Capítulo 24: A súplica dos mortos-vivos | Parte:2

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– Estamos reunidos aqui para sepultarmos os corpos dessas quatro pessoas... dessa família. Ninguém aqui os conhecia, mas nada mais digno do que respeitarmos quem eles eram. Não julgaremos seus atos sob a Terra, apenas Deus pode fazê-lo diante dos portões dos Céus. Esperamos que ELE receba-os bem. - o padre respirou fundo e nos encarou, um a um. –Estamos vivendo algo bíblico. Mortos que voltam a vida, isso foi previsto, mas muitos não acreditaram nos ensinamentos sagrados. Preferimos crer somente em coisas que nos convém, como se a bíblia fosse algum tipo de biscoito da sorte, onde as mensagens são claras, mas ao interpreta-las muitas vezes não nos faz sentido... 

Padre Lázaro estava extremamente abatido. Apertava os dedos das mãos nervosamente. Sua pele estava pálida e suada. As três covas cavadas na mata além da porteira eram fundas o suficiente para que nenhum animal desenterrasse os corpos e que nenhum cheiro escapasse da terra. O neném fora enterrado junto a mãe, ela havia o protegido da pior das mortes e nada mais justo do que ter o filho em seus braços também naquele momento. Cruzes improvisadas foram postas no chão, marcando onde os corpos estavam. Pendurei o crucifixo da mulher em sua cova e fiz uma última oração por ela e sua família. O padre continuou falando sobre a morte e o fim do mundo, mas eu não estava no clima para ouvir mais nada. Dei as costas para o cemitério assim que a terra começou a ser jogada no último túmulo. Eu precisava me deitar e dormir por pelo menos uns seis meses para esquecer o que havia visto poucas horas antes e talvez acordar daquele pesado que eu estava vivendo há meses.

Achei o caminho de volta 'pra' casa por puro instinto. A paisagem ao meu redor era desfocada e nada chamativa. Passei pelo átrio de entrada e segui direto para onde não deveria ir, a enfermaria. A Barbie Maligna não estava mais ali, apenas Benny dormia tranquilamente. Caminhei até a cabeceira de sua cama e acariciei seu rosto. Ele precisava acordar. Ele tinha que acordar. Sentei no chão e deitei a cabeça no colchão ao lado de uma de suas mãos. O choro veio fácil. O sentimento de incapacidade gritava dentro de mim. Incapacidade por não poder fazer nada diante da morte, que agora era mais comum do que gostaríamos. Os vivos estavam minguando enquanto os mortos estavam reinando com cada vez mais força. Que droga de vida era aquela? De onde veio toda aquela destruição? Será que Deus estava realmente nos punindo como Padre Lázaro havia insinuado no enterro daquela família?

Chorei até pegar no sono. A noite chegou rápido. Um abajur estava aceso sobre a mesa à cabeceira da cama. Acordei ao sentir uma mão afagar carinhosamente meus cabelos. Levantei a cabeça e vi que Benny também havia acordado, o que me fez sorrir. Ele acariciou meu rosto e me olhou nos olhos por um momento.

– Que bom que acordou, meu amor. – uma voz feminina disse.

Íris estava em pé perto da janela atrás de mim. Seus olhos eram negros naquela escuridão e pareciam queimar de raiva. Benny cortou o contato visual comigo e sorriu para ela. Levantei, sem graça, e limpei a poeira da calça.

– Como está se sentindo? – perguntei a ele.

– Bem. – ele respondeu, sua voz falhou.

Fui até a mesa pegar um copo de água para ele, mas Íris me interrompeu.

– Deixa que eu faço isso, querida. – ela sugeriu.

Odiava quando ela me chamava de querida, era sempre com um tom de deboche.

– É só um copo d'água, deixa que eu pego, tô mais perto. – peguei na jarra ao mesmo tempo em que Íris, o que fez a água entornar pela mesa e escorrer para o chão.

– Olha só o que você fez, garota. O que eu disse mais cedo? Você é surda ou retardada?

– Íris, já chega. – Benny a repreendeu.

Diário De Um Apocalipse Zumbi - O Despertar Dos MortosWhere stories live. Discover now