Ambos fitaram-se novamente, em silencio.
— Kihyun... — Começou Gun, se sentindo um cretino. — Você sabe que não é recíproco, não é? — Perguntou da forma mais delicada que conseguiu, com medo que o mais novo caísse no choro novamente.
Assentiu tímido. — Eu sei. — Respirou fundo. — Eu sei, mas mesmo assim não consigo desistir de você. — Song ficou sem fala. — Estou ciente que você não sente o mesmo por mim e que provavelmente nunca sentirá. Eu percebi isso no beijo. Mas mesmo sabendo disso... Mesmo sabendo que não é real... — Fez uma pausa. — Eu quero tentar. Não me importo de ser usado, desde que seja por você. Vou sofrer de qualquer forma, eu prefiro sofrer ao seu lado do que sofrer longe de você.
— Kihyun, o que você está me pedindo é... Isso...
— Eu sei. — Cortou. — Estou pedindo muito, mas somete dessa vez... É só isso que peço.
— Isso não é saudável. — Alertou preocupado.
— Eu só peço um mês. — Baixou a cabeça, envergonhado pelas próprias palavras. — Você só precisa fingir por um mês. Pode fazer o que quiser. Se quiser sair com outras pessoas nesse período... tudo bem... — Suspirou. — Depois disso eu desisto, de verdade. Mas antes de te perder, quero te ter ao menos uma vez, mesmo que de mentira.
Gun ficou em silêncio, digerindo toda aquela ideia. Kihyun tinha certeza que a resposta seria não. — Durante treze anos eu te deixei sofrendo sozinho. — Começou. — Por minha causa você teve que suportar muita coisa e não deve ter sido fácil. — Suspirou e assentiu. — Tudo bem. Eu aceito.
Kihyun ergueu o rosto surpreso. — Você... aceita?
Sorriu e assentiu solenemente. — É o mínimo que posso fazer, mesmo que isso não seja o bastante.
— ... — Seus olhos lacrimejaram, mas se conteve. — Obrigado.
Mais uma vez Gun se aproximou, levou as mãos ao seu rosto, mas dessa vez beijou levemente sua testa e sorriu curto. — Tentarei ser o melhor possível.
Negou com a cabeça, sorrindo. — Não precisa ser o melhor, apenas você mesmo.
Kihyun abraçou sua cintura, deitando a cabeça em seu ombro.
Tudo aquilo parecia um sonho para ele;
Um sonho com data de validade.
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O trem parou na estação, pessoas desciam e subiam, esbarrando-se umas nas outras por falta de espaço. O metrô sempre lotava na hora comercial.
Changkyun se espremeu para passar entre as pessoas, esbarrou ombro no ombro com um colegial, depois recebeu uma pisada no pé por uma mulher rechonchuda que nem se deu ao trabalho de se desculpar. Por fim ele conseguiu sair do trem e respirou fundo o ar com cheiro de amendoim e alvejante da estação. Passou pela catraca eletrônica e subiu as escadas, saindo da estação para o ar (não tão) puro do centro de Seoul. Andou algumas quadras até o hospital, pelo caminho passando por grandes prédios espelhados, telões de propaganda de refrigerante e plásticas faciais, lojas com réplicas de idols em papelão, vendedores ambulantes de petiscos, carros dos mais diversos nas ruas e mais algumas coisas das quais via praticamente todos os dias (quando não estava em cárcere privado, claro). Jung ficou surpreso ao lhe ver no hospital, afinal ele "tirara férias para descansar" (aham).
— Você precisa ver essa sua compulsão por trabalho. Sério, talvez a Kimi possa te receitar alguma coisa. — O pediatra falou.
— É bom te ver também. — Sorriu de canto. — Mas eu não vim aqui para trabalhar, vim para...
— Falar com o Yoonho. — O cortou, adivinhando sua fala. — É, eu sei. Vem cá... por acaso vocês tão tendo um caso?
— Essa... — Pôs a mão no ombro do colega. — É a ideia mais sem noção que eu já ouvi. — Sorriu sarcástico. — Mas sério... Cadê ele?
Deu de ombros. — Atendendo um dos pacientes com queimaduras, eu acho. Ala 7.
Assentiu agradecendo e rumou ao elevador. Pressionou o sete, as portas fecharam e a lata metálica subiu até o sétimo, se abrindo no andar designado. Caminhou pelos corredores até chegar na ala em que eram tratados os pacientes com queimaduras de segundo e terceiro grau. Apoiou as costas na parede e esperou até que Yoonho saísse de um dos quartos, o que demorou um pouco. Changkyun trocava o peso do corpo de um pé para o outro, apoiava um na parede, depois o seguinte, massageava o pescoço, batucava os dedos na coxa, até que finalmente, da porta a sua frente e esquerda, Noh apareceu com uma bandeja metálica de esparadrapos, pomadas, gazes, um copo de água e uma cartela de remédio pela metade. Fechou a porta com uma das mãos, equilibrando a bandeja na outra. Virou-se de costas sem notar Changkyun ali e deu os primeiros passos, mas parou quando Changkyun o chamou pelo nome. Ele olhou por cima do ombro e ao o avistar se virou por completo na sua direção, caminhando até Lim enquanto ele fazia o mesmo.
— O que faz aqui? — Perguntou. — Se for sobre aquela carta que você me mandou entregar, relaxa. O cara era sinistro, mas eu consegui dar sua mensagem. Aliás... nunca mais me peça para fazer algo assim.
— Tá, desculpe. É sobre isso mesmo que vim falar. — Apontou com o queixo para frente, sinalizando para que continuassem andando, e o fizeram. — Eu esperava que você ainda não tivesse entregado.
Arqueou uma sobrancelha. — Mudou de ideia?
— A situação mudou, digamos assim
— Você pode, sei lá, mandar uma mensagem no WhatsApp para ele cancelando ... seja lá o que for.
— Não é tão simples. — Suspirou. — O problema é que eu não tenho o número dele, e mesmo que tivesse, meu celular foi confiscado. Eu teria que ir até seu covil e eu não tenho muito tempo para isso.
Yoonho parou de andar, obrigando Lim a fazer o mesmo. — Me diz a verdade Chang. — Pediu. — No que você está envolvido?
Olhou para o lado e coçou a nuca. — É complicado.
— Olha, eu sou seu amigo a o que? Cinco anos? Você pode me contar as coisas, não vou te julgar nem nada, sério.
— Eu sei, e confio em você, mas não seria seguro contar.
Franziu o cenho. — Seguro?! O que é? Está devendo a um traficante? Presenciou um assassinato e está sendo ameaçado caso conte a alguém? Ou talvez tenha sido sequestrado por contrabandistas? — Suspirou. — Alguma coisa aconteceu com você, alguma coisa grande. Você está diferente, está agindo fora do habitual e parece meio... sei lá... misterioso?
Chang olhou para os dois lados. Ele queria contar e confiava em Yoonho, mas não sabia se era seguro. Não sabia qual seria a reação do Noh. Talvez tentasse o "resgatar", faria uma denúncia a polícia e depois fosse morto pelo feito. Não. Era arriscado demais. — Eu não posso contar, de verdade, mas é mais ou menos tudo isso que você chutou.
— Cara... você está muito fodido. — Pôs a mão em seu ombro. — Se eu puder ajudar com alguma coisa, tipo... que não envolva ex-presidiários assustadores e perigosos, é só falar.
Riu curto. — Pode deixar.
O celular de Yoonho tocou e ele o pegou, o levando ao ouvido. — Fala... O que? — Franziu o cenho e olhou para Chang. — Tá, tudo bem... Eu digo... Tchau. — Desligou o aparelho e olhou para o Lim. — Tem alguém lá embaixo querendo falar com você.
— Comigo? — Juntou as sobrancelhas. — Quem e como sabia que eu estava aqui?
— Eu não faço ideia. — Confessou. — Quer que eu vá lá e fale que você não está?
Negou. — Não, tudo bem.
Da porta que antes Yoonho havia saído, uma enfermeira aparece correndo e olha para Noh com os olhos esbugalhados. — O paciente está convulsionando.
Yoonho entrega a bandeja a enfermeira e corre para dentro. A enfermeira o segue. Lim olha aquela cena sentindo duas coisas: orgulho do amigo que se tornara um bom médico e saudade do trabalho. Saudade de ajudar e de salvar as pessoas. Ele se permitiu um último sorriso antes de andar de volta para o elevador e descer para seja lá o que lhe esperava.
Quando chegou ao primeiro andar, avistou Jung atrás do balcão e se aproximou, mas antes mesmo de chegar até o amigo, avista quem é que estava o procurando e para de andar. Minhyuk caminha em sua direção e olha para todos os lados, certificando-se que não havia ninguém.
— Chang, graças a deus você está bem. — Fala levando a mão até o seu braço, mas Lim desvia, o impedindo.
— O que está fazendo aqui?
Minhyuk franzi o cenho, confuso pela reação do outro. — Eu vim te levar pra casa.
— Para casa? — Riu soprado. —Aquela não é minha casa.
— Então você prefere ficar na Inagawa?! Changkyun, você está correndo perigo lá.
Desviou o olhar, negando com a cabeça, e voltou a lhe fitar. — Estou correndo perigo na Inagawa, na Towa. Em todo o lugar. Qual a diferença de correr perigo aqui ou lá?
— Qual a diferença? — Perguntou inacreditável. — Chang, você sabe das coisas que eles fizeram para nós, como pode dizer isso?
— Eles não foram os únicos, vocês também os atacaram. — Falou e suspirou. — Olha Minhyuk, eu não posso conversar agora, preciso resolver uma coisa.
Minhyuk o fez parar de andar com sua fala: — O que foi que eles disseram para você?
Se virou para Minhyuk. — Eles me disseram a verdade, Minhyuk. Não me esconderam nada ou me usaram como refém.
— Do que está falando?
— Pergunte para o seu Oyabun, ou então para Jooheon. — Se virou e deu o primeiro passo, mas parou e se virou para Minhyuk mais uma vez. — Diga para Jooheon que não venha atrás de mim. — E continuou andando.
Minhyuk ficou parado por um tempo, tentando raciocinar o que estava acontecendo. A Inagawa só podia ter mentido sobre alguma coisa para manter Changkyun lá. Mas por que?
Ele não podia simplesmente voltar para a mansão dessa forma. Não podia deixar Changkyun com a Inagawa podendo estar correndo perigo. Ele tinha que fazer alguma coisa.
Changkyun saiu do hospital com a ideia de ir atrás de Dilan, o ex-presidiário, e cancelar aquele plano maluco, pelo menos por hora. Mas tinha um problema: ele não sabia o lugar décor, tinha apenas anotado as coordenadas e elas não estavam com ele. Chang teria que ir um outro dia e agora ele não estava afim de voltar para a casa da Inagawa, então ao invés de ir de novo para o metrô, resolveu aproveitar sua liberdade provisória.

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