38. Três da tarde

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Jeon Eunbi conhecia uma mulher que perdera o filho para a mãe mais cruel de todas: a morte. Ele tinha dezesseis e já andava com alguns outros meninos maiores de idade e sem juízo. Dirigiam pelas ruas de Busan com a cabeça longe da pista, nem a viam direito de tão embriagados que estavam e, por não verem, nem sentiram quando um caminhão os acertou em cheio. A morte até parecera acolhedora daquela vez, em um minuto estavam vivos, no próximo segundo, não.

No entanto, a morte não lida com os vivos, leva quem ela quer e não deixa nenhum consolo para trás. Naquela noite, ela não levou apenas o filho, mas também a vida dos olhos daquela mãe.

E Eunbi sabia da amargura direcionada a si quando atrevia-se a olhá-la do outro lado das fileiras de bancos da igreja. O filho de Eunbi não estava mais ali porque ela não queria, porque não conseguiu aceitar uma parte tão fundamental que regia a existência alheia. Tão alheia que ela não entendia. Quando ele foi embora e nunca mais obteve notícias, preferiu encarar que ele tivesse morrido. Jeongguk estava longe dos seus olhos e do seu coração.

E era isso que afetava tanto a outra mãe, porque Eunbi tinha o luxo de fingir que o filho havia morrido, enquanto ela imaginava o filho vivo e era tida como louca.

Eunbi nunca havia chorado pela morte do seu filho, pois o bem-estar dele era provado quando tirava o extrato da sua conta bancária. "Ele está saudável, consegue até trabalhar e ganhar dinheiro suficiente para me mandar um pouco", era o que pensava. E ainda havia as ligações que ela não conseguia atender, pois aquilo era uma prova do seu erro e ela não conseguia encará-lo antes de desejar morrer um pouco. Já não bastava passar em frente ao quarto dele e ver a cama vazia, a pele até se arrepiava ao sentir na palma da mão a textura do cabelo castanho dele. Fechava o punho e andava para longe, em direção ao sino de vento da varanda, como se o assovio abafasse o arrependimento que pairava os seus pensamentos.

Hoje, a sombra da morte caminha ao lado da sua. Não há mais extratos com sinais de vida. Agora, são as suas ligações que não são mais atendidas. "O que aconteceu com o meu menino?", é o que se pergunta enquanto enxerga a mesma escuridão dos olhos da outra mãe espelhado nos seus.

(...)

Sentiam como se ele ainda estivesse ali, a alguns poucos quilômetros do apartamento onde sempre se reuniam. A uma mensagem, que demoraria a ser respondida. A uma ligação, que precisava ser feita na hora certa, caso contrário, não seria atendida.

Havia um vazio pairando no ar. Uma ação interrompida por saberem da ausência da resposta. Sabiam onde Jeongguk estava, só não sabiam lidar com tudo o que mais temiam finalmente acontecendo. Era como se estivessem debaixo d'água e não conseguissem ouvir nada com clareza.

Estavam juntos no apartamento de Hyejin e Namjoon, mas cada um em seu próprio mundo. Hoseok insistia em deixar uma fresta da janela aberta e arrastava uma cadeira para perto do batente só para fumar em paz. Batia o indicador no cilindro e observava as cinzas sumirem de sua vista e a fumaça fundindo-se com a brisa de inverno, como quem observa qualquer coisa para, quem sabe, esquecer a dor que sentia. Seu nariz começava a ficar gelado, mas ele não demonstrava que sairia dali.

Hyejin estava sentada no chão, com o notebook apoiado na mesa de centro. Seus olhos espelhavam os anúncios de advogados, mas nenhum tinha o preço em evidência e o fato de ter que entrar em contato a aterrorizava. Tudo o que deveria explicar para um completo desconhecido, era impronunciável. Se não falasse, talvez não se tornasse real, mesmo depois de ter tentado ligar para Jeongguk incontáveis vezes e sempre ouvir o som da caixa postal. Acabou se enfiando em artigos penais, lendo tudo o que conseguia entender para não ser tão leiga no assunto. Hyejin tinha medo de que algo ruim acontecesse com Jeongguk por não saber como agir e de quais seriam as outras alternativas. Não queria ser enganada.

Asian Scars × jikookWhere stories live. Discover now