24. Doses homeopáticas

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Jimin nunca achou que o amor fosse fácil e mesmo que Jeongguk fizesse parecer que sim, era, ainda não conseguia concordar. Afinal, como um amante das letras, conhecedor da poesia e do poder que as palavras emanam, não conseguia descrever tal sentimento? Só sabia que aquilo não cessava, era uma onda crescente que ele não queria que se tornasse maremoto destrutivo. Que cresça até os céus e, se for para desabar, que seja bem devagarinho e que o inunde até não caber mais em si.

A parte mais difícil era compreender que o amor poderia ser cuidado, mas que ele não conseguia cuidar de Jeongguk. Eram raras as noites em que passavam juntos e em diversas vezes, Jimin o assistia se levantar da cama improvisada no chão e dar passos sem rumo pelo apartamento de luzes apagadas, parando no mesmo lugar de sempre: As janelas de vidro cobertas por papel pardo.

Abria-a minimamente e a presença de seu corpo era como um escudo impedindo a brisa da madrugada de atingir Jimin. E ali Jeongguk permanecia, ora pressionando a língua contra a bochecha, ora suspirando devagar, tentando fazer com que cada som de seu corpo fosse tão silencioso quanto a noite, apenas para não ser escutado.

Mas Jimin escutava cada lufada de ar que saía da boca de Jeongguk, plantando uma angústia no peito que não era só dele, mas agora, sua também. Os fantasmas alheios refletindo suas sombras em si. No entanto, ele não sabia o que fazer, o que realmente se passava na cabeça do tatuado quando sacudia os fios rosados — será que estava tentando espantar algum pensamento ruim?

Mas não era algo que Jimin podia simplesmente perguntar, até porque em muitas dessas ocasiões fingia estar dormindo. Também começou a entender que havia partes de Jeongguk que ele não hesitava em compartilhar, mas quando se tratava de Flamingo, a boca se calava e o olhar vagava para longe, num horizonte distante que deveria ser o lugar daquele tão infame personagem.

E só de sentar-se, observar e esperar, Jimin já estava cuidando de Jeongguk. Cuidado este que escapulia de seus olhos.

Jimin olhava para Jeongguk de um jeito único. Gostava de passar o dia todo com ele para apreciar as sombras que o sol fazia na face ainda bronzeada, enquanto as horas se passavam. A luz acinzentada da manhã que atravessava o amarelado do papel pardo ajudava a compor aquele cenário, entrando com calma, como se não quisesse incomodar os olhos lentos ao se abrirem; o bico manhoso nos lábios quando se apoiava no cotovelo sobre o colchão, acusando Jimin de o observar enquanto dormia. Os ossos da costela em alto relevo quando se espreguiçava com vontade, a linha da Máscara de Hannya que lhe tomava as costas em contraste com o abdômen liso, sem marcas. E a voz... A voz mais grossa antes do café era a coisa preferida de Jimin, ainda mais quando reclamando ele dizia:

— Queria acordar antes só pra te observar também. — Mas isso nunca acontecia e Jimin gostava muito do seu pequeno ritual matinal.

Sentia falta do verão e de todas aquelas cores que o sol podia trazer para a pele de Jeongguk, pena que quando tudo era tão quente, Jimin ainda estava em negação e perdeu alguns desses detalhes. Só esperava que o próximo verão chegasse logo para melhor aproveitar os olhos de pálpebras cerradas tentando se esconder da estrela maior. Mas, por enquanto, se contentava com aquele típico nublado e brisa serena que chacoalhava os fios cor de cereja de forma amena; das tardes que se arrastavam em conversas sem fim e de noites que chegavam com jantares improvisados. Jeongguk insistia em não ter muita coisa na geladeira.

E era justamente quando a lua os fazia companhia que tudo ficava tão mais bonito. Ela lá de cima, mesmo entre nuvens, conseguia ser refletida sobre os olhos de universo, iluminando tudo o que Jimin pudesse tocar. Ainda bem que ele só queria tocar em Jeongguk. E era assim que se recusava a fechar os olhos para observar cada pêlo do corpo se arrepiar quando suas unhas se arrastavam por algum ponto fraco já tão conhecido; a boca que se abria, mas não dizia nada e a coluna se contorcendo em rendição, as mãos puxando os fios negros em pura súplica.

Asian Scars × jikookWhere stories live. Discover now