19. Conversa de botas batidas

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Quinta-feira

Assim que acordava, Jeongguk tomava a sua dose de frustração diária: Olhar para a conversa com Jimin e admirar a falta de respostas, a qual não lhe tirava o sono, mas o deixava inquieto e pensativo.

De vez em quando, uma vontade incessante de só aparecer de repente em frente à Universidade lhe corroía, a saudade e a vontade de entender o que estava acontecendo tinham o mesmo tamanho, mas a ideia fazia o seu coração acelerar apenas pela dúvida de ir ou não. A memória da primeira e última vez que fizera isso aparecia sem ser chamada e então, se sentava e deixava as chaves de lado, desistindo. Não poderia se impor na vida de alguém que deixou de dar sinais que o queria por perto.

Era cedo e o leite junto do cereal ainda estava gelado, mas quase intocado. Se esquecia de comer quando estava perdido em pensamentos, ignorando Nanquim que brincava com uma bolinha de papel no chão. Sua mente estava uma bagunça, pois ao mesmo tempo que se questionava o motivo de tudo aquilo, também se forçava a parar de pensar em quem já deveria ter o esquecido.

Sua bagunça interior já existia há um bom tempo, mas desde a ida à Busan tudo só piorou e isso refletia na desorganização do cômodo que chamava de apartamento. E de repente, a pia cheia de louça suja não foi vista com indiferença, se sentiu incomodado com o estado do local, isto é, aquele era o seu destino final do dia, sua morada e descanso. Até poderia não ser a casa dos seus sonhos, mas era a que ele tinha, aquele era o seu hoje.

Se esforçava para enxergar o lado bonito de sua vida, para assim, melhor conviver com os seus fantasmas, mas estava relegando o seu próprio lar. Aquele que era físico e servia de barreira para o mundo exterior.

E entre louças lavadas; a vassoura se encontrando com o chão depois de tanto tempo; o cheiro de limpeza exalando até mesmo do banheiro, a ressaca que parecia estar durando dois dias chegava ao seu fim. Um indie rock animado tocava e ele até conseguia se divertir com Nanquim o atrapalhando a trocar os lençóis da cama, se permitindo entrar em uma dança mesmo que o corpo estivesse cansado e suado. O sol refletia no tecido e a sombra do gato preto era descoberta, pulando de um lado para o outro, arrancando um sorriso largo daquele que se recusava a se chamar de dono.

Nanquim era um espírito que nasceu livre, não poderia trancafiá-lo em uma casa para que ele somente visse o mundo através das grades de uma janela. Às vezes se perguntava se o gato tinha amigos ou se passava um tempo em outros apartamentos como passava no seu, afinal, ele sempre sumia por um tempo e voltava para acordá-lo bem cedo, fazendo-o cochilar durante a tarde para aguentar o ritmo das festas noturnas, mas sem qualquer arrependimento.

Depois de um banho gelado, juntou suas roupas e lençóis e, se encaminhou para a lavanderia do bairro. Seu cabelo estava escondido debaixo de um bucket hat e os seus chinelos faziam barulho por estar se arrastando pelas calçadas, passando pelos muros pichados e um grupo de bêbados que dividiam uma garrafa.

Entrou entediado na lavanderia, odiava ficar sozinho esperando e, para piorar, havia esquecido seus fones de ouvido. Assim, quando viu Hyunah sentada com as pernas encolhidas em cima da cadeira, não conseguiu deixar de sorrir por saber que teria companhia enquanto esperava as máquinas lavarem suas roupas. Sentou-se ao seu lado sem dizer nada, livrou o cabelo molhado do chapéu, sacudindo-o em direção à amiga, que somente sorriu pequeno, ainda com as pernas encolhidas na cadeira e observando o seu reflexo no vidro da lavadora. Jeongguk não esperava que ela permanecesse quieta, Hyunah não era assim, então, se endireitou no assento antes de perguntar: — Como anda a vida?

— O que você acha d'eu pintar a metade do meu cabelo de preto? — Disparou, ignorando a pergunta do amigo.

— Tipo a Cruela? — Indagou e franziu o cenho ao se recordar da personagem do filme.

Asian Scars × jikookWhere stories live. Discover now