29. Jimin é uma memória

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A noite já encarava a madrugada, mas ninguém ali possuía noção alguma sobre o tempo, esse que era uma grande armadilha para corações distraídos.

Jeongguk e Jimin foram levados com facilidade pelos toques de mãos macias, puxões de cabelo, dedos que se entrelaçavam como um velho costume instalado e sequer percebido. E, agora, estavam ali, sentindo as consequências de seus atos que beiravam ao natural.

Corpos separados por uma fina camada de alguma coisa não identificada, não sabiam o que sentir e o que fazer depois daquele ponto ultrapassado. Havia apenas uma certeza pairando no ar: Jimin nunca deixaria Jeongguk sozinho e, se pudesse voltar no tempo e mudar cada um de seus passos, ele ainda teria tomado o mesmo caminho, embora soubesse que o amanhã viria cobrando o preço dos seus atos daquela noite.

As janelas estavam fechadas para espantar o frio e só o que restava era a iluminação precária da lâmpada amarelada do apartamento de Jeongguk. Sentado no chão e encostado na parede mofada, o tatuado parecia estar à deriva. Completamente perdido.

As pernas estavam esticadas e os braços pendiam ao lado do corpo, os olhos mirando o piso claro. Até parecia que os seus olhos estavam vagos, focados em lugar nenhum, mas Jimin sabia exatamente o que ele estava pensando, porque era o que pensava também. E, talvez, era aquilo que o fazia olhar para a janela em busca de algum reflexo, algo que indicasse que o sol raiava depois de uma tempestade. No entanto, a lua ainda era majestade e a noite estava longe de terminar.

Jeongguk relembrava os acontecimentos recentes como um filme que não queria assistir. A tarde fria caindo no Something não combinava com o seu desconforto em ver sua arte cravada em alguém por mãos alheias. E ao se despedir de Jimin na Yonsei, com as palmas desentrelaçando-se em agonia, Flamingo assumiu o seu lugar e talvez tenha sido aí que tudo começou a dar errado.

Ou, quem sabe, tenha sido quando Jeongguk obteve a certeza de que Jimin estaria consigo até mesmo nos seus piores dias e agora ele já não sabia até que ponto aquilo era aceitável.

Porque a sua vida era uma pintura mal sucedida. Um completo desastre. O copo cheio d'água podia entornar e manchar toda a sua tela se assim as consequências das suas escolhas seguissem, mas não a de Jimin.

Já não se perguntava o que ele achava de ter um namorado traficante de drogas, a certeza cortante já estava ali: Era uma merda.

Ainda sem conseguir olhar para ele, desejou com todas as forças separar-se de sua outra metade no exato momento em que mudava de nome, desligar as piores partes de Jeongguk para que Flamingo pudesse ser melhor. Ou que as suas ações não interferissem na vida que Jeongguk se esforçava para manter limpa.

Mas aquele era um pedido um tanto difícil de se realizar, pois no fim havia apenas um corpo, uma mente, compartilhavam dos mesmos medos porque um nunca deixou de ser o outro. Quem partia no início da noite levava um pouco de Jeongguk, e quem desabava na cama, com o cabelo molhado e o consciente pesado, trazia consigo pequenos fragmentos do que era ser o outro.

E seria sempre assim. Só que não poderia existir Jimin e Jeongguk em um mundo cor-de-rosa flamingo.

Não depois daquela noite em que tudo pareceu parar quando Jeongguk ouviu a voz embargada de Jimin ao telefone e do desespero para encontrá-lo o mais rápido possível. A sua respiração tornou-se cada vez mais sôfrega com os segundos que se passaram em espera dentro do banheiro. O mundo caiu de vez quando dividiam uma cabine pequena o suficiente para que os olhos assustados e as vozes sussurradas fossem os protagonistas da cena em questão, até porque era tudo o que Jeongguk conseguia se lembrar.

— Eu ouvi chamarem o seu codinome. — Ouviu Jimin dizer quase sem ar e lembrar daquele breve diálogo era tão agoniante quanto estar ali de fato.

— Quem chamou? — Jeongguk perguntou com as batidas do coração parecendo-se com facadas no peito. A esperança que nutriu naquele momento parecia tão tola vista por outra perspectiva, mas ele só não queria que aquilo estivesse acontecendo.

Asian Scars × jikookOnde histórias criam vida. Descubra agora