Capítulo 25: Não é a Mamãe! | Parte: 1

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– Acorde. – uma voz masculina ordenou ao dar ''tapinhas'' no meu rosto.

Minha boca estava seca e minha cabeça doendo. Tentei levantar, mas fui impedida. Havia cordas me mantendo presa a uma cadeira. Letargicamente fui recobrando a consciência. O mesmo homem gordo que havia me apagado, agora estava abaixado a minha frente me observando com um lampião aceso em mãos. Lembrei do porque estar ali e pensei em Pente Fino. Uma mordaça havia sido colocada em minha boca me impedindo de falar e no melhor dos casos, gritar. O cheiro da morte era inebriante, estava impregnado naquele lugar, assim como o leve cheiro de terra úmida. Algumas velas iluminavam parca e precariamente aquele muquifo. Me debati inutilmente na tentativa de me soltar das amarras.

– Veja quem também acordou: a mamãe. – o gordo se levantou e caminhou em direção a uma mesa nos fundos do cômodo e destampando algo, jogou uma lona no chão.

Ouvi barulho de correntes sendo arrastadas. Algo tomou forma na penumbra. Observei, apreensiva, o vulto que se aproximava com passos arrastados que chegavam cada vez mais perto. A luz bruxuleava fantasmagórica pelas paredes, criando vultos tão assustadores quanto o que estava parado a poucos metros de mim. Uma senhora de idade, aparentando oitenta anos, de pouca estatura e com um corpo franzino estava presa pelo pescoço por uma longa corrente fixa na parede. Aquele ''faminto'' grunhiu raivoso, como se denotasse minha presença intrusa. Me assustei, o que fez com que eu caísse de lado, levando a cadeira comigo. Algo escorria de sua boca, enegrecendo suas roupas como piche. Ela abocanhava o ar com voracidade e farejava, desesperada, a procura do delicioso petisco, mas não conseguia encontra-lo, mesmo sabendo que estava perto. A observei intrigada.

– Mamãe tem glaucoma avançado, por isso ela não vê você. Ou melhor, não vê nada. – o homem pareceu ter lido meu pensamento ao falar da morta-viva e com um movimento ágil colocou minha cadeira em pé novamente, como se eu não pesasse mais que uma pena.

Ele retirou o pano da minha boca e o guardou no bolso.

– Onde está minha amiga? Por favor, eu preciso saber se ela está bem. Não tínhamos a intenção de roubar nada da sua loja, só precisávamos de um...

– Pouco me importa do que precisavam. Não se invade o comércio de alguém e se sai impune. Sua amiga teve o que mereceu...

– O que fez com minha amiga? Me diz, seu porco imundo. – vociferei.

O homem me olhou como se eu não fosse mais do que uma mosca zunindo em seu ouvido.

– Vocês chegaram em uma hora propícia. Estávamos ficando sem o alimento da Mamãe. Sabe, agora que ela está com essa nova gripe que tanto foi noticiada na tevê, ela tem uma dieta diferente. Tentamos dar a ela comida comum, tipo: arroz e feijão, mas ela não aceitava. Sempre fazia a maior lambança quando tentávamos alimenta-la. Vimos então que ela gostava de carne quando ela agarrou o poodle de estimação e o comeu. Mas mamãe estava ficando fraca com aquela dieta de cachorros, gatos, e porcos a qual prescrevi para ela. – ele riu. – Mamãe não gosta de frango ou qualquer outra carne branca. Ela necessitava de uma proteína um pouco mais... como posso te explicar? Um pouco mais vermelha... Tentamos bois, cavalos e até ovelhas, mas mesmo assim ela estava pedindo por mais.

O gordo retirou de cima da mesa uma bacia grande e pesada e colocou aos meus pés. Meu coração quase saltou pela boca ao ver o que tinha dentro do recipiente.

– Um dia, antes de todos abandonarem a cidade, uma senhora veio até a farmácia em busca de antibióticos para a filha pequena que estava com dor de garganta. Enquanto eu conversava com a mulher, a menina serpenteou por uma das portas e encontrou minha mãe em seu quarto. Já aviso que não foi culpa nossa o que aconteceu. Mamãe não resistiu ao impulso de comer carne fresca e... – ele parecia ter remorso em contar o que havia acontecido. – Eu não tinha como explicar a mãe o que havia acontecido a sua filha, então resolvi mantê-la presa enquanto decidia o que fazer com a ela. Enquanto isso o tempo foi passando. E a fome da mamãe aumentando. Veja, eu não podia deixar minha mãe morrer de fome. Você me entende, não é? – ele me encarou complacente. – Não podíamos dar a bobeira de deixar aquela mulher ir embora e ela voltar com a polícia para nos prender. O que aconteceu com a menina foi apenas um acidente. Não poderíamos ser presos só por aquilo. Pensamos em tudo o que podíamos fazer com aquela senhora, mas Odete decidiu que o melhor a se fazer seria darmos uma pancada certeira na cabeça dela, ela morreria na hora. E foi o que aconteceu. Odete a acertou em cheio. Pow!!! Eu a cortei e armazenei os pedaços. Não sabe como é difícil manter a carne sem refrigeração... – Rogério retirou novamente o pano de seu bolso e enxugou o suor do rosto e do pescoço. – Aí foram aparecendo outras pessoas, muitas das cidades vizinhas, outras daqui mesmo e assim fomos tendo o que dar de comer a ela. – ele olhou amoroso para a morta-viva que tentava alcança-lo sem sucesso. – Mas as pessoas desapareceram, acho que foram para o Forte, sei lá. Você e sua amiga chegaram na hora exata. Essa era a última porção de comida que tínhamos 'pra' ela. Agora não é mais. Vocês duas durarão umas duas semanas ou até mais se eu souber racionar.

Diário De Um Apocalipse Zumbi - O Despertar Dos MortosWhere stories live. Discover now