33. Desde Outubro

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Taehyung achava estranho ver o seu o quarto tão bem iluminado, apreciava mais a luz indireta que a tela do notebook e o abajur sobre a escrivaninha proporcionavam. O cômodo era pequeno e só aquilo parecia ser o suficiente, mas não com Jimin ali, perambulando pelo pouco espaço, observando as pinturas coladas na parede, pouco se afetando com as memórias que algumas artes evocavam dos primeiros semestres da faculdade, mas suspirando alto ao notar o desenho do guarda-chuva destacando-se entre os demais. Aquele quarto também continha pedaços da sua história.

Como se engolisse um nó na garganta, moveu os pés em direção a pequena prateleira de livros apoiada em um canto da parede perto da janela. Leu os títulos organizados em ordem alfabética e todos eles pareciam ter parado no ano de 2014, sem muitos clássicos, apenas o que era popular na época, pois todos os novos exemplares deixaram de ser manchados pela aquarela de Taehyung e ficaram arquivados em um modelo antigo de um leitor de livros digitais.

— Quer levar alguma coisa? — Taehyung perguntou, deitando-se na cama e incomodando-se com a lâmpada acesa. Ela refletia no espelho e na tela do notebook aberto, então parecia haver três lâmpadas em um lugar tão pequeno. Era horrível.

— Não, eu só gosto de mexer nas suas coisas. — Olhou para trás e sorriu por trás dos ombros, sentindo um pouco do resquício do perfume de Jeongguk ainda grudado no moletom que vestia.

Sua tentativa de se agarrar a qualquer detalhe da vida alheia para aliviar um pouco da dor não poderia ter fracassado tanto, de nada adiantaria contar quantas canetas Taehyung tinha em um porta lápis de acrílico transparente, ou memorizar os detalhes da bagunça bonita disposta na escrivaninha, com pincéis mergulhados em copos cheios de água aquarelada e o godê arredondado com as tintas já secas. O papel no meio da mesa possuía uma margem de fita branca, a pintura, já em muitas camadas, parecia estar repousando, algo na tentativa de fazer aquele rosto desconhecido havia dado errado e Taehyung a deixara ali, esperando que as horas se passassem e alguma solução surgisse, como se tivesse todo o tempo do mundo para fazer todas as pinturas que quisesse, do jeito que quisesse.

— O que anda fazendo nessas férias? — Taehyung perguntou, retirando o antebraço da testa quando Jimin percebeu o seu incômodo e apagou a lâmpada, deitando-se ao seu lado na cama, abraçando o travesseiro que amassava a bochecha.

— Lendo.

— Lendo? — Taehyung perguntou, desconfiado e preocupado com os romances que só serviriam para lembrá-lo das feridas que não iriam se curar tão cedo. — Que tipo de livros?

— Ficção científica, alguns de física que tentam explicar a grandiosidade do universo e até algumas biografias de cientistas religiosos europeus. Nem eu sei muito bem onde estou me enfiando, mas é interessante ver as ideias que, hoje em dia já foram comprovadas, serem refutadas como se fossem o maior pecado do mundo.

— A ideia de pecado sempre muda no lado ocidental e católico da história — comentou, olhando para o teto. — Quem diria que achar que a Terra é redonda e que todos os planetas giram em torno do Sol seria um pecado.

— Bom, independente de onde estaríamos nessa linha histórica do tempo, seríamos pecadores em todas elas — disse, melancólico, olhando para o nada das listras da camisa de Taehyung. Deixar de ler romances fora apenas uma tentativa de lembrar menos de Jeongguk, mas era só fechar o livro para a ausência dele pesar uma tonelada. — Nosso pecado nunca deixou de ser pecado.

— Por que chegamos a esse assunto? — perguntou, depois de uma pausa reflexiva, demonstrando todas as interrogações no timbre de sua voz, chamando a atenção de Jimin, que riu ao responder de volta.

— Foi você quem perguntou o que eu estou lendo.

— Mas você não está lendo nenhum romance gay.

Asian Scars × jikookWhere stories live. Discover now